Vale a pena ler o artigo do querido Uncle King, Reinaldo Azevedo, hoje na Folha de S. Paulo. Bolsonaro não precisa do PSL para governar, vivemos sob um parlamentarismo informal, afirma o colunista, repetindo o que este blog tem escrito.
Na íntegra:
A decisão de Jair Bolsonaro de deixar o PSL para fundar a “Aliança pelo Brasil” pode ser tudo, menos irrefletida. Se o troço vai dar certo, aí é outra coisa. Há, sim, um pensamento e uma leitura da política em sua escolha. Está longe, pois, de ser maluquice. Sua “Aliança do Atraso para o Futuro”. O Brasil está a clamar pela vanguarda do retrocesso.
Observem que o Congresso aprovou uma reforma da Previdência bastante robusta sem que o presidente precisasse investir uma única vez na pacificação política.
Ao contrário: nos quase 11 meses de governo, ele e a filharada apostaram no confronto: com o Parlamento; com os respectivos presidentes das duas Casas Legislativas; com parte dos generais da reserva que chamou para compor o governo; com a imprensa; com a sua própria base de apoio; com o bom senso...
A reforma demorou mais do que o necessário, mas saiu. No dia da homologação, Bolsonaro não deu as caras. Estava reunido com a parte do PSL que pretende segui-lo na nova legenda, cujo primeiro manifesto veio à luz. A Aliança “é o sonho e a inspiração de pessoas leais ao presidente Jair Bolsonaro”. Nem Getúlio se atreveu a ser dono do PTB. Demos à luz o caudilhismo do Twitter, dos “bots” e das fake news.
Paulo Guedes já encaminhou a reforma do Estado ao Congresso e logo chegará a administrativa. Mais uma vez, mesmo sem ter uma base de apoio organizada, é razoável a chance de que passe muita coisa.
Parte considerável dos deputados e dos senadores assumiu a agenda reformista, que conta com o apoio unânime da imprensa —um ativo, note-se, que o presidente não contabiliza no seu contencioso com o jornalismo.
A maioria do Congresso tomou para si as reformas porque chegou à conclusão de que o presidente é meio destrambelhado. E o presidente pode continuar meio destrambelhado porque, afinal, o Congresso tomou para si as reformas. Entenderam? A rigor, Bolsonaro não governa. Ele é uma espécie de blogueirinho a excitar a fúria dos inconformados com “isso daí”.
O que, no Poder Legislativo, não é reforma é pregação reacionária. E independe do presidente. É um mal original. Vejam, por exemplo, a militância em favor da violação da Constituição no caso do trânsito em julgado, pauta abraçada também por setores expressivos da imprensa. Isso evidencia a capacidade que ainda conserva a Lava Jato, cujo chefe segue sendo Sergio Moro, de pautar o debate.
Ora, Bolsonaro foi convencido, e não sem razão prática, de que não pode se tornar um “insider” da política. A força da sua postulação está justamente em se apresentar como alguém de fora, com vocação disruptiva, que não cede a esquemas. É falso, mas tem sido verossímil.
Enquanto isso, Guedes segue encantando serpentes com seus “40 anos em 4”, propondo que se cobre Previdência do seguro-desemprego para gerar empregos e falando em zona de livre-comércio com a China...
Notem: Bolsonaro não precisa do PSL para governar. Vivemos, em muitos aspectos, sob os auspícios de um parlamentarismo informal. Por que ele não pode, desde já, dar curso aos esforços para se reeleger? Eu também avalio que suas chances são maiores se estiver liderando a tropa de elite dos puros —a elite e a pureza bolsonaristas, bem entendido...
Que papel, então, está reservado ao presidente? O primeiro manifesto do partido vindouro responde: “Nossa Aliança se dirige a abrigar essa grande maioria de brasileiros e brasileiras que clamam por uma nova ordem de referências éticas e morais”. Vigarice intelectual e papo-furado? É óbvio que sim! Compatível com os sofisticados que querem estuprar o Artigo 5º. É a Aliança do Atraso para o Futuro.
Lula livre ajuda o presidente a reunificar a tropa e tira potência de seus adversários na direita, mas também devolve à equação uma parcela da população que até agora não foi contemplada pelo guedismo-bolsonarismo e que não cabe no manifesto da “Aliança pelo Brasil”.
Além de Lula, o Congresso seria a outra força capaz de desarrumar o jogo de Bolsonaro. Bastaria devolver ao presidente a tarefa de governar. Mas isso não vai acontecer. Os mordomos invisíveis continuarão a administrar a casa.
