Pular para o conteúdo principal

Ler nos faz mais conscientes, afirma Gabriela Prioli

Comentarista política e popular nas redes, a advogada paulistana, 35, investe em clube de leitura e dá sua receita para lidar com os haters na internet, escreve Eduardo F. Filho na Veja desta semana. Abaixo, a íntegra da entrevista. 

Após a criação de seu clube do livro, você está lançando uma nova iniciativa na área ao lado do historiador Leandro Karnal, pela editora Planeta. Como descobriu o poder da leitura? 

Perdi meu pai em um acidente de carro aos 6 anos. Percebi meu contato com os livros na adolescência, ao encontrar os clássicos dele espalhados pela casa, como Elogio da Loucura, de Erasmo de Roterdã, e O Príncipe, de Maquiavel. Li todos no intuito de conhecer um pouco mais sobre meu pai. Ainda tenho a maioria, mas guardo um em especial: o Germinal, do Émile Zola. Num sonho, meu pai dizia que todas as respostas às minhas dúvidas estavam nesse livro.

Qual é o seu critério na hora de recomendar uma obra? 

Um livro bem escrito e alicerçado em boa pesquisa é o que recomendo a meus seguidores. Sou muito transparente nas indicações. Se digo que li e gostei, é porque de fato já percorri aquelas páginas. Quando me empenho na leitura, descubro um mundo de identificação e autoconhecimento, e não me sinto mais insegura ou solitária. Ler nos faz mais conscientes.

No Instagram, você fala de política usando salto alto e roupas de grife, além de fazer propaganda de produtos de beleza. Como se equilibra entre a temática séria e a futilidade das redes?

Falo com orgulho que sou influenciadora, youtuber, advogada, professora e apresentadora. Gosto de acumular possibilidades, sou uma mulher múltipla. No começo, diziam que eu não podia falar sobre assuntos sérios usando sapatos cor-de-rosa, batom vermelho e acessórios grandes. Hoje, vejo advogadas e professoras postando a foto do look do dia sem se importar se serão criticadas. A roupa, os brincos, a maquiagem que a gente usa não dizem nada sobre quão competentes e quão profissionais nós somos.

Sua postura mais à esquerda a tornou alvo dos fãs do presidente Jair Bolsonaro. Como lida com os haters? 

Eu recebo críticas da esquerda também. As pessoas me chamam de parcial e isenta ao mesmo tempo, olha como o mundo é contraditório. É que tem muita gente na ala contra o Bolsonaro hoje, né?! Ele conseguiu unir tantas opiniões diferentes no país. Gosto que as pessoas sigam uma ideologia, não um nome ou rótulo. E encaro críticas com naturalidade. Não concordo com todos, e é normal que nem todos concordem comigo. Precisamos fortalecer o debate democrático, pois a polarização inviabiliza o diálogo.

Um de seus posts recentes traz um tutorial para filtrar comentários negativos. Faz muito uso dessa ferramenta? 

Não tolero ofensas em minhas redes sociais. Se me ofendem ou me xingam, há o filtro. Se por acaso um comentário escapa, tenho uma equipe que o barra e bloqueia a pessoa. Ou seja: as ofensas não chegam até mim. Só leio afeto, mas lido com absoluta tranquilidade com pensamentos contrários aos meus. Democracia é isso.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And...

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...

Dúvida atroz

A difícil situação em que se encontra hoje o presidente da República, com 51% de avaliação negativa do governo, 54% favoráveis ao impeachment e rejeição eleitoral batendo na casa dos 60%, anima e ao mesmo tempo impõe um dilema aos que articulam candidaturas ditas de centro: bater em quem desde já, Lula ou Bolsonaro?  Há quem já tenha a resposta, como Ciro Gomes (PDT). Há também os que concordam com ele e vejam o ex-presidente como alvo preferencial. Mas há quem prefira investir prioritariamente no derretimento do atual, a ponto de tornar a hipótese de uma desistência — hoje impensável, mas compatível com o apreço presidencial pelo teatro da conturbação — em algo factível. Ao que tudo indica, só o tempo será capaz de construir um consenso. Se for possível chegar a ele, claro. Por ora, cada qual vai seguindo a sua trilha. Os dois personagens posicionados na linha de tiro devido à condição de preferidos nas pesquisas não escondem o desejo de se enfrentar sem os empecilhos de terceira,...