Pular para o conteúdo principal

O PSOL move a política brasileira?

O que segue abaixo é o artigo semanal do autor destas Entrelinhas para o Correio da Cidadania. Desta vez, o assunto é o PSOL, partido do diretor do Correio, Plínio de Arruda Sampaio. A seguir, o texto na íntegra:

O jornalista Reinaldo Azevedo, blogueiro e colunista de Veja, é hoje, ao lado do aloprado Diogo Mainardi, o grande porta-voz das parcelas mais conservadoras da sociedade brasileira. Ao contrário de Diogo, Azevedo tem uma boa capacidade de análise política e é sério no que escreve, embora às vezes seja tão ou mais virulento que seu coleguinha da Veja. Dia desses, Reinaldo escreveu, em um tom de desalento, que o PSOL é único partido a realmente mover a política brasileira. O tema do comentário era a cada vez mais complicada situação do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o colunista afirmava que, ao contrário do PSDB e DEM, que adotaram uma postura bastante cautelosa, o PSOL estava fazendo o serviço todo sozinho.

A reflexão do analista da extrema-direita é reveladora da insatisfação dos setores realmente conservadores com a atuação dos partidos que deveriam representá-los. É evidente que a direita não vai adotar o PSOL só porque o partido age com o verdadeiro ponta de lança das denúncias contra o governo ou seus aliados, seja no Congresso, seja na esfera pública extra-parlamentar. De toda maneira, a análise de Reinaldo Azevedo é interessante porque mostra que o vazio instalado na cena política brasileira após a vitória do PT só encontra o PSOL como ator capaz de minimamente sugerir alguma foram de contestação.

No fundo, o PSOL age atualmente de forma muito semelhante ao PT nos anos 80, embora com muito menos força política do que tinha (e ainda tem) a legenda do presidente Lula no movimento popular. Por um lado, o PSOL vem atuando com muita firmeza na cobrança de apuração dos casos de corrupção no governo, exatamente como fizeram José Dirceu, Aloizio Mercadante, José Genoino e tantos outros líderes petistas desde meados dos anos 80 até o impeachment de Fernando Collor. De outro lado, o partido de Heloísa Helena vem tentando reaglutinar as massas que se decepcionaram com o governo petista, processo este que ainda está em curso, mas que já é visível em atos como o do primeiro de maio, em São Paulo, quando milhares protestaram contra as "reformas neoliberais" do governo Lula.

Politicamente, o cenário para o PSOL é um pouco mais complicado do que era para o PT por vários motivos. Primeiro, porque o adversário não é visto pela população como uma força conservadora. Era muito mais fácil fazer oposição o governo tucano-pefelista de Fernando Henrique Cardoso, autenticamente neoliberal. Os socialistas do PSOl acreditam que o governo Lula é tão neoliberal quanto o de Cardoso, mas não conseguem provar a tese para o povão. Em segundo lugar, conforme atestam alguns experientes quadros do próprio PSOL, o PT nos anos 80 e 90 tinha um projeto alternativo para o País e um projeto de poder. O PSOL hoje não tem nenhuma coisa nem outra e acaba se valendo do discurso de caráter udenista para se colocar como o "último puro" da política brasileira. Complicado, para dizer o mínimo, conhecendo o passado da líder máxima do PSOL, ex-senadora Heloísa Helena, cujas relações com o Judas da vez, senador Renan Calheiras, já foram mais do que apenas amistosas.

Ao fim e ao cabo, a questão que fica é simples: conseguirá o PSOL superar o paradigma do PT e se tornar um partido de esquerda com idéias e práticas próprias? Porque se os socialistas permanecerem como uma espécie de cópia purificada da legenda fundada por Lula, não é difícil que a população siga preferindo a versão original...

Comentários

  1. A virgem de fibra de coco

    O PSOL não perde aquele seu jeitinho urubu-na-carniça de ser. Não se livra daquela cara de oba-agora-que-o-PT-se-deu-mal-a-gente-vai-se-dar-bem.

