Agora morando no Brasil, Bebel Gilberto lança seu primeiro disco de estúdio em 6 anos, com músicas feitas “sem pressão” e parceria com Mart’nália, revela Fernanda Cirenza em matéria no Valor, publicada sexta, 21/8. Continua abaixo.
Aos 54 anos, Bebel Gilberto está contente com a repercussão de seu sexto e novo álbum, “Agora”, com lançamento mundial previsto para hoje. “Estou me sentindo mesmo. É um momento de glória poder falar deste trabalho maravilhoso em plena pandemia sem sair de casa, sem tanta correria. Anos atrás eu dava entrevistas depois de seis, sete meses de um disco estar no mercado”, diz.
Seu primeiro trabalho de estúdio em seis anos, “Agora” começou a ser feito sem planejamento, bem diferente de “Tudo” (2014), quando sofreu “muita pressão” para gravar e que saiu um ano depois do DVD “Bebel Gilberto in Rio”. O excesso de trabalho, horários e compromissos daquela época levou a artista a dar um tempo, passando uma temporada pelo mundo em shows com voz e violão. “Foi meu ganha-pão, e eu não sentia nenhuma falta de estúdio.”
Em 2017, em passagem por Puglia, região localizada no calcanhar da “bota” que forma o mapa da Itália, Bebel diz que bateu uma vontade incontrolável de criar novas canções. “Passei um mês por lá e fiquei muito sozinha porque não conhecia ninguém. Fiz uma amizade e outra, mas Isso foi importante para o ‘Agora’ porque, quando voltei, estava cheia de energia.”
No encontro com o americano Thomas Bartlett, em seu estúdio em Nova York, Bebel afirma ter ficado “meio tensa” por causa do “background” dele - pianista, produtor e criador de ambientações em álbuns de grandes nomes, como Norah Jones, Sufjan Stevens e Yoko Ono, entre outros.
A ansiedade passou, e os dois começaram a compor com liberdade, sem expectativas de fazer nada além de música boa. Foram dois anos de trabalho, de 2017 a 2019. “Quando a gente se deu conta, tínhamos 17 canções. Só a partir daí procuramos uma casa para fazer o álbum. Foi como parto normal, e eu realmente estou com ‘good feeling’ [boa sensação] com este disco”, diz.
Das 17 inéditas, 11 estão em “Agora”. Além de coautor em todas as faixas, Bartlett é o produtor do álbum que sai pela gravadora belga [PIAS] Recordings. O primeiro single, “Deixa”, está nas plataformas de “streaming” desde março. Já o disco traz duas participações, uma com a carioca Mart’nália, nas canções “Na Cara” (cujo single está disponível desde junho) e “Raio”, e outra com a americana Jennifer Charles, em “Bolero” (disponibilizado em abril).
Na primeira, a letra foi feita em trocas de conversa pelo WhatsApp entre as duas. Depois, gravaram juntas em Nova York. “Essa é a minha porção funk”, diz Bebel. Em “Raio”, Mart’nália empresta sua voz. “Bolero”, apropriadamente cantada em espanhol, registra a lembrança de um amor que Bebel deixou escapar pelas ruas de Madrid. “Jennifer fala muito bem o idioma, foi uma ótima parceria.”
A canção-título tem letra forte embalada por um som pulsante de instrumentos de percussão: “Agora eu posso ouvir/ posso então cantar/ eu sempre falei que podia ser muito melhor/ mas você nunca me entendeu”. É uma música sincera como todo o disco, segundo Bebel. Na sequência, sua voz completa: “De dentro para fora/ é só você confiar”. “Todo Agora” é permeado por um “mantra eletrônico envolvente, que serve para namorar, para dançar, para cozinhar, para tantas coisas”, diz.
O novo álbum é também o primeiro da artista depois das mortes, uma atrás da outra, de seus pais. “Um choque de emoções.” A cantora e compositora Miúcha morreu em dezembro de 2018, aos 81 anos, e João Gilberto, sete meses depois, em julho do ano passado, aos 88 anos. “Foram momentos difíceis.”
“Agora” ainda coincide com datas marcantes da trajetória de Bebel. Há 40 anos, quando era uma adolescente de 14 anos, estreava ao lado do pai e seu violão, cantando “Chega de Saudade”, escrita por Vinicius de Moraes (1913-1980) e Antonio Carlos Jobim (1927-1994), em um especial para a televisão. Outra data importante: há 20 anos, Bebel fazia sua estreia internacional com “Tanto Tempo”, que vendeu quase 3 milhões de cópias e a levou à categoria de diva da bossa nova eletrônica.
Além do novo disco, Bebel está de casa nova. Depois de ter vivido por quase três décadas em Nova York, ela trocou a cidade americana pelo Rio de Janeiro. “Sou americanizada, nasci lá e passei muito tempo na cidade. Morava numa cobertura maravilhosa com vista para o Empire State, foi ótimo. Mas até fico pasma como sou abençoada de estar no Brasil. As pessoas que estão no poder são um horror, é fato, mas nós somos guerreiros. Com a pandemia, não estou trabalhando tanto e não teria poder econômico para continuar em Nova York. Decidi adotar uma forma sóbria de viver e ainda tenho uma vista linda da minha janela.”
