O artigo abaixo é a colaboração semanal do autor destas Entrelinhas para o Correio da Cidadania. Em foco, os problemas dos aeroportos e o dos cansadinhos nas ruas.
Qual a causa do acidente com o Airbus da TAM em Congonhas, que matou quase duas centenas de pessoas em São Paulo? E o que João Dória Jr., o promotor de passeios para a escolha do “cão mais parecido com o dono” em Campos do Jordão, tem a ver com os problemas nos aeroportos brasileiros?
Quem acompanha de perto a política nacional sabe a resposta. Quando as chamas do Airbus ainda ardiam na zona sul de São Paulo, o governador José Serra (PSDB) começou a politizar o acidente, atribuindo a responsabilidade da tragédia a problemas na pista de Congonhas, recém-reformada pela Infraero, estatal da esfera federal. De Serra, não se poderia esperar outra coisa. O governador tentou surfar nos 200 cadáveres para fazer política, mas bastaram as caixas-pretas do Airbus serem abertas e o conteúdo, tornado público, para que a hipótese de Serra desmoronasse como um castelo de cartas.
De tudo que se sabe até agora, a única hipótese descartada é que a causa da tragédia tenha sido uma eventual má condição da pista. Pelos dados das caixas-pretas, o que de fato aconteceu foi uma falha humana ou mecânica, ou ainda uma combinação das duas. Claro, se a pista de Congonhas fosse maior ou se houvesse uma área de escape no aeroporto, talvez não fossem tantos os mortos, mas, como se sabe, não é o presidente Lula o autor do projeto de Congonhas...
Para a tristeza de Serra, Diogo Mainardi, Reinaldo Azevedo e outros menos cotados, Lula não foi citado no final da gravação dos pilotos. Não, o presidente não foi vaiado no fatídico vôo da TAM. Apesar disto, a queda do Airbus em Congonhas foi suficiente para que Dória Jr. e seus miquinhos amestrados iniciassem o tal movimento “cívico” Cansei.
Lula pode realmente estar em uma maré de azar, mas a oposição ao seu governo só lhe dá alegrias. Vale a analogia futebolística, tão a gosto do presidente; com Dória Jr. no comando do ataque do time adversário, não há o menor risco de a defesa governista tomar gols. Nada pessoal contra o empresário, mas a verdade é que, para mobilizar as massas, é preciso um pouco mais de know how, para usar o jargão do próprio Dória Jr. Na campanha das Diretas, o governador Montoro mandou liberar as catracas do Metrô e dos ônibus para encher o Anhangabaú. José Serra nem se atreve a ser fotografado ao lado do tal Dória Jr, muito menos do lamentável presidente da OAB-SP, o tal do D’Urso.
O Cansei é ridículo porque a burguesia paulista é ridícula, como já apontou o ex-governador Cláudio Lembo (DEM), um expoente bem pensante desta mesmíssima elite. Apesar da fraqueza do movimento, vale a pena aprofundar um pouco mais a reflexão para entender melhor o que vai pelo país: o “Cansei” é fruto da insatisfação da elite e de parte das classes médias com o governo: os mais ricos se irritam porque perdem negócios, acabam tendo que pagar aluguéis de helicópteros e jatinhos para se deslocar (e mesmo assim dependem da boa vontade e/ou competência dos controladores de vôo). Essa gente está acostumada com um código segundo o qual basta dinheiro para conseguir as coisas. O caos aéreo subverte esta lógica e acaba fazendo o muito rico ficar quase no mesmo patamar do apenas rico, mofando nos aeroportos, ainda que em salas VIPs. Já as classes médias vivem com olho no andar de cima, ao qual almejam chegar assim que for possível. A questão dos aeroportos acaba pegando também neste meio porque pegar avião e um dia fazer a tão sonhada grande viagem da vida são sonhos típicos dos, digamos assim, médios.
A revolta deste pessoal com o presidente Lula é ainda maior porque percebem que o governo é mais popular (como atestou o Datafolha divulgado no domingo, no qual a aprovação ao governo permaneceu intacta e em patamar altíssimo), tem um programa de inclusão bem mais arrojado do que o de Fernando Henrique e está dando certo no campo econômico. Em outras palavras, os sucessos do governo só fazem deixar a alta e média burguesia ainda mais irritadas com o presidente-operário e seus ministros.
Tudo somado, a verdade é que a insatisfação dos ricaços e dos que almejam chegar lá existe desde o primeiro dia do governo Lula, mas estava latente. A crise aérea afetou diretamente esta turma, de forma que a popularidade do presidente neste segmento despencou, como atesta o mesmo Datafolha. No povão, nem sinal de mudança – a turma deve estar achando até divertido ver o andar de cima passando por alguns apertos. De fato, "a dor da gente não sai no jornal", reza o velho ditado: não há uma única matéria sobre "crise terrestre", digamos assim, que afeta os pobres dia sim e outro também. Lula governa para essa gente, daí os índices de popularidade se manterem inalterados.
Vai ser assim até o fim do mandato: pobres de um lado, ricos de outro. Não é venezuelização porque Lula não é Chávez, mas, ao final, teremos um país dividido no que toca à avaliação do governo federal. Ao contrário do que muita gente diz por aí, esta coluna avalia que isto é bom e deixa a política brasileira melhor e mais transparente, porque cada camada social terá a representação a que faz jus.
