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A vez de Barack Obama

O mundo inteiro está de olho na posse, amanhã, do primeiro presidente da República negro nos Estados Unidos, o democrata Barack Hussein Obama. A expectativa é tanto maior em função da monstruosa crise econômica que Obama herdará e terá que resolver. Por aqui, alguns analistas, como a sempre pândega Míriam Leitão, já estão torcendo para que o povo americano cobre do novo presidente uma solução rápida para os problemas e, caso ele não consiga dar conta do serviço, comece a rejeitá-lo. Leitão, em particular, acha mesmo que isto vai acontecer: "ao fim dos primeiros seis meses, a piora parecerá obra de Obama. É da natureza das sociedades democráticas, e abertas a cobrança sobre os governantes, a impaciência na espera dos resultados", escreveu a jornalista em seu blog.

O vaticínio de Míriam Leitão na verdade é um desejo que vale para Obama e para Lula. Desejo este, por sinal, de praticamente toda a grande imprensa nacional: de que ambos, Obama e Lula, se esborrachem na crise e acabem na lona, com a população pedido suas cabeças.

O problema todo é que a "análise" dessa gente é puro "wishfull thinking", como se diz na língua pátria do professor Mangabeira Unger. O povão é menos estúpido do que supõem os conservadores: este blog aposta que, lá como cá, todo mundo vai entender que a "culpa" da crise pode ser de muita gente, mas de Lula e Obama, definitivamente não é. E isto faz toda a diferença, o resultado aparece quando os pesquisadores vão para a rua perguntar ao povaréu que avaliação faz de seus chefes de Estado.

É evidente que Obama vai ter que mostrar serviço – e, pelo menos aparentemente, ele já tem um plano de vôo para enfrentar a situação –, mas a verdade é que politicamente ele já está agindo para serenar os ânimos ao dizer que a crise vai ser longa e não há milagre a ser feito no curto prazo. Para usar outra expressão da língua do professor Mangabeira, Obama está fazendo hedge, deixando claro que a herança maldita que herdará de George W. Bush é muito mais grave do que o povão está imaginando que seja. Desta maneira, se os problemas realmente só forem sanáveis a longo prazo, Obama terá dito que não foi por falta de aviso. Se, no entanto, lá por 2010 os EUA voltarem a crescer forte, o presidente poderá se apresentar como o grande estadista que debelou a maior crise da história do capitalismo. Reeleição garantida, por certo.

Segundo as pesquisas divulgadas nesta segunda-feira, Obama assume a presidência com uma popularidade à la Lula, de 79%. Apesar de todos os preconceitos existentes nos Estados Unidos, o primeiro negro a governar o país tem a confiança do seu povo. Terá pela frente um desafio monumental. Do lado de cá do Rio Grande, só nos resta confiar no taco de Obama, porque muito dos nossos problemas só serão resolvidos se os dos Estados Unidos também forem. Dedos cruzados, ora pois...

Comentários

  1. De um lado, Lula prefere ser cauteloso, passa segurança se apoiando na economia sólida que seu governo construiu. Efim, que tudo vai dar certo; de outro lado, Obama joga na lata que a crise é grave, nada se resolverá a curto prazo, mas políticas longas e inteligentes podem fazer "justiça econômica". Enfim, "Yes, we can't!".
    Qual será a melhor estratégia? Será que Lula peca por tentar camuflar a verdade, ou acerta em não alarmar ninguém "à toa"? Será que a política Obama vai dar certo? Se não der, como fica sua imagem super man? Desmoralizada perante o mundo?
    Estilos diferentes à parte, "dedos cruzados, ora pois..."

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