O ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia (PTB), está envolvido no escândalo do mensalão tucano e emprestou R$ 500 mil ao senador Eduardo Azeredo (PSDB), de quem não cobrou e nem vai cobrar a dívida. São fatos conhecidos e que provavelmente farão parte da denúncia do Procurador-Geral da República. Nada disto, porém, justifica o tratamento dispensado ao ministro em uma "reportagem" da Folha de S. Paulo deste domingo. Com o título "Walfrido agrega a seus bens R$ 23,5 mi nos últimos 2 meses", o jornal conta na matéria que ao abrir o capital da empresa de educação da qual é sócio – a rede Pitágoras –, o ministro conseguiu levar esta bolada para casa.
Ora, não há ilícito algum na operação e se a Folha julga que o fato é relevante do ponto de vista jornalístico, deveria ter publicado no caderno Dinheiro e não no noticiário político. Mas é interessante notar que o diário da Barão de Limeira não tem publicado reportagens sobre o valor "agregado" por sócios de empresas que abriram o capital recentemente. Via de regra o que se publica é o resultado deste tipo de operação do ponto de vista da empresa e não dos sócios ou proprietários. Assim, fica evidente a intenção de insinuar, especialmente no título, que o ministro Walfrido está envolvido em mais alguma falcatrua. Quem não for até o fim do texto da reportagem certamente vai pensar desta forma. A seguir, a "reportagem" da Folha:
Walfrido agrega a seus bens R$ 23,5 mi nos últimos 2 meses
Crescimento veio com abertura de capital da holding que gerencia rede de educação que tem o ministro como sócio
Já empresário do ramo do ensino, o ministro ingressou na política como secretário de Planejamento de Belo Horizonte, no ano de 1982
PAULO PEIXOTO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE
Investigado pela Polícia Federal por suspeita de participação no valerioduto mineiro, o ministro Walfrido dos Mares Guia (Relações Institucionais) construiu carreira no setor de educação, em Minas Gerais, antes mesmo de ingressar na política. Fundou o grupo Pitágoras, em 1966, até hoje conhecido como o "colégio do Walfrido".
Nos últimos dois meses, Walfrido agregou R$ 23,5 milhões ao patrimônio com a abertura do capital da Kroton Educacional, que administra a rede de educação Pitágoras, uma das três maiores do país.
Segundo Júlio Cabizuca, sócio e amigo de adolescência de Walfrido, o ministro "sempre teve um dom especial para lidar com finanças". "Isso é muito mais fácil com ele", disse o amigo, referindo-se a como o ministro tratava pais de alunos nos anos 80, quando a inflação impunha planilhas para negociar mensalidades escolares.
Walfrido é um dos políticos mineiros sob investigação por ter sido apontado como participante do suposto esquema financeiro ilegal montado para a campanha à reeleição do então governador de Minas Eduardo Azeredo (PSDB), hoje senador. O ministro, vice de Azeredo em seu primeiro mandato (1995-1998), nega participação nas finanças da campanha.
O esquema operado por Marcos Valério, segundo a PF, ocultou origem e destino de ao menos R$ 28,5 milhões em recursos ilícitos que financiaram a campanha de Azeredo.
Professor de cursinho
De seu tempo de professor de cursinho pré-vestibular em uma sala para 35 alunos emprestada por um frade franciscano até a entrada na política como secretário de Planejamento de Belo Horizonte, em 1982, foram 16 anos.
A expansão do grupo tem três momentos. Em 1972, surgiu o primeiro colégio. Em 1979 e em 1980, a convite da construtora Mendes Júnior, foram montados três colégios no Iraque para filhos de brasileiros.
Nos anos 90, nasceu a rede Pitágoras. Hoje são 595 colégios no país que usam tecnologia e método de ensino da rede. Há mais seis colégios no Japão e dois próprios em Belo Horizonte. São cerca de 184 mil alunos. Os anos 2000 assinalam a entrada do Pitágoras no ensino superior -são nove faculdades e 14 mil estudantes.
Abertura de capital
Em 23 de julho, o Pitágoras abriu suas ações ao mercado. Os sócios-fundadores -Walfrido, Cabizuca e Evandro Neiva- tiveram as participações reduzidas, mas detêm o controle do grupo, com 51,6% das ações. Ampliaram o patrimônio pessoal, e o capital social da holding Kroton saltou de R$ 58,7 milhões para R$ 455 milhões.
O patrimônio de Walfrido está registrado na Samos Participações, empresa usada por ele para obter empréstimo de R$ 511 mil no Banco Rural para pagar dívida do caixa dois da campanha de Azeredo em 1998.
O valor do patrimônio do ministro não é revelado por sua assessoria, que só informa que a declaração de bens dele à Justiça Eleitoral em 1998 -quando foi eleito deputado federal pelo PTB- é pública. Naquele ano, registrou R$ 3.580.340,62.
A Samos, segundo sua assessoria, foi criada em 2002 por causa da venda da Biobrás, produtora de insulina sintética, para a empresa dinamarquesa Novo Nordisk. O negócio, de R$ 55 milhões, foi aprovado com restrições pelo governo, porque a venda concentrou 75% do mercado de insulina do Brasil.
A Biobrás foi criada com incentivos fiscais da extinta Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste). Dela participaram Walfrido, seu cunhado Guilherme Emrich e seu irmão Marcos, médico que morreu logo depois.
Marcos foi também fundador do Pitágoras. Tinha a mesma profissão do pai, José Maria dos Mares Guia, servidor que gostava de política, embora não fosse militante partidário.