Qual a causa do acidente com o Airbus da TAM em Congonhas, que matou quase duas centenas de pessoas em São Paulo? E o que João Dória Jr., o promotor de passeios para a escolha do “cão mais parecido com o dono” em Campos do Jordão, tem a ver com os problemas nos aeroportos brasileiros?
Quem acompanha de perto a política nacional sabe a resposta. Quando as chamas do Airbus ainda ardiam na zona sul de São Paulo, o governador José Serra (PSDB) começou a politizar o acidente, atribuindo a responsabilidade da tragédia a problemas na pista de Congonhas, recém-reformada pela Infraero, estatal da esfera federal. De Serra, não se poderia esperar outra coisa. O governador tentou surfar nos 200 cadáveres para fazer política, mas bastaram as caixas-pretas do Airbus serem abertas e o conteúdo, tornado público, para que a hipótese de Serra desmoronasse como um castelo de cartas.
De tudo que se sabe até agora, a única hipótese descartada é que a causa da tragédia tenha sido uma eventual má condição da pista. Pelos dados das caixas-pretas, o que de fato aconteceu foi uma falha humana ou mecânica, ou ainda uma combinação das duas. Claro, se a pista de Congonhas fosse maior ou se houvesse uma área de escape no aeroporto, talvez não fossem tantos os mortos, mas, como se sabe, não é o presidente Lula o autor do projeto de Congonhas...
Para a tristeza de Serra, Diogo Mainardi, Reinaldo Azevedo e outros menos cotados, Lula não foi citado no final da gravação dos pilotos. Não, o presidente não foi vaiado no fatídico vôo da TAM. Apesar disto, a queda do Airbus em Congonhas foi suficiente para que Dória Jr. e seus miquinhos amestrados iniciassem o tal movimento “cívico” Cansei.
Lula pode realmente estar em uma maré de azar, mas a oposição ao seu governo só lhe dá alegrias. Vale a analogia futebolística, tão a gosto do presidente; com Dória Jr. no comando do ataque do time adversário, não há o menor risco de a defesa governista tomar gols. Nada pessoal contra o empresário, mas a verdade é que, para mobilizar as massas, é preciso um pouco mais de know how, para usar o jargão do próprio Dória Jr. Na campanha das Diretas, o governador Montoro mandou liberar as catracas do Metrô e dos ônibus para encher o Anhangabaú. José Serra nem se atreve a ser fotografado ao lado do tal Dória Jr, muito menos do lamentável presidente da OAB-SP, o tal do D’Urso.
O Cansei é ridículo porque a burguesia paulista é ridícula, como já apontou o ex-governador Cláudio Lembo (DEM), um expoente bem pensante desta mesmíssima elite. Apesar da fraqueza do movimento, vale a pena aprofundar um pouco mais a reflexão para entender melhor o que vai pelo país: o “Cansei” é fruto da insatisfação da elite e de parte das classes médias com o governo: os mais ricos se irritam porque perdem negócios, acabam tendo que pagar aluguéis de helicópteros e jatinhos para se deslocar (e mesmo assim dependem da boa vontade e/ou competência dos controladores de vôo). Essa gente está acostumada com um código segundo o qual basta dinheiro para conseguir as coisas. O caos aéreo subverte esta lógica e acaba fazendo o muito rico ficar quase no mesmo patamar do apenas rico, mofando nos aeroportos, ainda que em salas VIPs. Já as classes médias vivem com olho no andar de cima, ao qual almejam chegar assim que for possível. A questão dos aeroportos acaba pegando também neste meio porque pegar avião e um dia fazer a tão sonhada grande viagem da vida são sonhos típicos dos, digamos assim, médios.
A revolta deste pessoal com o presidente Lula é ainda maior porque percebem que o governo é mais popular (como atestou o Datafolha divulgado no domingo, no qual a aprovação ao governo permaneceu intacta e em patamar altíssimo), tem um programa de inclusão bem mais arrojado do que o de Fernando Henrique e está dando certo no campo econômico. Em outras palavras, os sucessos do governo só fazem deixar a alta e média burguesia ainda mais irritadas com o presidente-operário e seus ministros.
Tudo somado, a verdade é que a insatisfação dos ricaços e dos que almejam chegar lá existe desde o primeiro dia do governo Lula, mas estava latente. A crise aérea afetou diretamente esta turma, de forma que a popularidade do presidente neste segmento despencou, como atesta o mesmo Datafolha. No povão, nem sinal de mudança – a turma deve estar achando até divertido ver o andar de cima passando por alguns apertos. De fato, "a dor da gente não sai no jornal", reza o velho ditado: não há uma única matéria sobre "crise terrestre", digamos assim, que afeta os pobres dia sim e outro também. Lula governa para essa gente, daí os índices de popularidade se manterem inalterados.
Vai ser assim até o fim do mandato: pobres de um lado, ricos de outro. Não é venezuelização porque Lula não é Chávez, mas, ao final, teremos um país dividido no que toca à avaliação do governo federal. Ao contrário do que muita gente diz por aí, esta coluna avalia que isto é bom e deixa a política brasileira melhor e mais transparente, porque cada camada social terá a representação a que faz jus.
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