Não, nitidamente, não é jornalismo. Se alguém tinha alguma dúvida, a capa de Veja desta semana, reproduzida acima, é esclarecedora: trata-se de um panfleto de direita e não uma revista informativa. O jornalista Luis Nassif, que está escrevendo um dossiê sobre a revista Veja em seu blog, é até gentil ao classificar de “jornalismo de esgoto” o que é publicado na revistona mais vendida do país. Na verdade, não há jornalismo algum ali, apenas um apanhado de comentários e textos, muitos deles claramente ficcionais, sobre o que de mais importante a ultradireita considera ter ocorrido na semana. É, digamos assim, uma revista de formação e não de informação – e muito bem feita, por sinal.
Sem mencionar o conteúdo das “reportagens” internas, uma rápida análise da capa desta semana é suficiente para provar o caráter da revista. “Já vai tarde - o fim melancólico do ditador que isolou Cuba e hipnotizou a esquerda durante 50 anos” é uma chamada e tanto. Bem, “Já vai tarde” é o que pensa a família Civita e os muito bem pagos puxa-sacos que trabalham na árdua função de “editar” (editorializar seria mais preciso) Veja. Até aí, o script da ultradireita caminha bem. “Fim melancólico do ditador que isolou Cuba”, porém, já força um pouco a barra. Primeiro, porque não há nada de melancólico na renúncia de Fidel. Ele soube sair de cena, preparou a sua sucessão, continua escrevendo e divulgando as suas idéias (bem mais lidas do que as da família Civita, é bom que se diga). Ora, o que há de melancólico na troca de comando em Cuba? Ao contrário do que certamente desejavam a família Civita e os cubanos de Miami, não houve revolta popular contra o regime de Fidel e nem ele morreu no poder para que pudessem dizer que em Cuba a presidência era vitalícia.
Em segundo lugar, não foi Fidel quem isolou Cuba, mas os Estados Unidos da América - pátria dos Civita –, por meio do desumano embargo que já dura décadas. Outra incorreção da chamada é dizer que Fidel “hipnotizou” a esquerda mundial. Trata-se apenas de uma figura de linguagem ruim, pois a esquerda não foi “hipnotizada” por ninguém, ao contrário, estava lutando ao lado de Fidel, como esteve ao lado do camarada Stálin, por exemplo. A esquerda pode ter cometido erros, mas “hipnotizada” pelo comandante, definitivamente não foi.
A cereja no bolo desta edição de Veja é a pequena foto do presidente Lula no alto da capa, acima de Fidel e com pose de Superman. “Popularidade - Lula surfa nos bons números do capitalismo brasileiro” é a chamada que acompanha a imagem. Claro, trata-se de uma referência ao excelente desempenho do presidente brasileiro na pesquisa CNT/Sensus divulgada na semana passada. A revista já traz a explicação do aumento da popularidade logo na capa, para não deixar dúvidas: é a “rendenção” de Lula à economia de mercado o que o faz o mais popular dos presidentes brasileiros desde a redemocratização, a despeito da vergonhosa campanha da própria Veja contra o presidente. Ou seja, Lula é a esquerda que, domesticada, “deu certo”. Embora também não tolere o governo do presidente-operário, o panfletão da Abril deixa claro que, pelo menos até aqui, Lula e Fidel são diferentes.
Tudo somado, a edição de Veja desta semana devia ser estudada não nos cursos de jornalismo, mas nos de publicidade. É um bom jeito para os futuros marqueteiros dos futuros Malufs, Pittas e afins aprenderem como vender gato por lebre. Isto, melhor do que Veja ninguém faz.
