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Procura-se o "anti-Marta"

Uma boa maneira de entender o resultado da última pesquisa do Ibope sobre a eleição em São Paulo é olhando para trás. Sim, conhecer o passado ajuda a entender o presente e permite até que o analista faça previsões com algum grau de segurança.

Bem, então vamos lá. Primeiro, vale a pena lembrar como foram as eleições na capital paulista. Desde a redemocratização, tivemos cinco. A primeira foi em 1985, que consagrou o conservador Jânio Quadros (PTB). Contra ele concorreram Fernando Henrique Cardoso (PMDB) e Eduardo Suplicy (PT). Cardoso tinha tudo para ser o "anti-Jânio", mas fez muita bobagem na campanha e acabou perdendo para a sua própria arrogância. Sim, é verdade que Suplicy teve ali uma certa "culpa" porque sua candidatura dividiu o campo da esquerda, mas seria inimaginável para um partido em formação, como era o PT à época, deixar de disputar a eleição com um cabeça de chapa.

A eleição seguinte, em 1988, foi disputada por Paulo Maluf (PDS), que aglutinava o eleitorado conservador e na prática era o candidato do prefeito Jânio, José Serra (PSDB), João Leiva (PMDB) e Luiza Erundina (PT). Os três disputavam o voto dos setores progressistas e só na reta final Erundina se firmou como o "anti-Maluf", vencendo o pleito de forma surpreendente.

Quatro anos depois, em 1992, o PT lançou Eduardo Suplicy e a situação se inverteu. Paulo Maluf (PDS) logo se tornou o "anti-PT" - Aloysio Nunes Ferreira (PMDB) e Fábio Feldman (PSDB) ficaram à margem da eleição - e a campanha se tornou uma disputa entre Suplicy e o candidato do PDS, que acabou vencendo o pleito.

Em 1996, pela primeira vez foi eleito um candidato que representava a situação. Bem avaliado, o prefeito Paulo Maluf conseguiu eleger seu secretário de Finanças, Celso Pitta, pelo PPB, novo nome do PDS. A divisão do campo progressista entre Luiza Erundina (PT), José Serra (PSDB) e Francisco Rossi (PDT) também ajudou Pitta, pois o eleitorado não conseguiu escolher nenhum dos três como o "anti-Maluf". Ou melhor, até escolheu – Erundina passou para o segundo turno com 27% contra 14% de Serra e 7% de Rossi –, mas a candidata não conseguiu trazer para o seu lado o eleitorado tucano, que já começava a se distanciar do campo progressista e a pender para a direita.

A eleição seguinte foi uma das mais disputadas da história da capital. O governo de Celso Pitta foi um desastre tão grande que obrigou o seu padrinho Maluf a disputar o pleito para tentar reverter a péssima imagem deixada pelo seu sucessor. Nunca é demais lembrar que durante a campanha de 1996, Maluf havia recomendado o voto em Pitta de uma maneira bem arrojada: "Vote no Pitta. Se ele não for um bom prefeito, nunca mais vote em mim", dizia Maluf. Apesar da tragédia que foi a gestão Pitta, Maluf ainda tinha um eleitorado cativo - na verdade, ainda tem, mas muito menor hoje do que àquela época - e liderava as pesquisas. O PT lançou Marta Suplicy, que vinha de uma campanha para o governo do Estado muito bem sucedida, em que terminou em terceiro lugar por uma ínfima percentagem em relação ao tucano Mário Covas, que acabou batendo o mesmo Maluf e se elegendo governador. O PSDB apostou suas fichas no então vice-governador Geraldo Alckmin. Romeu Tuma (PFL) e Luiza Erundina (PSB) correram por fora. Marta passou para o segundo turno em primeiro lugar e por uma pequena margem Alckmin não superou Paulo Maluf. O tucano ficou na terceira colocação, mas desta vez o sentimento anti-malufista era bem maior do que em 1996 e o apoio do governador Covas a Marta acabou convencendo o pessoal do PSDB a votar na petista, que venceu a eleição como a representante do tal sentimento anti-malufista.

Na eleição de 2004, que ainda está fresca na memória dos paulistanos, a polarização entre as candidaturas da então prefeita Marta Suplicy (PT) e de José Serra, recém derrotado por Lula na eleição presidencial de 2002, se impôs com naturalidade. Foi uma eleição muito disputada: Serra jogou nos erros da adversária e conseguiu vencer, deixando em seguida a prefeitura para disputar o governo de São Paulo.

Tudo isto posto, é possível dizer que o eleitorado da capital se divide em dois grupos bastante distintos: o que procura uma alternativa progressista e o que se alinha ao representante conservador. Evidentemente, há os que se juntam ora a um lado, ora ao outro, dependendo do candidato e da conjuntura. Sempre que um dos lados apresenta uma candidatura forte, o eleitorado rapidamente identifica e se coloca ao longo da campanha em posição de apoio à tal candidatura. Se o outro pólo não tem um nome natural para o embate, o que o eleitorado faz é ir observando o comportamento dos candidatos até "encontrar" a alternativa - o que estamos chamando aqui de "anti-candidato". Algumas vezes, como ocorreu em 1996, a divisão acaba prejudicando um dos lados e sendo decisiva para o resultado da eleição.

Pois bem, hoje parece claro que o campo progressista escolheu Marta Suplicy como a sua representante. É muito difícil imaginar que Soninha ou Ivan Valente consigam crescer nesta conjuntura. A esquerda é de Marta e dela ninguém vai conseguir tirar este eleitor. No campo conservador, são três as candidaturas colocadas: a de Geraldo Alckmin (PSDB), Gilberto Kassab (DEM) e Paulo Maluf (PP). Muita gente acha que na verdade apenas Alckmin e Kassab estão na disputa, mas este blog não descarta a hipótese de uma guerra fratricida levar o eleitorado conservador a optar por Maluf, deixando os dois de fora de um eventual segundo turno. Claro que é uma hipótese ainda improvável, neste momento. Os paulistanos que gostariam de ver um conservador no Palácio do Anhangabaú estão tateando no escuro, procurando referências. Em 15 ou 20 dias, o cenário ficará mais claro. Se Alckmin cair mais um pouco, tudo pode acontecer. Se o ex-governador recuperar terreno, será ele o "anti-Marta". Só a partir daí será possível analisar melhor as perspectivas da própria Marta e do candidato da direita.

Comentários

  1. Nossa, que puta texto.
    Esclarecedor. Brilhante, até.

    Venho zapeando por vários blogs procurando um texto como esses.

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