Pular para o conteúdo principal

Um despropósito de Pedro Simon

Algumas matérias nos jornais e portais da internet dão conta de que o senador Pedro Simon (PMDB-RS) teve medo de seu colega Fernando Collor de Mello (PTB-AL) durante o debate no plenário do Senado, ontem (4/08). Alguns veículos transcreveram a fala do parlamentar gaúcho: "É incrível! Me veio a imagem do pai dele, que atirou e matou o senador Kairala. O pai do Collor errou o tiro, mas ontem ele estava na minha frente, na minha reta! Foi assustador, saía fogo dos olhos do senador Fernando Collor ali logo embaixo de mim. E eu não falei nada demais dele, quando vi ele entrou correndo, completamente transtornado!".

Muita gente comentou o olho esbugalhado de Collor, mas quase ninguém apontou o despropósito completo da comparação de Simon. Ora, o que o pai de Fernando Collor fez ou deixou de fazer nada tem a ver com a questão atual e o filho não tem a menor responsabilidade ou culpa no que aconteceu. É lamentável o uso que Simon faz de um episódio antigo e particular, completamente fora de contexto.

De fato, a família de Collor viveu diversos momentos difíceis, trágicos até, como a morte do irmão Pedro, depois de uma desavença com o ex-presidente que de certa forma ajudou no seu afastamento do cargo em 1992. Arnon de Mello, pai de Collor, realmente matou o senador José Kairala - aliás, não era o alvo dos 3 tiros, desferidos contra Silvestre Péricles, este sim, senador inimigo de Arnon.

Tudo isto é verdade, nada do que disse Simon, portanto, é mentira. Porém, insinuar uma relação de causalidade entre o crime cometido pelo pai de Collor e o que supostamente poderia ter acontecido no plenário durante é uma atitude canhestra de Pedro Simon, que só o diminui enquanto político e homem público. A verdade é que Simon botou o rabo entre as pernas, apequenou-se diante das palavras de Collor. Não teve coragem suficiente para revidar. Ficou no seu canto, apavorado. Saiu da tribuna menor do que entrou. Um dia depois, aparece com esta ridícula exploração de um crime com o qual seu contendor no fundo nada tem a ver (o ex-presidente tinha 13 anos quando o episódio ocorreu), a não ser o fato de ser filho do criminoso.

Pedro Simon poderia, sim, ter enfrentado Collor sem o temor de que Fernando repetisse Arnon. Não precisa de uma desculpa esfarrapada para seu comportamento tíbio. Seria mais honesto se Simon viesse a público e dissesse: "fiquei com medo físico dele, que é mais jovem e forte do que eu e estava muito transtornado, então recuei". Todo mundo entenderia e não teria sido necessário botar a família do seu adversário no meio. Coisa mais feia, senador Simon.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And...

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...

Dúvida atroz

A difícil situação em que se encontra hoje o presidente da República, com 51% de avaliação negativa do governo, 54% favoráveis ao impeachment e rejeição eleitoral batendo na casa dos 60%, anima e ao mesmo tempo impõe um dilema aos que articulam candidaturas ditas de centro: bater em quem desde já, Lula ou Bolsonaro?  Há quem já tenha a resposta, como Ciro Gomes (PDT). Há também os que concordam com ele e vejam o ex-presidente como alvo preferencial. Mas há quem prefira investir prioritariamente no derretimento do atual, a ponto de tornar a hipótese de uma desistência — hoje impensável, mas compatível com o apreço presidencial pelo teatro da conturbação — em algo factível. Ao que tudo indica, só o tempo será capaz de construir um consenso. Se for possível chegar a ele, claro. Por ora, cada qual vai seguindo a sua trilha. Os dois personagens posicionados na linha de tiro devido à condição de preferidos nas pesquisas não escondem o desejo de se enfrentar sem os empecilhos de terceira,...