O ingresso de Walfrido na política gerou desconfiança entre os empresários do setor, que temiam favorecimentos ao Pitágoras, afirma Roberto Dornas, presidente da Confenen (Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino). "Sempre cria uma desconfiança de que, tendo uma posição política, algum tipo de beneficiamento pode acontecer."
Ora, não há ilícito algum na operação e se a Folha julga que o fato é relevante do ponto de vista jornalístico, deveria ter publicado no caderno Dinheiro e não no noticiário político. Mas é interessante notar que o diário da Barão de Limeira não tem publicado reportagens sobre o valor "agregado" por sócios de empresas que abriram o capital recentemente. Via de regra o que se publica é o resultado deste tipo de operação do ponto de vista da empresa e não dos sócios ou proprietários. Assim, fica evidente a intenção de insinuar, especialmente no título, que o ministro Walfrido está envolvido em mais alguma falcatrua. Quem não for até o fim do texto da reportagem certamente vai pensar desta forma. A seguir, a "reportagem" da Folha:
Walfrido agrega a seus bens R$ 23,5 mi nos últimos 2 meses
Crescimento veio com abertura de capital da holding que gerencia rede de educação que tem o ministro como sócio
Já empresário do ramo do ensino, o ministro ingressou na política como secretário de Planejamento de Belo Horizonte, no ano de 1982
PAULO PEIXOTO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE
Investigado pela Polícia Federal por suspeita de participação no valerioduto mineiro, o ministro Walfrido dos Mares Guia (Relações Institucionais) construiu carreira no setor de educação, em Minas Gerais, antes mesmo de ingressar na política. Fundou o grupo Pitágoras, em 1966, até hoje conhecido como o "colégio do Walfrido".
Nos últimos dois meses, Walfrido agregou R$ 23,5 milhões ao patrimônio com a abertura do capital da Kroton Educacional, que administra a rede de educação Pitágoras, uma das três maiores do país.
Segundo Júlio Cabizuca, sócio e amigo de adolescência de Walfrido, o ministro "sempre teve um dom especial para lidar com finanças". "Isso é muito mais fácil com ele", disse o amigo, referindo-se a como o ministro tratava pais de alunos nos anos 80, quando a inflação impunha planilhas para negociar mensalidades escolares.
Walfrido é um dos políticos mineiros sob investigação por ter sido apontado como participante do suposto esquema financeiro ilegal montado para a campanha à reeleição do então governador de Minas Eduardo Azeredo (PSDB), hoje senador. O ministro, vice de Azeredo em seu primeiro mandato (1995-1998), nega participação nas finanças da campanha.
O esquema operado por Marcos Valério, segundo a PF, ocultou origem e destino de ao menos R$ 28,5 milhões em recursos ilícitos que financiaram a campanha de Azeredo.
Professor de cursinho
De seu tempo de professor de cursinho pré-vestibular em uma sala para 35 alunos emprestada por um frade franciscano até a entrada na política como secretário de Planejamento de Belo Horizonte, em 1982, foram 16 anos.
A expansão do grupo tem três momentos. Em 1972, surgiu o primeiro colégio. Em 1979 e em 1980, a convite da construtora Mendes Júnior, foram montados três colégios no Iraque para filhos de brasileiros.
Nos anos 90, nasceu a rede Pitágoras. Hoje são 595 colégios no país que usam tecnologia e método de ensino da rede. Há mais seis colégios no Japão e dois próprios em Belo Horizonte. São cerca de 184 mil alunos. Os anos 2000 assinalam a entrada do Pitágoras no ensino superior -são nove faculdades e 14 mil estudantes.
Abertura de capital
Em 23 de julho, o Pitágoras abriu suas ações ao mercado. Os sócios-fundadores -Walfrido, Cabizuca e Evandro Neiva- tiveram as participações reduzidas, mas detêm o controle do grupo, com 51,6% das ações. Ampliaram o patrimônio pessoal, e o capital social da holding Kroton saltou de R$ 58,7 milhões para R$ 455 milhões.
O patrimônio de Walfrido está registrado na Samos Participações, empresa usada por ele para obter empréstimo de R$ 511 mil no Banco Rural para pagar dívida do caixa dois da campanha de Azeredo em 1998.
O valor do patrimônio do ministro não é revelado por sua assessoria, que só informa que a declaração de bens dele à Justiça Eleitoral em 1998 -quando foi eleito deputado federal pelo PTB- é pública. Naquele ano, registrou R$ 3.580.340,62.
A Samos, segundo sua assessoria, foi criada em 2002 por causa da venda da Biobrás, produtora de insulina sintética, para a empresa dinamarquesa Novo Nordisk. O negócio, de R$ 55 milhões, foi aprovado com restrições pelo governo, porque a venda concentrou 75% do mercado de insulina do Brasil.
A Biobrás foi criada com incentivos fiscais da extinta Sudene (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste). Dela participaram Walfrido, seu cunhado Guilherme Emrich e seu irmão Marcos, médico que morreu logo depois.
Marcos foi também fundador do Pitágoras. Tinha a mesma profissão do pai, José Maria dos Mares Guia, servidor que gostava de política, embora não fosse militante partidário.
O ingresso de Walfrido na política gerou desconfiança entre os empresários do setor, que temiam favorecimentos ao Pitágoras, afirma Roberto Dornas, presidente da Confenen (Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino). "Sempre cria uma desconfiança de que, tendo uma posição política, algum tipo de beneficiamento pode acontecer."
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