Pular para o conteúdo principal

Manipulando números

Manchete do UOL: Lula já gastou R$ 6,3 bilhões em propaganda. O título dá a entender que o presidente torrou bastante com publicidade. Pode ser mesmo muito dinheiro, parece que é. Na matéria, bastante honesta do excelente repórter Fernando Rodrigues, o leitor fica sabendo que o valor se refere ao período de seis anos. Na média, R$ 1 bilhão por ano. Fica sabendo também que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso não era muito chegado a dar publicidade aos seus gastos com... publicidade. Quem divulgou os gastos de 2002, 2001 e 2000 foi o atual governo. Antes não há referências para comparar. Bem, ainda assim, fica claro que FHC gastou a mesma coisa que Lula, no que período que é possível comparar. Em três anos foram R$ 3 bilhões. Um bilhão por ano, exatamente a mesma coisa que na gestão de Lula. A manchete mais correta, portanto, seria algo como "Lula e FHC gastam R$ 1 bi por ano em propaganda". Mas aí realmente já seria querer demais do UOL...


Lula já gastou R$ 6,3 bi em propaganda

Saíram os números oficiais sobre propaganda estatal federal. Eis o número mágico: Lula já gastou R$ 6,3 bilhões com propaganda de 2003 a 2008, segundo dados oficiais divulgados nesta semana pela Presidência da República.

Eis os dados:

Fatos notáveis:

1) o valor de 2008 é quase idêntico ao de 2007. Houve uma estabilização. É natural que em anos pares (quando há eleições no Brasil) o valor gasto com publicidade estatal tenha um freio. Há restrições legais para o governo fazer propaganda o tempo todo;

2) os picos de Lula continuam sendo 2005 e 2006, o período em que o mensalão dominou o noticiário e quando foi necessário fazer um saneamento na imagem do presidente e do seu governo;

3) esses números se referem a toda a administração pública federal direta e indireta. Estão incluídos, portanto, gigantes como Petrobras, Banco do Brasil, CEF e outras estatais;

4) essas estatísticas não incluem valores de patrocínios, que chegam a aproximadamente R$ 1 bilhão por ano. Patrocínio vai desde colocar um logotipo na camiseta do time de futebol do Flamengo até dar apoio a bandinhas no interior do país;

5) na disputa entre os meios de comunicação por abocanhar um naco desse dinheirão de propaganda, a TV vem se mantendo no patamar dos 60%. Revistas começaram a era Lula recebendo 11,4% de todas as verbas publicitárias federais. Hoje, estão com 7,9%. Jornais aumentaram sua participação no bolo: tinham 10,3% em 2003; agora, estão com 13,1%. A publicidade estatal em internet ainda é percentualmente mínima, embora tenha mais que dobrado de tamanho: os veículos online ficavam com 1% do total no início da gestão Lula e agora estão com 2,6%;

6) não há números completos e atualizados para os 8 anos do governo FHC. O governo Lula divulgou com atualização monetária apenas os gastos publicitários dos últimos 3 anos do tucano (2000, 2001 e 2002). Nesse seu período final, FHC gastou bem, tanto como Lula. Eis a tabela:



Finalmente, uma observação e uma pergunta: O Brasil é um dos países do planeta com mais gastos estatais publicitários. Por que os governos no Brasil gastam tanto em publicidade?

Respostas?

Comentários

  1. Os gastos bilionários do governo em publicidade não seriam a resposta aos "achaques" das grandes empresas de comunicação, feitos através da "escandalização do nada", forçando assim o governo a "comprar" seu direito de resposta?
    É uma teoria...

    ResponderExcluir
  2. Colocar gastos de estatais como Petrobrás, Banco do Brasil e Caixa distorcem os dados. São empresas que concorrem com outras do mesmo ramo no setor privado que também realizam gastos publicitários gigantescos. Por exemplo, o setor bancário privado é um dos maiores anunciadores.

    Seria complicado pedir para o Banco do Brasil concorrer em pé de igualdade, apresentar resultados satisfatórios e ainda atender a outros objetivos do governo se não puder gastar boa soma em publicidade (assim como seus concorrentes). Ou seja, parte substancial do gasto publicitário do governo é por razões mercadológicas, e deveria ser separada do somatório de publicidade governamental. Isso não quer dizer que não possam ser questionados? É difícil explicar a campanha da Sabesp para todo o país por razões mercadológicas.

    Na minha visão os governos gastam muito para promoverem suas ações, mas pouco para orientar o cidadão. É esse último que deveria prevalecer.

    Jefferson Marinho

    ResponderExcluir

Postar um comentário

O Entrelinhas não censura comentaristas, mas não publica ofensas pessoais e comentários com uso de expressões chulas. Os comentários serão moderados, mas são sempre muito bem vindos.

Postagens mais visitadas deste blog

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue

OCDE e o erro do governo na gestão das expectativas

O assunto do dia nas redes é a tal negativa dos Estados Unidos para a entrada do Brasil na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto os oposicionistas aproveitam para tripudiar, os governistas tentam colocar panos quentes na questão, alegando que não houve propriamente um veto à presença do Brasil no clube dos grandes, a Série A das nações. Quem trabalha com comunicação corporativa frequentemente escuta a frase "é preciso gerenciar a expectativa dos clientes". O problema todo é que o governo do presidente Bolsonaro vendeu como grande vitória a entrada com apoio de Trump - que não era líquida e certa - do país na OCDE. Ou seja, gerenciou mal a expectativa do cliente, no caso, a opinião pública brasileira. Não deixa de ser irônico que a Argentina esteja entrando na frente, logo o país vizinho cujo próximo governo provavelmente não será dos mais alinhados a Trump. A questão toda é que o Brasil não "perdeu", como o pobre Fla-Flu que impe

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And