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Cientista político afirma que o marqueteiro de Geraldo Alckmin está fazendo a coisa certa

Assim como tem gente que acredita em duendes, ainda há quem tenha a coragem de dizer, neste momento, que o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, tem chances de ganhar as eleições deste ano no primeiro turno. Sim, é isto mesmo, no primeiro turno. E mais: sem mudar a orientação da campanha no rádio e televisão. O artigo abaixo, do cientista político Paulo de Moura, originalmente publicado no site do jornalista Diego Casagrande, não é uma gozação. Petistas, tremei: Geraldo vai ganhar, e a virada só acontecerá nos últimos dias, sem margem de recuperação para o presidente Lula.

O MARQUETEIRO DE ALCKMIN PODE ESTAR CERTO
20.08, 17h56
por Paulo G. M. de Moura, cientista político

Lula cometeu um erro ao cantar sua vitória em primeiro turno em entrevista nesse final de semana. Talvez tenha feito isso depois de ver as pesquisas qualitativas do Duda Mendonça aprovando seu programa de TV e o Ibope em que subiu um ponto e em que Alckmin e Heloisa Helena permaneceram estacionados. Confesso que contava até com a possibilidade de que HH pudesse ter crescido um pouco mais sobre Alckmin e, mesmo assim, não considero liquidada a eleição que terá votação em cerca de 40 dias.

Meus caros leitores, não pensem que é fácil correr o risco, por escrito, de afirmar que talvez o marqueteiro de Alckmin esteja certo ao não largar batendo em Lula. A sensação psicológica é a de ter o mundo contra si. Quem me lê sabe que tenho sido um duro crítico desse governo. Defendi abertamente o impeachment de Lula, criticando também, duramente, a oposição por ter errado ao adotar outro caminho. Mas isso é passado. Façamos então, um exercício de projeção de cenários eleitorais para refletirmos sobre as razões de meu ponto de vista.

Cenário Lula-lá no primeiro turno: nessa hipótese a última pesquisa Ibope estaria apontando a consolidação irreversível das intenções de voto em Lula, que teria razão ao cantar vitória antes do tempo. Se Lula está certo ao cantar vitória antecipada, nada há que se possa fazer para reverter esse quadro. Restaria a Alckmin, então, seguir na linha light preservando sua imagem para o futuro, ou bater duro em Lula para enfraquecer o virtual segundo mandato do petismo.

Cenário Alckmin-lá no primeiro turno: nessa hipótese, estariam perdidas em algum canto da memória do povo as falcatruas que Roberto Jefferson denunciou. Bastaria à oposição, então, refrescar a memória das pessoas, batendo em Lula do começo ao fim do horário eleitoral. Dessa maneira, Lula deveria desabar abruptamente nas pesquisas logo após os primeiros dias do horário eleitoral na TV, levando Alckmin à vitória fácil no primeiro turno. Era com esse cenário que eu estava trabalhando até pouco tempo atrás, quando escrevi artigos anunciando a possibilidade de vitória de Alckmin em primeiro turno. Hoje, não o descarto, mas considero-o menos provável.

Cenário Alckmin-lá no segundo turno: nessa hipótese (que detalhei nos dois últimos artigos aqui publicados), o marqueteiro de Alckmin estaria avaliando que, para vencer, precisa tirar eleitores que estão com Lula. Estando com Lula, esses eleitores, óbvio, não são antilulistas. Se for ao segundo turno, os 35% de eleitores antilulistas existentes no país votam em Alckmin por razões evidentes. A vitória, portanto, passaria pela necessidade de tirar eleitores que de Lula.

Para tirar eleitores de Lula, Luiz Gonzáles, marqueteiro de Alckmin, estaria trabalhando com a seguinte estratégia: num primeiro momento, apresentar o Geraldo para esses eleitores de Lula, mostrando que o tucano é confiável, fez coisas parecidas como governador de SP, com as que Lula fez como presidente e, portanto, esse povo, se quiser, pode trocar um pelo outro sem medo de perder o que Lula lhes deu (bolsa-esmola, etc.). Segundo li na Folha de SP, a direção do PT estaria satisfeita com a boa receptividade dos programas de Duda Mendonça. Logo, os eleitores de Lula devem estar gostando dos programas de Alckmin também, pois ambos são iguais em formato e linguagem.

Na mesma proporção em que essa construção estiver se consolidando na mente do eleitor “de Lula”, Gonzáles começaria (no início de forma sutil e depois aumentando gradativamente o calibre dos tiros) a desconstrução da imagem de Lula. Sob circunstâncias normais, isso é, sem a pressão de fatos contundentes ou muito antes do dia de decidir em quem votar, o processamento das mensagens da propaganda eleitoral na mente dos eleitores leva cerca de sete a dez dias. Se eu estiver certo, será mais ou menos nesse prazo que as peças biográficas de Alckmin deverão ter seu espaço reduzido no programa de TV. Minha percepção coincide com informação publicada no blog do Josias de Souza e reproduzida por este site (Clique AQUI para ler).

