Ao acordar, qual é a primeira coisa que você faz? Se a resposta for “pegar o celular”, seja para olhar e-mails e o WhatsApp, seja para zapear no Instagram e no Facebook, então o documentário O Dilema das Redes, recém-lançado na Netflix, é para você. Se, ao longo do dia, a cada minutinho que sua mente viaja, seu gesto inconsciente é checar as atualizações, curtir fotos e interagir com amigos virtuais, então esse filme é para você. Se você tem firmes ideais políticos, de direita ou de esquerda, e tem certeza de que está do lado certo na polarização em que vivemos, então esse filme é definitivamente para você, escreve Raphael Montes em sua coluna na revista Veja, artigo publicado na edição desta semana. Vale a leitura, mas vale mais ainda assistir ao documentário, é sensacional e necessário.
A partir de entrevistas com profissionais do Vale do Silício que criaram diversas ferramentas que usamos hoje, o longa apresenta um panorama sobre o funcionamento das redes sociais e como somos levados a depender delas. A costura com o drama ficcional de uma família, para “exemplificar” o problema, é desnecessária e às vezes atrapalha, mas o assunto é tão pertinente que o deslize é perdoado. Afinal, não é sempre que vemos ex-funcionários do Facebook, Twitter, Pinterest e Instagram explicando uma tecnologia persuasiva, que enreda o usuário e determina ações, pensamentos e comportamentos. O objetivo é sempre o mesmo: extrair sua atenção pelo máximo de tempo e lucrar com ela. Não somos os clientes, somos o produto. Quanto você vale?
Tristan Harris, presidente da Center for Humane Technology, trabalhou por anos no Google. Lá, ele e sua equipe se esforçavam para deixar a caixa de entrada do Gmail o mais “viciante” possível — cores atraentes, notificações chamativas. Sabe a sensação gostosa quando alguém curte ou comenta seu post? É a dopamina no seu corpo como recompensa. Sabe quando você concorda com as “pessoas certas” da sua rede? É a seleção cuidadosa feita pela inteligência artificial do que você deve ver na tela para seguir conectado. Sua chupeta digital para acalmá-lo.
“Não é sempre que vemos ex-funcionários explicando uma tecnologia persuasiva, que enreda o usuário e determina ações”
Em certo ponto, Harris conta que sempre foi apaixonado por mágicas. Segundo ele, o trabalho do ilusionista é acessar uma parte da mente das pessoas da qual elas mesmas não têm noção. Logo me lembrei de outro especial da Netflix, The Push. Nele, o ilusionista Derren Brown cria situações de lógica da obediência e da conformidade social para pressionar um desconhecido a cometer um assassinato. O poder da informação é enorme, e as consequências podem ser devastadoras.
Atual, O Dilema das Redes comenta como o rumo de eleições foi manipulado em diversas partes do mundo, inclusive no Brasil, e como as fake news ameaçam democracias. Nesse sentido, a pandemia surge como metáfora potente da desinformação — vide a série de remédios e soluções miraculosas espalhadas virtualmente e a negação da existência do coronavírus.
Diante do cenário catastrófico, fica a pergunta: o que podemos fazer? Ter consciência é um primeiro passo. Mas não é o bastante. Se possível, diminua o uso das redes. Se conseguir, saia delas. Desinstale aplicativos que só tomam seu tempo. Desative notificações. Antes de compartilhar notícias, cheque informações. E, bem, assista ao documentário. Garanto que a relação com seu celular nunca mais será a mesma.
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