Reinaldo Azevedo é jornalista, autor de “O País dos Petralhas”.
Na íntegra:
A decisão de Jair Bolsonaro de deixar o PSL para fundar a “Aliança pelo Brasil” pode ser tudo, menos irrefletida. Se o troço vai dar certo, aí é outra coisa. Há, sim, um pensamento e uma leitura da política em sua escolha. Está longe, pois, de ser maluquice. Sua “Aliança do Atraso para o Futuro”. O Brasil está a clamar pela vanguarda do retrocesso.
Observem que o Congresso aprovou uma reforma da Previdência bastante robusta sem que o presidente precisasse investir uma única vez na pacificação política.
Ao contrário: nos quase 11 meses de governo, ele e a filharada apostaram no confronto: com o Parlamento; com os respectivos presidentes das duas Casas Legislativas; com parte dos generais da reserva que chamou para compor o governo; com a imprensa; com a sua própria base de apoio; com o bom senso...
A reforma demorou mais do que o necessário, mas saiu. No dia da homologação, Bolsonaro não deu as caras. Estava reunido com a parte do PSL que pretende segui-lo na nova legenda, cujo primeiro manifesto veio à luz. A Aliança “é o sonho e a inspiração de pessoas leais ao presidente Jair Bolsonaro”. Nem Getúlio se atreveu a ser dono do PTB. Demos à luz o caudilhismo do Twitter, dos “bots” e das fake news.
Paulo Guedes já encaminhou a reforma do Estado ao Congresso e logo chegará a administrativa. Mais uma vez, mesmo sem ter uma base de apoio organizada, é razoável a chance de que passe muita coisa.
Parte considerável dos deputados e dos senadores assumiu a agenda reformista, que conta com o apoio unânime da imprensa —um ativo, note-se, que o presidente não contabiliza no seu contencioso com o jornalismo.
A maioria do Congresso tomou para si as reformas porque chegou à conclusão de que o presidente é meio destrambelhado. E o presidente pode continuar meio destrambelhado porque, afinal, o Congresso tomou para si as reformas. Entenderam? A rigor, Bolsonaro não governa. Ele é uma espécie de blogueirinho a excitar a fúria dos inconformados com “isso daí”.
O que, no Poder Legislativo, não é reforma é pregação reacionária. E independe do presidente. É um mal original. Vejam, por exemplo, a militância em favor da violação da Constituição no caso do trânsito em julgado, pauta abraçada também por setores expressivos da imprensa. Isso evidencia a capacidade que ainda conserva a Lava Jato, cujo chefe segue sendo Sergio Moro, de pautar o debate.
Ora, Bolsonaro foi convencido, e não sem razão prática, de que não pode se tornar um “insider” da política. A força da sua postulação está justamente em se apresentar como alguém de fora, com vocação disruptiva, que não cede a esquemas. É falso, mas tem sido verossímil.
Enquanto isso, Guedes segue encantando serpentes com seus “40 anos em 4”, propondo que se cobre Previdência do seguro-desemprego para gerar empregos e falando em zona de livre-comércio com a China...
Notem: Bolsonaro não precisa do PSL para governar. Vivemos, em muitos aspectos, sob os auspícios de um parlamentarismo informal. Por que ele não pode, desde já, dar curso aos esforços para se reeleger? Eu também avalio que suas chances são maiores se estiver liderando a tropa de elite dos puros —a elite e a pureza bolsonaristas, bem entendido...
Que papel, então, está reservado ao presidente? O primeiro manifesto do partido vindouro responde: “Nossa Aliança se dirige a abrigar essa grande maioria de brasileiros e brasileiras que clamam por uma nova ordem de referências éticas e morais”. Vigarice intelectual e papo-furado? É óbvio que sim! Compatível com os sofisticados que querem estuprar o Artigo 5º. É a Aliança do Atraso para o Futuro.
Lula livre ajuda o presidente a reunificar a tropa e tira potência de seus adversários na direita, mas também devolve à equação uma parcela da população que até agora não foi contemplada pelo guedismo-bolsonarismo e que não cabe no manifesto da “Aliança pelo Brasil”.
Além de Lula, o Congresso seria a outra força capaz de desarrumar o jogo de Bolsonaro. Bastaria devolver ao presidente a tarefa de governar. Mas isso não vai acontecer. Os mordomos invisíveis continuarão a administrar a casa.
Reinaldo Azevedo é jornalista, autor de “O País dos Petralhas”.
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