No começo do ano, depois de uma passagem pelo Japão, quando “todo mundo já estava de máscara”, uma parada em Los Angeles, nos Estados Unidos, e outra em Porto Seguro, na Bahia, Bebel se sentiu muito mal e precisou ser hospitalizada. Podia ser covid-19. Não era. “Fiz dois testes, ambos negativos para esse vírus. O diagnóstico foi infuenza-B. Tive febre alta, como criança, que me fez delirar. Entrei no soro, fui medicada, tomei todas as vacinas e estou totalmente recuperada.”
A cantora diz estar “relax” com o distanciamento social imposto pela pandemia. Tem se cuidado com ginástica (“Não posso parar de me exercitar porque tenho dois tornozelos quebrados”), conversado com uma vizinha e cozinhado com ingredientes saudáveis, “muito inhame, muita cúrcuma”.
Diz que seu apartamento ainda não está todo arrumado e que precisa colocar a casa em ordem. “Conheço pessoas que foram para a montanha e estão desesperadas porque estão sem internet ou qualquer outra coisa. Estou aqui, sempre vivi sozinha, foi uma opção minha não ter filhos, levar a vida desse jeito, com muita liberdade.”
Também toca violão, canta e ouve muita música. No momento, faz uma “playlist” para estar em companhia de Lauryn Hill, Billie Holiday (1915-1959), Chet Baker (1929-1988) e Gilberto Gil, entre outros. “Você tem de ter na sua a música ‘Meu Ego’, gravada por Erasmo (Carlos) e Nara (Leão). Acho que vou virar DJ porque a minha seleção está maravilhosa.”
Para ela, este momento de isolamento escancara o valor da arte. “As pessoas não estavam se dando conta do que é a arte. Com a pandemia, estão sentindo saudade de ir a um show, de visitar um museu”, diz. Aquela vida de noitadas por bares do Baixo Leblon em companhia de Cazuza (1958-1990), seu grande amigo e parceiro, ficou no passado.
“Eu já era bem caseira em Nova York. Sinceramente, estou muito bem aqui. Ficar fechada não tem sido um problema. Adoro festa, mas ‘no place like home’ [não há lugar como o lar]. No mais, nunca gostei de aglomeração. Só sinto pelos jovens, que vão ter de inventar uma nova maneira de curtir a vida. Por aqui, garanto, paz de espírito.”
Aos 54 anos, Bebel Gilberto está contente com a repercussão de seu sexto e novo álbum, “Agora”, com lançamento mundial previsto para hoje. “Estou me sentindo mesmo. É um momento de glória poder falar deste trabalho maravilhoso em plena pandemia sem sair de casa, sem tanta correria. Anos atrás eu dava entrevistas depois de seis, sete meses de um disco estar no mercado”, diz.
Seu primeiro trabalho de estúdio em seis anos, “Agora” começou a ser feito sem planejamento, bem diferente de “Tudo” (2014), quando sofreu “muita pressão” para gravar e que saiu um ano depois do DVD “Bebel Gilberto in Rio”. O excesso de trabalho, horários e compromissos daquela época levou a artista a dar um tempo, passando uma temporada pelo mundo em shows com voz e violão. “Foi meu ganha-pão, e eu não sentia nenhuma falta de estúdio.”
Em 2017, em passagem por Puglia, região localizada no calcanhar da “bota” que forma o mapa da Itália, Bebel diz que bateu uma vontade incontrolável de criar novas canções. “Passei um mês por lá e fiquei muito sozinha porque não conhecia ninguém. Fiz uma amizade e outra, mas Isso foi importante para o ‘Agora’ porque, quando voltei, estava cheia de energia.”
No encontro com o americano Thomas Bartlett, em seu estúdio em Nova York, Bebel afirma ter ficado “meio tensa” por causa do “background” dele - pianista, produtor e criador de ambientações em álbuns de grandes nomes, como Norah Jones, Sufjan Stevens e Yoko Ono, entre outros.
A ansiedade passou, e os dois começaram a compor com liberdade, sem expectativas de fazer nada além de música boa. Foram dois anos de trabalho, de 2017 a 2019. “Quando a gente se deu conta, tínhamos 17 canções. Só a partir daí procuramos uma casa para fazer o álbum. Foi como parto normal, e eu realmente estou com ‘good feeling’ [boa sensação] com este disco”, diz.
Das 17 inéditas, 11 estão em “Agora”. Além de coautor em todas as faixas, Bartlett é o produtor do álbum que sai pela gravadora belga [PIAS] Recordings. O primeiro single, “Deixa”, está nas plataformas de “streaming” desde março. Já o disco traz duas participações, uma com a carioca Mart’nália, nas canções “Na Cara” (cujo single está disponível desde junho) e “Raio”, e outra com a americana Jennifer Charles, em “Bolero” (disponibilizado em abril).
