Para os amigos, incluindo sua turma do futebol, ele era o Nego Beto ou João Beto. Morava na Vila do IAPI, um conjunto habitacional de relevância histórica, mas decadente e lembrado até então como residência na infância da cantora Elis Regina, em um apartamento da rua Rio Pardo. Só que desde a sexta-feira, 20 de novembro de 2020, Dia da Consciência Negra, a Vila do IAPI, no bairro Passo d’Areia, em Porto Alegre, também será sempre lembrada como o lugar onde morava João Alberto Silveira Freitas, 40 anos, o João Beto, escreem Fabio Brisolla e Alfredo Mergulhão na Época desta semana, vale ler.
Ele morreu nessa data, a 300 metros de distância de casa, no estacionamento do supermercado Carrefour Passo d’Areia, vítima de uma sequência de agressões dos seguranças do estabelecimento.
Foi ao local fazer compras com sua mulher. Hábito, aliás, que era corriqueiro na rotina de João Alberto.
“Nunca nos sentimos ameaçados no supermercado. Nunca ofendemos ninguém. Íamos lá, brincávamos com o pessoal, comprávamos uma carne para assar. Nunca ninguém nos ameaçou. Várias moças do caixa conheciam ele. Acredito que até esses covardes o conheciam”, disse João Batista Rodrigues, de 65 anos, o pai de João Alberto, em entrevista concedida à Rádio Gaúcha na manhã de sexta, enquanto aguardava a liberação do corpo de seu filho em frente ao Departamento Médico Legal (DML) de Porto Alegre.
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As respostas de João Batista naquele momento crítico retratavam a perplexidade e os questionamentos que assombram um pai que perde um filho numa tragédia. “Ele era meu filho. Sempre o respeitei. Sempre procurei ensinar o certo pra ele, na sua vida.” E prossegue: “Como é que (os seguranças) se juntam para matar meu filho? Ninguém tem razão para tirar a vida de ninguém”.
Ele tinha quatro filhos - um deles do primeiro casamento e outros três do segundo. Morava na Vila do IAPI com sua atual mulher, Milena Borges Alves, e um gato de estimação. Ela presenciou os instantes finais da agressão ao marido no estacionamento do Carrefour.
Assim como muitos de seus vizinhos, era torcedor do São José, time que disputa a Série C do Campeonato Brasileiro, que movimenta o bairro com as partidas no Estádio Passo d’Areia.
Era membro da torcida organizada “Os Farrapos 1913” há três anos. "Ele sempre estava com a gente no bairro, sendo dia de jogo ou não. E era aquele amigo que tu podia contar pra qualquer hora”, disse o líder da torcida, Carlos Eduardo Borges Carneiro, a ÉPOCA.
De acordo com o jornal O Globo, há alguns anos, João Alberto sofreu um acidente de trabalho quando era auxiliar de serviços gerais no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre. Na ocasião, feriu o braço, perdendo parcialmente os movimentos. Foi aposentado por invalidez e, desde então, fazia trabalhos pontuais na área onde morava, muitas vezes auxiliando o pai, que é soldador.
A partir de agora, o pai seguirá sem o apoio do filho. E, conforme relato à Rádio Gaúcha, ele lamenta que “não há mais nada a ser feito a não ser aguardar pela Justiça”.
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