Pular para o conteúdo principal

Serra vs. Alckmin: a novela continua

O que vai abaixo é o artigo semanal do autor destas Entrelinhas para o Correio da Cidadania. Em primeira mão para os leitores do blog.

O ano de 2010 ainda está muito distante, mas boa parte da classe política só pensa nele, evidentemente por causa das eleições gerais que terão vez em outubro . O governador José Serra (PSDB), por exemplo, transformou o Palácio dos Bandeirantes, no aprazível bairro paulistano do Morumbi, em um verdadeiro
bunker de sua candidatura presidencial. Tucanos bem informados e inimigos do governador no partido informam que até a questão do financiamento da campanha de Serra já está sendo minuciosamente "trabalhada", digamos assim.

O também governador Aécio Neves se movimenta mais discretamente, como é da tradição de Minas Gerais, mas já trabalha com bastante afinco em seu projeto presidencial.

Na base governista, a situação é mais complicada porque o presidente Lula em tese não pode concorrer, em função da atual legislação eleitoral. Alguns nomes foram lançados e estão, no momento, sendo testados – casos de Dilma Rousseff, Tarso Genro, Jaques Wagner, entre outros. Há movimentação, inclusive, para que o PT abra mão da cabeça de chapa e apóie Ciro Gomes, do PSB, ou mesmo um nome do PMDB, que poderia ser o governador Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, o ministro Nelson Jobim ou até mesmo Aécio Neves, caso ele aceitasse o convite de Michel Temer e retornasse ao seu antigo partido.

Do ponto de vista do xadrez político que está em curso, a grande novidade da semana que passou foi a derrota do deputado Arnaldo Madeira, candidato apoiado por José Serra na eleição para líder da bancada tucana na Câmara Federal. Não foi uma derrota qualquer porque o vitorioso, deputado José Aníbal, não apenas defende com entusiasmo a candidatura de Geraldo Alckmin à prefeitura de São Paulo (Serra gostaria que o ex-governador ficasse de fora, a fim de que o PSDB indicasse o vice na chapa encabeçada pelo prefeito Gilberto Kassab), como é um dos grandes desafetos de Serra no tucanato.

A vitória de Aníbal praticamente selou a candidatura de Alckmin à prefeitura e o próprio Serra reconheceu, na sexta-feira, que o ex-governador só não será candidato se não quiser. Foi a primeira vez que o governador de São Paulo reconheceu publicamente a força de seu adversário de partido. Até agora, Serra vinha dando demostrações de grande apreço pela candidatura de Kassab e simplesmente ignorava o pleito de Alckmin.

Gente que conhece o tucanato de dentro já avisava há muito tempo que o governador não tem controle do partido em São Paulo. Geraldo Alckmin foi vice governador e governador por dois mandatos, não é nenhum idiota e aproveitou o período para montar suas posições no PSDB. Na disputa interna, da máquina partidária, não havia como Serra levar a melhor. O que não se sabia é que também nacionalmente Alckmin consegiu costurar um bom acordo (com o mineiro Aécio Neves, naturalmente) para isolar Serra. A jogada de Alckmin e Aécio funcionou e agora Serra está em uma posição desconfortável no PSDB.

Será realmente constrangedor para o governador Serra assistir a uma campanha em que o candidato de seu partido criticará o trabalho que vem sendo realizando em conjunto pelo prefeito Kassab e o grupo serrista do PSDB. Isto, no entanto, é pouco perto do constrangimento que surgirá se Alckmin vencer a eleição. Uma vez prefeito, ele deverá retribuir o apoio do governador Aécio Neves e trabalhar pela candidatura do mineiro à presidência da República. É tudo que Serra não precisava.

Geraldo Alckmin parece bobo, tem o infeliz apelido de "picolé de chuchu", mas a verdade é que de bobo ele não tem nada. Em 2002, o atual governador de São Paulo foi emparedado por Alckmin e perdeu a indicação para disputar a presidência pelo PSDB. Quando tudo indicava que a vingança, aquele prato que se come frio, seria servida em 2008, eis que mais uma vez o esperto Alckmin aplica um golpe de mestre e deixa Serra nas cordas, sem ação. O bunker montado no Bandeirantes vai continuar trabalhando a todo vapor, mas é possível que em 2010 José Serra tenha que se esforçar para garantir a candidatura à reeleição para o governo do Estado. O que já não vai ser pouca coisa...

Comentários

  1. Lula está bem representado no DCI e no OI. E o PICB(partido da imprensa chapa branca) cresce a olhos vistos.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

O Entrelinhas não censura comentaristas, mas não publica ofensas pessoais e comentários com uso de expressões chulas. Os comentários serão moderados, mas são sempre muito bem vindos.

Postagens mais visitadas deste blog

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue...

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And...

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...