Pular para o conteúdo principal

Serra por Hélio Fernandes

Dica do atento leitor Jasson Andrade, o que vai abaixo é um artigo do jornalista Hélio Fernandes, publicado originalmente na Tribuna da Imprensa. Vale a pena ir até o fim da leitura....


Concordou com juros de 40%, discorda dos 12%

Do resto, Serra não lembra, é tanta coisa que esqueceu

O cúmulo da falta de ética, da ausência de constrangimento, do excesso de histrionismo, da irresponsabilidade e da leviandade, é o senhor José Serra criticar o governo Lula pela "altura dos juros". Depois de perder duas eleições para prefeito de São Paulo, veio o governo (leia-se desgoverno FHC), e nesses 8 anos de retrocesso José Serra esteve sempre participando de tudo.

Foi eleito senador com o dinheiro do então "pai da Fiesp", que financiou a campanha mas ganhou quase todos os 8 anos do mandato de Serra. Mandato que o senador Valdeck Ornelas identificou assim, com todas as letras: "José Serra é um senador PILANTRÓPICO e não FILANTRÓPICO".

A propósito: nos EUA (o outro grande presidencialismo do mundo ocidental), os cidadãos ocupam os cargos para os quais foram eleitos. Quer dizer: senador não pode ser ministro (lá se chama secretário de Estado), deputados também têm que exercer os mandatos que disputaram.

Na reforma política que não será feita, ou melhor, se for feita como estão apregoando, haverá um colossal retrocesso, do qual o "carro-chefe" será essa vergonhosa e criminosa votação em "lista fechada". Todos os deputados, automaticamente reeleitos.

Serra critica os juros de 12 por cento do governo Lula. Tem toda a autoridade e respeitabilidade para isso, pois no governo FHC, ao qual serviu com toda a força do carreirismo implícito e explícito que é a sua marca especial, foi duro ao condenar os 40 por cento pagos na época. "Menas" verdade, aceitou tudo.

Serra não criticou e até concordou com tudo? Desculpem, esqueci.

Outra característica fundamental da "administração" José Serra no primeiro cargo, ministro do Planejamento de FHC. Não admitia que a DÍVIDA INTERNA fosse crescendo tão assombrosamente, ia para as ruas protestar. Ha! Ha! Ha!

Serra não criticou a DÍVIDA, nem andou nas ruas? Desculpem, esqueci.

Quando FHC começou a DOAR o patrimônio brasileiro de forma aviltante, entregava tudo sem dinheiro, comprometia o nosso futuro e ainda DOAVA (outra vez) recursos do BNDES para essas empresas se manterem, José Serra abandonou todos os cargos, ficou ao lado do povo e começou campanha, que mantém até hoje, pela recuperação da nossa independência. (Independência que hoje completa 185 anos e nem sabemos onde anda).

José Serra concordou com tudo, sustentou o amigo, não abandonou cargo algum? Desculpem, esqueci.

A cada DOAÇÃO, correspondia uma afirmação de FHC na televisão: "Tenho que privatizar empresas para pagar os juros da dívida". Imediatamente Serra ia também para a televisão, e condenava violentamente o amigo presidente, exclamando: "Isso é uma traição".

José Serra concordou, não protestou? Desculpem, esqueci.

Apesar de ter assumido em janeiro de 1995 com uma dívida de 62 bilhões de reais (já atualizados), saiu em 1º de janeiro de 2003 com essa dívida em mais de 700 bilhões. FHC teve que enfrentar novamente a revolta do ex-amigo que deixou todos os cargos?

José Serra não protestou nem em casa, sozinho? Desculpem, esqueci.

Quando FHC COMPROU à vista e não pelo mensalão a própria reeeleição, o grito mais estridente, mais altivo e altaneiro contra essa quebra da Constituição foi de José Serra, sempre impávido defensor das grandes causas?

José Serra não fez nada, achou ótimo 8 anos no Poder? Desculpem, esqueci.

Ainda há muita coisa a lembrar da atuação sempre patriótica desse bravo José Serra, que se acomodou quando seu governo pagava até 40 por cento de juros e agora se revolta com 12 por cento de Lula. (Que ontem caiu mais 0,25%, é pouco, veio para 11,25%, bem longe dos 40% de FHC).

PS - Fatos a lembrar da vida de José Serra? Puxa, levaria um tempo colossal para citar. Desculpem, esqueci.

PS 2 - Também esqueci, uma pena, que Serra veio do exílio, só ocupou cargos públicos, dorme tarde e acorda tarde, e construiu, mesmo assim, uma vida maravilhosa.

PS 3 - Como conseguiu tudo isso? Desculpem, esqueci.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue

OCDE e o erro do governo na gestão das expectativas

O assunto do dia nas redes é a tal negativa dos Estados Unidos para a entrada do Brasil na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto os oposicionistas aproveitam para tripudiar, os governistas tentam colocar panos quentes na questão, alegando que não houve propriamente um veto à presença do Brasil no clube dos grandes, a Série A das nações. Quem trabalha com comunicação corporativa frequentemente escuta a frase "é preciso gerenciar a expectativa dos clientes". O problema todo é que o governo do presidente Bolsonaro vendeu como grande vitória a entrada com apoio de Trump - que não era líquida e certa - do país na OCDE. Ou seja, gerenciou mal a expectativa do cliente, no caso, a opinião pública brasileira. Não deixa de ser irônico que a Argentina esteja entrando na frente, logo o país vizinho cujo próximo governo provavelmente não será dos mais alinhados a Trump. A questão toda é que o Brasil não "perdeu", como o pobre Fla-Flu que impe