Na primeira, a letra foi feita em trocas de conversa pelo WhatsApp entre as duas. Depois, gravaram juntas em Nova York. “Essa é a minha porção funk”, diz Bebel. Em “Raio”, Mart’nália empresta sua voz. “Bolero”, apropriadamente cantada em espanhol, registra a lembrança de um amor que Bebel deixou escapar pelas ruas de Madrid. “Jennifer fala muito bem o idioma, foi uma ótima parceria.”
A canção-título tem letra forte embalada por um som pulsante de instrumentos de percussão: “Agora eu posso ouvir/ posso então cantar/ eu sempre falei que podia ser muito melhor/ mas você nunca me entendeu”. É uma música sincera como todo o disco, segundo Bebel. Na sequência, sua voz completa: “De dentro para fora/ é só você confiar”. “Todo Agora” é permeado por um “mantra eletrônico envolvente, que serve para namorar, para dançar, para cozinhar, para tantas coisas”, diz.
O novo álbum é também o primeiro da artista depois das mortes, uma atrás da outra, de seus pais. “Um choque de emoções.” A cantora e compositora Miúcha morreu em dezembro de 2018, aos 81 anos, e João Gilberto, sete meses depois, em julho do ano passado, aos 88 anos. “Foram momentos difíceis.”
“Agora” ainda coincide com datas marcantes da trajetória de Bebel. Há 40 anos, quando era uma adolescente de 14 anos, estreava ao lado do pai e seu violão, cantando “Chega de Saudade”, escrita por Vinicius de Moraes (1913-1980) e Antonio Carlos Jobim (1927-1994), em um especial para a televisão. Outra data importante: há 20 anos, Bebel fazia sua estreia internacional com “Tanto Tempo”, que vendeu quase 3 milhões de cópias e a levou à categoria de diva da bossa nova eletrônica.
Além do novo disco, Bebel está de casa nova. Depois de ter vivido por quase três décadas em Nova York, ela trocou a cidade americana pelo Rio de Janeiro. “Sou americanizada, nasci lá e passei muito tempo na cidade. Morava numa cobertura maravilhosa com vista para o Empire State, foi ótimo. Mas até fico pasma como sou abençoada de estar no Brasil. As pessoas que estão no poder são um horror, é fato, mas nós somos guerreiros. Com a pandemia, não estou trabalhando tanto e não teria poder econômico para continuar em Nova York. Decidi adotar uma forma sóbria de viver e ainda tenho uma vista linda da minha janela.”
No começo do ano, depois de uma passagem pelo Japão, quando “todo mundo já estava de máscara”, uma parada em Los Angeles, nos Estados Unidos, e outra em Porto Seguro, na Bahia, Bebel se sentiu muito mal e precisou ser hospitalizada. Podia ser covid-19. Não era. “Fiz dois testes, ambos negativos para esse vírus. O diagnóstico foi infuenza-B. Tive febre alta, como criança, que me fez delirar. Entrei no soro, fui medicada, tomei todas as vacinas e estou totalmente recuperada.”
A cantora diz estar “relax” com o distanciamento social imposto pela pandemia. Tem se cuidado com ginástica (“Não posso parar de me exercitar porque tenho dois tornozelos quebrados”), conversado com uma vizinha e cozinhado com ingredientes saudáveis, “muito inhame, muita cúrcuma”.
Diz que seu apartamento ainda não está todo arrumado e que precisa colocar a casa em ordem. “Conheço pessoas que foram para a montanha e estão desesperadas porque estão sem internet ou qualquer outra coisa. Estou aqui, sempre vivi sozinha, foi uma opção minha não ter filhos, levar a vida desse jeito, com muita liberdade.”
Também toca violão, canta e ouve muita música. No momento, faz uma “playlist” para estar em companhia de Lauryn Hill, Billie Holiday (1915-1959), Chet Baker (1929-1988) e Gilberto Gil, entre outros. “Você tem de ter na sua a música ‘Meu Ego’, gravada por Erasmo (Carlos) e Nara (Leão). Acho que vou virar DJ porque a minha seleção está maravilhosa.”
Para ela, este momento de isolamento escancara o valor da arte. “As pessoas não estavam se dando conta do que é a arte. Com a pandemia, estão sentindo saudade de ir a um show, de visitar um museu”, diz. Aquela vida de noitadas por bares do Baixo Leblon em companhia de Cazuza (1958-1990), seu grande amigo e parceiro, ficou no passado.
“Eu já era bem caseira em Nova York. Sinceramente, estou muito bem aqui. Ficar fechada não tem sido um problema. Adoro festa, mas ‘no place like home’ [não há lugar como o lar]. No mais, nunca gostei de aglomeração. Só sinto pelos jovens, que vão ter de inventar uma nova maneira de curtir a vida. Por aqui, garanto, paz de espírito.”
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