Pular para o conteúdo principal

Como a guerra no PSL afeta o governo?

Definitivamente, esta não foi uma boa semana para o governo: o partido de Jair Bolsonaro continuou conflagrado, o líder do governo chamou o presidente da República de vagabundo e o misterioso óleo que tomou conta da costa de parte do nordeste chegou à Baia de Todos os Santos, em Salvador, provocando comoção nacional.
Pior, a confusão na política e o desastre ambiental ofuscaram boas notícias na economia, que poderiam ter sido capitalizadas pelo presidente: juros reais nos menores patamares da história do país, emprego se recuperando – lentamente, é verdade, mas já um alento – e uma discreta melhora nas vendas do varejo.
A questão do PSL está longe de uma solução, até porque ninguém poderia esperar coesão de um partido que a rigor serviu de canoa para a candidatura presidencial de Bolsonaro – ele ingressou no PSL depois de negociar com diversas legendas, sua vida partidária foi quase toda ela no PP do ex-governador paulista Paulo Maluf. É compreensível, portanto, que a disputa de poder na agremiação, inflada pelos votos do capitão, esteja apenas começando e não é difícil imaginar como vai acabar: mal.
Já foi noticiado que Bolsonaro deve deixar a legenda levando seus aliados no parlamento junto, no momento oportuno, até para evitar que o PSL vá a Justiça reclamar os mandatos. O jogo de braço entre bolsonaristas e os integrantes do partido leais ao presidente Luciano Bivar diz respeito à política e poder, mas mais ainda a dinheiro, isto é, está em disputa o butim do fundo partidário, que significa o grosso do financiamento das futuras campanhas eleitorais em 2020 e 2022.

Impacto no governo
Mas qual é, na prática, o efeito da balbúrdia no PSL para o governo? Em termos gerais, pode representar alguma dificuldade adicional na articulação no Congresso – um exemplo deste efeito pôde ser visto nesta semana quando a ala “bivarista” se aliou ao PSOL para exigir a apresentação das condições da reforma da Previdência para os militares.
Evidentemente, seria melhor para o presidente que seu partido marchasse unido, porém a própria constituição do PSL e seu inchaço já indicavam que alguma hora uma ruptura aconteceria. Na prática, portanto, a balança vai pender para o lado que estiver mais forte – e no momento o presidente é muito mais forte que Luciano Bivar: tem a “caneta Bic” na mão, popularidade – pesquisa divulgada nesta semana mostrou que Bolsonaro bate Lula, Haddad, Ciro e empata com Luciano Huck em uma disputa de segundo turno, se a eleição fosse hoje. Perder, só perde de Sergio Moro, que prometeu não concorrer, de acordo com a mesma enquete, divulgada pela revista Veja e realizada pelo Instituto FSB de pesquisas.
Só que a eleição não é hoje e sim daqui três anos, de forma que o cenário pode mudar, e a variável mais importante, claro, é mesmo a economia. Em caso de recuperação, Bolsonaro se cacifa e dificilmente boa parte dos “bivaristas” permanecerá ao lado do atual presidente da legenda, ao passo que se o cenário for de estagnação ou nova recessão, o apoio vai se desmanchar rapidamente.
Tudo somado, são percalços que quase todo governo enfrenta, embora neste episódio a grosseria tenha chamado mais atenção, e sobretudo o fato de o presidente ter sido gravado secretamente, o que mostra um padrão de conduta estarrecedor, vindo de gente que supostamente é aliada e dá suporte ao governo. Também chama atenção o peso da reação, com a Polícia Federal deflagrando operação na casa de Bivar. O jogo é bruto e deverá continuar assim pelos próximos anos. Prova disto foi o pronto contra ataque de Luciano Bivar, que nesta sexta diluiu a ala bolsonarista na Executiva do partido, ampliando seu espaço e poder na instância maior da agremiação.




Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue...

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And...

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...