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Ainda sobre a cratera do Metrô

O diretor do instituto Engrácia Garcia de pesquisas Jorge Rodini está de volta ao blog, após o longo silêncio deste início de ano. Desta vez, Rodini não escreve sobre pesquisas nem interpreta números, mas comenta a tragédia da rua Capri. Leia a seguir a íntegra do comentário de Rodini.

Houve um tempo em que a tecnologia esteve a serviço do homem. Conhecimento e desenvolvimento sempre andaram juntos.
Houve um tempo em que a maioria dos seres humanos se importava com a vida dos seus semelhantes. Solidariedade e fraternidade deveriam sempre estar na mesma mão.
Houve um tempo em que os governantes cuidavam dos cidadãos. Poder e democracia teriam que ser o ideal de governo.
Houve um tempo em que a população andava sem sobressaltos , sem precisar se importar com buracos surgidos do nada ou do tudo. Lucro, mas com responsabilidade deveria fazer parte do Manual de qualquer empreiteira séria.
Houve um tempo em que todos choraríamos a perda de um Ser Humano, mesmo que desconhecido.
Houve um tempo... não há mais.

Comentários

  1. Revista Veja: Cão e circo
    Estávamos na banca de jornais, conversando e debatendo seriamente sobre o tempo ( se estava calor ou se choveria, e o assunto rendia: já durava hora, hora e meia ) quando uma senhora pediu ao jornaleiro a esclarecedora revista Veja. Ela ficou muito aliviada quando constatou que, das semanais à disposição, a publicação dos Civita era a única que nada falava sobre o polêmico acidente ( Opa !! Quase me esqueço: não acho que "acidente" seja o termo adequado para essa questão, mas é o que tem aparecido, por exemplo, nas manchetes do JT/ Grupo Estado ) .
    O Fontes ( para quem não sabe, esse é o nome de meu informante ) me disse o seguinte: a conversa que rolava pelos corredores da informativa revista girava em torno da importância ou não de se falar sobre a cratera tucana ( irônicamente disposta bem em frente à janela do presidente da editora, como que gritando: "Ei, não me ignorem. Também quero sair na Veja!!") já que - vejam só o cinismo - "(...) todos os jornais já falaram o que havia para se falar" (sic) .
    Ou seja: por não se tratar de um furo exclusivo, a Veja resolveu sonegar, a seu bel-prazer, uma informação da mais alta relevância e interesse social. Em vez disso, a revista dedicou algumas páginas ao melhor amigo do homem, acho até que aproveitando a fama repentina que Dara adquiriu ao auxiliar nas buscas. Isso eu não discuto: o mundo seria bem melhor se houvessem mais cães e menos seres humanos.
    Mas que irônico !! Quando aqui ( no blog "O Cata-Milho" )iniciamos a campanha "Eu tenho vergonha da classe média paulistana", a Veja colocou as gárgulas NA CAPA !!!
    Os cães são uma fraqueza minha, e a distinta tascou um exemplar canino em sua capa. Fiquei confuso, mas o dever vem em primeiro lugar: TIBÚRCIO ( meu cachorro )!!! Vai arrumando sua trouxa !!!
    Bem, retomo o tema "cratera".
    Por quê a Veja não falou sobre o buraco ?? A editora Abril localiza-se quase no interior do dito-cujo ( "a um tirinho de espingarda", diria Mazzaropi ) . Há quanto tempo surgiram as primeiras queixas dos moradores das imediações e, desde então, como comportou-se o núcleo jornalístico da maior publicação do País? Um possível furo acabou se revelando um buraco descomunal. Passando por alí quase diariamente, não teria ninguém na editora que percebesse - por si mesmo - que o asfalto estava cedendo, a rua afundando? Na padaria, ao tomar um café, não tomou conhecimento do zumzumzum, da rádio-peão ou da dona Maria comentando com a vizinha a deterioração de sua residência ? Um jornalista que se preze não ignoraria tais sinais, farejando ( trocadilho involuntário, desculpem ) potencial matéria bombástica. Mas não. Denúncias desse tipo são para chatos, como Greg Palast. Aqui a pegada é outra. Basta possuir um diploma.
    Em suma: os jornalistas da Abril não vivem neste mundo. Ou sofrem de certo mal, que os imuniza contra as preocupações comezinhas da ralé, mesmo aquela que vive diante de seus narizes empinados. De sua realidade encastelada de condomínio fechado, como poderiam estes escribas de press-releases corporativos se preocupar com mixórdias como a cidade, seus moradores, as casas destes e o transporte público? Viajamos de helicóptero ( Mesmo? ) e não sujamos o traseiro em bancos de ônibus. Não nos manifestamos quando residentes em bairros "nobres" pautam o governo estadual e este - para não incomodá-los - deixa de considerar a construção de uma estação de metrô nesses locais, pois isso traria transtornos para seus feudos particulares e inacessíveis, alheios à destruição causada pela inescrupulosa especulação imobiliária, também pouco questionada pelos nossos editoriais - talvez pelo fato de um representante do setor imobiliário ter pertencido ao secretariado municipal de José Serra, ou por Andrea Calabi ter relações estreitas com a Cyrella?
    Dilema na redação: como falar do desastre, sem citar a política? E, por política, entenda-se o candidato tucano à Presidência da República, Geraldo Alckmin, favorecido nas páginas da Abril até em revistas de culinária.
    E, não podemos esquecer ( para alguns paranóicos como eu, até suspeitar de algo ) , estava em jogo a candidatura de José Serra à sucessão de Geraldo. O ex-governador estava virtualmente derrotado. Caso esta tragédia acontecesse no período eleitoral, talvez não houvesse dinheiro do dossiê ou suposto mensalão que levasse a eleição presidencial para o segundo turno. E, num cenário mais desolador para o PSDB, José Serra poderia ter sido vencido na disputa pelo governo do Estado.
    O que me leva a perguntar, em mais um delírio paranóico: Seria possível que já se soubesse, nas altas esferas tucanas, que o acidente aconteceria inexoravelmente e, para que a legenda não fosse prejudicada, deveria ser feito de tudo para postergar os acontecimentos ?
    Por quê, a cada vez que presto atenção no assunto, eu me lembro das plataformas da Petrobrás afundadas no mar e de Aloysio Biondi ? Houve quem, à época, usasse como justificativa para seu afundamento , o fato de que as plataformas se localizavam num tipo específico de terreno/superfície. Mas - como lembrou Aloysio - era justamente para esse tipo de terreno que a Petrobrás desenvolveu seu know-how, ganhando menções e prêmios, sendo então reconhecida mundialmente por seu sucesso.
    Voltando à Veja. Quem reside fora do Estado de São Paulo, e tem a revista como sua principal fonte de informação ( os identificados nessa descrição provam a minha tese e permitem a criação de um novo slogan para a mal-afamada: "Veja. Prá quem é, tá bom." ) foi limado em seu direito de saber mais sobre estes eventos. O Manual Abril de Jornalismo, Informação e Ética não permite que assuntos esgotados por outros meios ou veículos apareça também em suas páginas, reservadas exclusivamente para matérias bombásticas, capazes de derrubar governos e instituições.
    Quem não se lembra dos dólares de Cuba, do dinheiro das FARCs para o PT, da grana transportada por avião, acondicionada em caixas de uísque cubano?
    Nessa linha de raciocínio, por que a revista não teve o mesmo escrúpulo ao tratar do "suposto mensalão", já que até mesmo humildes jornais de bairro dedicaram algumas linhas à trama ?

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