Pular para o conteúdo principal

A hora e a vez de Eduardo Azeredo

O caso das denúncias contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), já começa a esfriar na mídia e deve acabar sendo deixado de lado em breve, tão logo o Procurador-Geral da República apresente a sua denúncia sobre o mensalão tucano, esquema que teria como chefe o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG).

O maior problema do mensalão tucano é que as primeiras alegações dos próceres do PSDB já começaram a fazer água. Quando estourou o esquema petista e o empresário Marcos Valério foi apresentado ao distinto público, a denúncia sobre o caixa dois da campanha de Azeredo também ganhou as páginas dos jornais, mas acabou ficando em segundo plano em função da grande repercussão das falcatruas envolvendo o PT, algo que pelo critério jornalístico era "mais notícia", uma vez que falcatruas tucanas eram então consideradas corriqueiras... De todo modo, o que disseram os líderes do PSDB à época foi que o caso de Azeredo não se configurava como mensalão porque não havia dinheiro público envolvido.

Pelo que se sabe agora, o Procurador-Geral vai demonstrar que houve, sim, desvio de recursos públicos no mensalão tucano, desmoralizando a argumentação inicial. Teve dinheiro da Cemig, do governo de Minas e outras autarquias. Azeredo, é claro, nega tudo e reafirma que as peças publicitárias fictícias (e que foram usadas para justificar o desvio) existiram.

Este blog já analisou um aspecto da questão, lembrando que Eduardo Azeredo é um homem de sorte porque o ministro Walfrido dos Mares Guia (Articulação Política) está também ele envolvido no tal mensalão tucano.

De fato, até agora a base governista vem ignorando solenemente o caso, justamente para não deixar respingar em Walfrido. PSDB e DEM, até agora, continuam dando sustentação ao mensaleiro, mas já há vozes nos dois partidos defendendo, sempre com muita discrição, que Azeredo seja "queimado" para permitir que os dois partidos continuem em sua pregação contra o "governo mais corrupto da história". Sim, porque parece cada vez mais evidente que há uma contradição em defender a tese de que os mensaleiros petistas são bandidos e, ao mesmo tempo, preservar o "chefe da quadrilha" do mensalão tucano.

A situação de Eduardo Azeredo pode se complicar em seu próprio partido, mas é claro que ele não é nenhum néscio e vai jogar o mesmíssimo jogo que o presidente do Senado soube jogar tão bem: o tucano mineiro conhece algumas histórias cabeludas sobre os seus correligionários e aliados democratas. Pode perfeitamente mandar vazar algumas, só para dar um pouco de frio na barriga nos amigos. Não é certo que vá fazer isto, mas pode ameaçar este movimento. Não é uma escolha fácil para o PSDB entregar a cabeça de Azeredo para a opinião pública. Mas também não parece haver alternativa razoável. A julgar pelo passado tucano, em algum momento os fatos vão atropelar o processo decisório do partido, sempre excessivamente cauteloso e moroso.

No momento, porém, a verdade é que a bola ainda está com o Procurador-Geral: todos aguardam o conteúdo da denúncia. Uma vez tornado público este material, o jogo começa de verdade...

Comentários

  1. É incrível como o mensalão tucano demora para vir efetivamente à tona!

    ResponderExcluir

Postar um comentário

O Entrelinhas não censura comentaristas, mas não publica ofensas pessoais e comentários com uso de expressões chulas. Os comentários serão moderados, mas são sempre muito bem vindos.

Postagens mais visitadas deste blog

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue

OCDE e o erro do governo na gestão das expectativas

O assunto do dia nas redes é a tal negativa dos Estados Unidos para a entrada do Brasil na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto os oposicionistas aproveitam para tripudiar, os governistas tentam colocar panos quentes na questão, alegando que não houve propriamente um veto à presença do Brasil no clube dos grandes, a Série A das nações. Quem trabalha com comunicação corporativa frequentemente escuta a frase "é preciso gerenciar a expectativa dos clientes". O problema todo é que o governo do presidente Bolsonaro vendeu como grande vitória a entrada com apoio de Trump - que não era líquida e certa - do país na OCDE. Ou seja, gerenciou mal a expectativa do cliente, no caso, a opinião pública brasileira. Não deixa de ser irônico que a Argentina esteja entrando na frente, logo o país vizinho cujo próximo governo provavelmente não será dos mais alinhados a Trump. A questão toda é que o Brasil não "perdeu", como o pobre Fla-Flu que impe