Não é que este blog esteja pegando no pé do autor em questão, mas Nivaldo Cordeiro, articulista do Mídia Sem Máscara, é mais do que uma piada – ele acredita na piada. Agora o rapaz deu para dizer que os editores do jornal O Estado de S. Paulo "têm sido mais cuidadosos no viés petista de sua linha editorial". Realmente, o autor destas Entrelinhas fica imaginando os quatrocentões Mesquitas, entre um scotch e outro, com a estrelinha do PT na lapela e discutindo como favorecer mais o presidente Lula... É para rir do começo ao fim, imperdível. Na íntegra, a seguir. E antes que alguém pergunte: não, Nivaldão não é um humorista como o professor Hariovaldo Almeida Prado, tão conhecido dos leitores deste blog.
Estadão minimiza crise
Nivaldo Cordeiro | 20 Abril 2009
Media Watch - O Estado de São Paulo
Vejo que seus editores agora, depois das alfinetadas do MSM sobre seu conteúdo, têm sido mais cuidadosos no trato com a mentira jornalística e no viés petista de sua linha editorial.
“Ou ninguém tem consciência do mal que nos cerca, ou o mal não existe”.
Machado de Assis, em crônica escrita em 13 de janeiro de 1885.
Tenho notado o descompasso da grande mídia em noticiar as causas e os efeitos da grande crise econômica que o mundo está a viver, o Brasil no meio (veja-se meu artigo anterior). E o Brasil não é uma abstração genérica, somos nós todos, pessoas de carne e osso que precisam tomar decisões práticas todos os dias, de curto, médio e longo prazos. Percebe-se que os diretores de redação dos jornais, que escolhem as noticias e as manchetes, e os editorialistas que as comentam, hesitam entre a verdade dos fatos e a mentira pura e simples, suprimindo o real para dar lugar a um dourado mundo de sonho em que a crise ou não existe ou já está superada. A marolinha do Lula é como se fosse um fato na cabeça dos fabricantes de notícias.
Como os jornais são os formadores de opinião e os portadores dos fatos, a partir dos quais a pessoas formulam seus juízos para tocar sua vida prática, uma mentira noticiada ou uma meia verdade pode levar toda a gente e fazer coisas equívocas, com prejuízos certos para sua existência. E não apenas prejuízos financeiros, pois há também e sobretudo a dimensão política da mentira. Mais do que nunca o imperativo moral de compromisso com a verdade está posto diante dos profissionais do jornalismo.
Casar agora ou depois? Começar agora um novo empreendimento ou adiar o investimento? Endividar-se para mobiliar a casa? Matricular o filho na escola boa, cara pela hora da morte, ou economizar dinheiro para atravessar o mar revolto da crise? Comprar um carro parcelado em 80 prestações ou aliviar o orçamento doméstico de uma dívida cara e estúpida? Veja-se que a solução de todos esses dilemas do cotidiano depende das notícias corretas da mídia, não de boas notícias eventualmente fabricadas para enganar os desavisados.
No último dia 14 Lula verbalizou isso ao declarar que “50% da crise é um pouco de pânico”. A coisa se encaixou e o fenômeno clareou diafanamente diante dos meus olhos. Há uma orquestração governamental para eliminar a parte da crise supostamente fabricada pela mente opaca das gentes tomadas de pânico, um suposto magote de imbecis. Se os fatos estão errados e a crise é criada em boa parte desde dentro da cachola dos viventes, então basta uma ajudazinha dos jornais para eliminar a desdita. O negócio dos jornais a soldo do governo é agora espantar a crise pela fabricação de manchetes, no que não se fizeram de rogados. Crise ou ilusão de crise? Eis a questão a responder.
Vim aqui comentar o Estadão deste domigo. Vejo que seus editores agora, depois das alfinetadas do MSM sobre seu conteúdo, têm sido mais cuidadosos no trato com a mentira jornalística e no viés petista de sua linha editorial. O tiro e a queda, pode-se dizer. Mas ordens são ordens e o vetusto jornal paulista tem que entregar a sua parte no trato com o governo. Daí que a edição de hoje só faltou proclamar a prosperidade e o bem-estar geral e a supressão geral e irrestrita da crise mundial.