Parabés pelo "fracasso da oposição e da imprensa", o Carteiro do Poeta sorveu a liberdade de reproduzi-lo no (http://carteirodopoeta.blogspot.com/). Sobre a postagem da Veja, Luiz, é o PIG soltando seu PUM fedorento na cara do leitor. Uma originalíssima bomba de gás que infecta nossa liberdade de imprensa. Melhor assim do que no tempo dos livros didáticos da Abril, que transformava nossas escolas públicas em balcão de negócios quase obrigatórios e humilhantes para os pais desempregados ou sem dinheiro. Melhor ainda é perceber que, apesar de tudo o que deveria ser e não é como gostaríamos, parece que os brasileiros e brasileiras andaram se vacinando contra o veneno da mídia, aproveitando as sugestões irresponsáveis de vacinação em massa contra a febre amarela.
ResponderExcluirLimpo, preciso, conciso, informativo. Belíssimo texto! Por isto frequento o seu blog. PS. Já votei também.
ResponderExcluirm.iack, obrigado pelo voto. Se der para passar o blog Democratas, já está ótimo. Em breve farei nova "convocação" para os leitores.
ResponderExcluirabs. LAM
Muito boa a matéria da VEja sobre Cuba de Fidel. Recomendo a leitura. E isso é sim jornalismo. Pior é o que faz a CArta Capital que traz uma matéria elogiando a ditadura castrista que tem sim seus êxitos, mas tem também seu espaço de tirania, de contradição e de injustiça.
ResponderExcluirFiquei estupefata ao ver a capa da Veja, que mostra o quanto o conteúdo desta revista é medíocre. Eu não gosto do Bush, por exemplo, mas, mesmo se precisasse escrever uma matéria sobre ele, não colocaria um título como “Já foi tarde”. Acredito que um jornalista deva ter o cuidado para que a linguagem que usa não seja antiética, apelativa ou grosseira. E a frase “Já foi tarde” é tudo isso... E também é fascista, pois “mata”, de forma categórica, a notícia da renúncia de Fidel, ao tratar, com extremo cinismo e deboche, a trajetória de um homem que, embora tenha cometido erros, foi corajoso, autêntico e realizador como pouquíssimas pessoas. Fidel foi capaz de acabar com a colonização dos EUA em seu país. Assim, ele conseguiu restituir a dignidade e a integridade de Cuba. Este é um feito extraordinário. Alguns profissionais da Veja se ressentem da integridade de Fidel talvez porque sejam mentalmente colonizados e incapazes de realizar um projeto realmente autêntico e inovador. Ao invés disso, eles são cordeiros que só sabem repetir, repetir, ad infinitum. Um homem como Fidel, que permanece firme, realizando seu projeto até que a decadência natural que advém da idade avançada (pela qual quase TODOS nós passamos ou passaremos) o impeça, não pode ter um fim considerado melancólico. O fato de Fidel ter lutado pelo que acreditava até onde suas forças lhe permitiram o torna vencedor – um realizador de seu destino.
ResponderExcluirExelente observação. Mais manipulador veículo de ''informação'' do que a revista Veja não há.
ResponderExcluirMas é bom deixar claro que jornalismo hoje não é sinônimo de imparcialidade. Os jornais e revistas esquedistas também fazem suas ''propagandas''. O que nos assusta é que a propaganda da Veja é escancarada, enquanto a dos outros veículos, sejam eles esquerdistas ou de direita, não. Não leiam Folha de São Paulo na ilusão de que se trata de um jornal imparcial. O jornalista, ao escrever, não se despe do que é ou desconsidera a ideologia de quem o paga. Jornais, revistas, a mídia toda, é um grande festival de manipulação: bem-vindos à realidade.
Exelente observação.
ResponderExcluirVeículo de ''informação'' mais manipulador que Veja não há.
Mas é preciso deixar claro que jornalismo hoje não é sinônimo de imparcialidade. Todo veículo faz sua propaganda, seja ele esquerdista ou de direita. O que nos assusta é que, no caso de Veja, essa propaganda é escancarada e indecente.
Não leiam Folha de São Paulo na ilusão de que se trata de um jornal imparcial. O jornalista, ao escrever, não se despe do que é ou desconsidera a ideologia de quem o paga.
Jornais, revista, a mídia toda, são um grande festival de manipulação: bem-vindos à realidade.