    No fundo, é a mesma atitude arrogante, a mesma postura de líder onisciente das massas ignaras que levou o PT ao jesuitismo e ao desprezo pela coisa pública. Se é para o bem do "povo", todos os meios são válidos. Nós somos a vanguarda, nós sabemos o que é bom para todos.

    No afã de se apoderarem do que supõem ser os despojos do PT, os oportunistas do PSOL não se acanham em alinhar-se objetivamente com tudo o que o país tem de pior, do Gabeira ao ACM. É óbvio que, na hipótese improvável de esse bando de iluminados chegar ao poder, o PSOL faria exatamente a mesma coisa que hoje critica, hipocritamente.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

O Entrelinhas não censura comentaristas, mas não publica ofensas pessoais e comentários com uso de expressões chulas. Os comentários serão moderados, mas são sempre muito bem vindos.

Postagens mais visitadas deste blog

Um pai

Bruno Covas, prefeito de São Paulo, morreu vivendo. Morreu criando novas lembranças. Morreu não deixando o câncer levar a sua vontade de resistir.  Mesmo em estado grave, mesmo em tratamento oncológico, juntou todas as suas forças para assistir ao jogo do seu time Santos, na final da Libertadores, no Maracanã, ao lado do filho.  Foi aquela loucura por carinho a alguém, superando o desgaste da viagem e o suor frio dos remédios.  Na época, ele acabou criticado nas redes sociais por ter se exposto. Afinal, o que é o futebol perto da morte?  Nada, mas não era somente futebol, mas o amor ao seu adolescente Tomás, de 15 anos, cultivado pela torcida em comum. Não vibravam unicamente pelos jogadores, e sim pela amizade invencível entre eles, escreve Fabrício Carpinejar em texto publicado nas redes sociais. Linda homenagem, vale muito a leitura, continua a seguir.  Nos noventa minutos, Bruno Covas defendia o seu legado, a sua memória antes do adeus definitivo, para que s...

Dica da Semana: Tarso de Castro, 75k de músculos e fúria, livro

Tom Cardoso faz justiça a um grande jornalista  Se vivo estivesse, o gaúcho Tarso de Castro certamente estaria indignado com o que se passa no Brasil e no mundo. Irreverente, gênio, mulherengo, brizolista entusiasmado e sobretudo um libertário, Tarso não suportaria esses tempos de ascensão de valores conservadores. O colunista que assina esta dica decidiu ser jornalista muito cedo, aos 12 anos de idade, justamente pela admiração que nutria por Tarso, então colunista da Folha de S. Paulo. Lia diariamente tudo que ele escrevia, nem sempre entendia algumas tiradas e ironias, mas acompanhou a trajetória até sua morte precoce, em 1991, aos 49 anos, de cirrose hepática, decorrente, claro, do alcoolismo que nunca admitiu tratar. O livro de Tom Cardoso recupera este personagem fundamental na história do jornalismo brasileiro, senão pela obra completa, mas pelo fato de ter fundado, em 1969, o jornal Pasquim, que veio a se transformar no baluarte da resistência à ditadura militar no perío...

Dica da semana: Nine Perfect Strangers, série

Joia no Prime traz drama perturbador que consagra Nicole Kidman  Dizer que o tempo não passou para Nicole Kidman seria tão leviano quanto irresponsável. E isso é bom. No charme (ainda fatal) de seus 54 anos, a australiana mostra que tem muita lenha para queimar e escancara o quanto as décadas de experiência lhe fizeram bem, principalmente para composição de personagens mais complexas e maduras. Nada de gatinhas vulneráveis. Ancorando a nova série Nine Perfect Strangers, disponível na Amazon Prime Video, a eterna suicide blonde de Hollywood – ok, vamos dividir o posto com Sharon Stone – empresta toda sua aura de diva para dar vida à mística Masha, uma espécie de guru dos novos tempos que desenvolveu uma técnica terapêutica polêmica, pouco acessível e para lá de exclusiva. Em um lúdico e misterioso retiro, a “Tranquillum House”, a exotérica propõe uma nova abordagem de tratamento para condições mentais e psicossociais manifestadas de diferentes formas em cada um dos nove estranhos, “...