Manchete principal: “Investidor externo faz Bovespa liderar ganhos”. Grande notícia, realmente, se não for vista em contexto e se nos esquecermos de outros fatos mais notavelmente relevantes, que mereceriam o lugar de honra do destaque e foram deixados de lado. Essa suposta boa noticia veio acompanhada da explicação de que esse é um episódio passageiro e volátil e de escasso impacto na vida econômica da nação. Se assim é, porque o destaque inusitado? Um leitor desatento poderá concluir que está tudo normal e que está portanto autorizado a tomar as decisões supondo que nos próximos meses teremos a repetição da normalidade dos últimos anos. A crise internacional clama a todos os ouvidos sensatos que isso é impossível de acontecer, todavia.
Se passarmos ao Caderno de Economia, então as trombetas da prosperidade ressoam em sons mais altos. Repete-se a manchete da capa principal em letras garrafais, secundada por outra que lhe complementa, na página 3: “Câmbio já favorece planejamento”. Não é maravilhoso vivermos em um mundo passível de ser planejado, ou seja, em que podemos tomar decisões descuidados do futuro crítico (aqui, no sentido de mergulhado na crise) que nos aguarda? Veja, caro leitor, que essa manchete da página três é uma falsa notícia enxertada como tal, é uma mera opinião envelopada como um fato da realidade. Uma falsificação teleológica, soporífera.
Na página 8 mais uma dose cavalar de otimismo: “Empresas já pensam no pós-crise”. Quem lê desatento acha que a marolinha já foi superada e você, caro leitor, deve se portar como se os tempos de prosperidade estivessem voltando.
Claro que os fatos reais têm uma inércia e não podem ser recusados, daí ver-se matérias relatando a enorme queda de receitas dos impostos (isso é crise?), que o retorno do Real forte preocupa o governo (leia-se: a depreciação do dólar, fenômeno de rara gravidade) e que as construtoras têm um enorme estoque de imóveis a comercializar, estando a fazer liquidações.
Será crise? A leitura do Caderno de Economia é inconclusiva, mas os destaques induzem que a crise foi superada. Digo-lhe, caro leitor, sem medo de errar: é mentira. Não acredite em tudo que ler no Estadão.
Estadão minimiza crise
Nivaldo Cordeiro | 20 Abril 2009
Media Watch - O Estado de São Paulo
Vejo que seus editores agora, depois das alfinetadas do MSM sobre seu conteúdo, têm sido mais cuidadosos no trato com a mentira jornalística e no viés petista de sua linha editorial.
“Ou ninguém tem consciência do mal que nos cerca, ou o mal não existe”.
Machado de Assis, em crônica escrita em 13 de janeiro de 1885.
Tenho notado o descompasso da grande mídia em noticiar as causas e os efeitos da grande crise econômica que o mundo está a viver, o Brasil no meio (veja-se meu artigo anterior). E o Brasil não é uma abstração genérica, somos nós todos, pessoas de carne e osso que precisam tomar decisões práticas todos os dias, de curto, médio e longo prazos. Percebe-se que os diretores de redação dos jornais, que escolhem as noticias e as manchetes, e os editorialistas que as comentam, hesitam entre a verdade dos fatos e a mentira pura e simples, suprimindo o real para dar lugar a um dourado mundo de sonho em que a crise ou não existe ou já está superada. A marolinha do Lula é como se fosse um fato na cabeça dos fabricantes de notícias.
Como os jornais são os formadores de opinião e os portadores dos fatos, a partir dos quais a pessoas formulam seus juízos para tocar sua vida prática, uma mentira noticiada ou uma meia verdade pode levar toda a gente e fazer coisas equívocas, com prejuízos certos para sua existência. E não apenas prejuízos financeiros, pois há também e sobretudo a dimensão política da mentira. Mais do que nunca o imperativo moral de compromisso com a verdade está posto diante dos profissionais do jornalismo.