Em seu lugar, ao lado de peças de reforço de imagem de Alckmin e de apresentação de seu programa de governo (promessas para o futuro), entram no ar peças de desconstrução da imagem de Lula que, suponho, estejam sendo feitas e pré-testadas em pesquisas qualitativas nesse momento, para que sejam levadas ao ar somente aquelas que cumpram a função de desmontar Lula sem causar ônus a Alckmin. Lembrem-se, Alckmin precisa atrair para si eleitores de Lula. Demolir Lula é fácil. Transferir eleitores de Lula para Alckmin é muito mais difícil. Seria divertido ver Lula e sua obra serem demolidos na porrada. Mas, a demolição que interessa é sua derrota nas urnas. Nada se iguala a isso para satisfazer a todos que querem ver Lula fora do poder. Se o eleitor de Lula que pode se transferir para o lado de cá, dando a vitória a Alckmin, perceber Lula como alguém que está sendo agredido de forma virulenta e injusta, esse eleitor se sentirá agredido e verá Lula como vítima de uma injustiça. E, assim, Lula estará reeleito.

Lembrem-se da capa da revista Veja da semana passada: “São eleitores que estudaram até o nível médio e cuja renda familiar não supera 700 reais. Ao todo, eles comandam 24 milhões de votos. Dentro desse vasto segmento, o grupo numericamente mais expressivo é composto de mulheres de até 44 anos. Em números absolutos, elas formam um exército de 8,5 milhões de eleitoras, que corresponde a 25% do eleitorado nordestino. Esse contingente tem se comportado de forma tão compacta e homogênea na eleição – neste momento, votam majoritariamente em Lula – que sua força se tornou perceptível e mesmo capaz de alterar, ao seu próprio gosto, o nome do próximo presidente da República. Se essas eleitoras ficarem com Lula, como a maioria está hoje, o presidente tem todas as chances de ser reeleito – caso, naturalmente, sua preferência não desabe nas demais regiões. Se uma parte significativa dessas eleitoras se inclinar para Alckmin, e esse movimento vier acompanhado de um crescimento razoável nas outras regiões”. do país, o tucano volta a ter chances reais de derrotar o atual favorito nas intenções de voto.”

Para esse povo, Lula é “gente como a gente”. De fato, não é. Mas, convencê-los de que Lula é Ali Babá sem perder seus votos, é o “X” da questão. González precisará preparar esse eleitor, gradativamente, para aceitar as críticas a Lula como sendo críticas justas e fundadas na realidade. Começar com imagens de gente do povo decepcionada com Lula, como foi feito no programa de Alckmin no sábado, me parece um bom caminho.

Por fim, um alerta. Se minha percepção está correta, a eventual queda de Lula nas pesquisas somente deverá começar a se processar, se Gonzáles for bem sucedido em sua estratégia, na reta final do primeiro turno e não logo após a primeira semana de propaganda eleitoral na TV, como eu esperava que ocorresse quando estava trabalhando com base no primeiro cenário acima descrito. Se eu estiver percebendo a lógica da estratégia de Alckmin corretamente, o tucano agiu certo ao isolar seu marqueteiro em SP, longe das pressões de Brasília. Igualmente, está certo ao afirmar que “não fará uma campanha errática”.

Sob esse ponto de vista, Heloisa Helena pode ter batido no seu teto nessa pesquisa do Ibope e Alckmin no seu piso. Estamos na primeira fase de um jogo que começa tornando-se os candidatos conhecidos. Em seguida, se a estratégia estiver funcionando, o eleitor deve começar a se identificar com a imagem e o discurso do candidato. A etapa das comparações deve ocorrer a partir de meados de setembro até a véspera da eleição. E a etapa da escolha se dará na reta final do primeiro turno.

Será preciso muito sangue frio para resistir nessa linha. Mas, se Gonzáles estiver certo, e espero e torço para que esteja, a desconstrução gradual da imagem de Lula, se feita de forma correta, poderá até confirmar a vitória de Alckmin em primeiro turno. Hoje esse cenário é menos provável. Pelo contrário, a maioria está com Lula. Lula tem pesquisas e marqueteiros competentes e, segundo o blog do Josias de Souza, já têm pronta reação. Se Lula é imune, a eleição está perdida. Mas, quem defende que é preciso bater em Lula o faz por acreditar que há chances de vencer.

Para quem é um cientista político, errar prognósticos eleitorais é um problema mais sério do que para jornalistas, políticos e militantes. Se eu estiver errado, sequer precisarei reconhecer meus erros por escrito. Meus leitores saberão. É o preço de quem corre riscos no mercado político, assim como o prejuízo é o risco de quem busca lucro no mercado econômico.

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