Casar agora ou depois? Começar agora um novo empreendimento ou adiar o investimento? Endividar-se para mobiliar a casa? Matricular o filho na escola boa, cara pela hora da morte, ou economizar dinheiro para atravessar o mar revolto da crise? Comprar um carro parcelado em 80 prestações ou aliviar o orçamento doméstico de uma dívida cara e estúpida? Veja-se que a solução de todos esses dilemas do cotidiano depende das notícias corretas da mídia, não de boas notícias eventualmente fabricadas para enganar os desavisados.
No último dia 14 Lula verbalizou isso ao declarar que “50% da crise é um pouco de pânico”. A coisa se encaixou e o fenômeno clareou diafanamente diante dos meus olhos. Há uma orquestração governamental para eliminar a parte da crise supostamente fabricada pela mente opaca das gentes tomadas de pânico, um suposto magote de imbecis. Se os fatos estão errados e a crise é criada em boa parte desde dentro da cachola dos viventes, então basta uma ajudazinha dos jornais para eliminar a desdita. O negócio dos jornais a soldo do governo é agora espantar a crise pela fabricação de manchetes, no que não se fizeram de rogados. Crise ou ilusão de crise? Eis a questão a responder.
Vim aqui comentar o Estadão deste domigo. Vejo que seus editores agora, depois das alfinetadas do MSM sobre seu conteúdo, têm sido mais cuidadosos no trato com a mentira jornalística e no viés petista de sua linha editorial. O tiro e a queda, pode-se dizer. Mas ordens são ordens e o vetusto jornal paulista tem que entregar a sua parte no trato com o governo. Daí que a edição de hoje só faltou proclamar a prosperidade e o bem-estar geral e a supressão geral e irrestrita da crise mundial.
Manchete principal: “Investidor externo faz Bovespa liderar ganhos”. Grande notícia, realmente, se não for vista em contexto e se nos esquecermos de outros fatos mais notavelmente relevantes, que mereceriam o lugar de honra do destaque e foram deixados de lado. Essa suposta boa noticia veio acompanhada da explicação de que esse é um episódio passageiro e volátil e de escasso impacto na vida econômica da nação. Se assim é, porque o destaque inusitado? Um leitor desatento poderá concluir que está tudo normal e que está portanto autorizado a tomar as decisões supondo que nos próximos meses teremos a repetição da normalidade dos últimos anos. A crise internacional clama a todos os ouvidos sensatos que isso é impossível de acontecer, todavia.
Se passarmos ao Caderno de Economia, então as trombetas da prosperidade ressoam em sons mais altos. Repete-se a manchete da capa principal em letras garrafais, secundada por outra que lhe complementa, na página 3: “Câmbio já favorece planejamento”. Não é maravilhoso vivermos em um mundo passível de ser planejado, ou seja, em que podemos tomar decisões descuidados do futuro crítico (aqui, no sentido de mergulhado na crise) que nos aguarda? Veja, caro leitor, que essa manchete da página três é uma falsa notícia enxertada como tal, é uma mera opinião envelopada como um fato da realidade. Uma falsificação teleológica, soporífera.
Na página 8 mais uma dose cavalar de otimismo: “Empresas já pensam no pós-crise”. Quem lê desatento acha que a marolinha já foi superada e você, caro leitor, deve se portar como se os tempos de prosperidade estivessem voltando.
Claro que os fatos reais têm uma inércia e não podem ser recusados, daí ver-se matérias relatando a enorme queda de receitas dos impostos (isso é crise?), que o retorno do Real forte preocupa o governo (leia-se: a depreciação do dólar, fenômeno de rara gravidade) e que as construtoras têm um enorme estoque de imóveis a comercializar, estando a fazer liquidações.
Será crise? A leitura do Caderno de Economia é inconclusiva, mas os destaques induzem que a crise foi superada. Digo-lhe, caro leitor, sem medo de errar: é mentira. Não acredite em tudo que ler no Estadão.
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