Pular para o conteúdo principal

Folha torce para crise se agravar

Outro excelente artigo do Observatório da Imprensa, que corrobora o que este blog escreveu ontem. Na íntegra para os leitores do Entrelinhas.


LEITURAS DA FOLHA
Uma notícia, duas versões

Por Luciano Martins Costa em 13/1/2009
Comentário para o programa radiofônico do OI, 13/1/2009

A notícia é o relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) sobre a situação das maiores economias do mundo frente à crise global.

O Estado de S.Paulo e o Globo seguem a tendência das agências internacionais e anunciam que o Brasil será o menos afetado e terá o melhor desempenho em 35 países estudados, entre os quais os 11 mais desenvolvidos. Mas a Folha de S.Paulo vai na contramão e prefere destacar que o Brasil está cada vez mais próximo de um ciclo de desaceleração, embora permaneça como a única entre as principais economias mundiais que ainda apresenta um cenário positivo.

O leitor mais atento deve se perguntar: o que define a escolha de um editor, diante de um relatório técnico sobre o qual as interpretações também deveriam seguir o mesmo critério técnico?

Embora o conteúdo das reportagens dos três jornais seja rigorosamente o mesmo, o leitor da Folha tende a ficar mais pessimista com o título: "Brasil está próximo de desaceleração, diz OCDE".

Compare-se, por exemplo, com o que induz o título do Globo: "OCDE – Brasil sofrerá menos com crise". Ou com o título do Estadão: "Para OCDE, Brasil é o menos atingido pela crise".

Lidos os textos publicados pelos três principais jornais brasileiros, e comparados com as versões disponíveis na internet, observa-se que não há elementos para a escolha de um título pessimista. O que predomina no estado de espírito que se irá formar no leitor é a mera escolha do editor. Nem no conjunto de indicadores, nem nos indicadores específicos sobre desemprego, as informações originais induzem a uma interpretação diferente da que deram à notícia o Globo e o Estadão.

Mas o editor da Folha resolveu puxar para baixo, e isso basta.

Torcida contra

Observando-se o conteúdo geral do noticiário e alguns artigos publicados nos últimos dias, constata-se que o Brasil se destaca no cenário global por sua menor exposição aos riscos que atingem a economia real.

O crescimento do mercado interno, produzido por uma década de medidas estabilizadoras e cinco anos de políticas efetivas de inclusão social, e a diversificação das relações de negócios, com maior presença no mercado latino americano e menor dependência dos Estados Unidos, são apontados por instituições e analistas como os motivos do melhor posicionamento do Brasil.

No entanto, os jornais brasileiros têm preferido dar destaque às notícias isoladas sobre dificuldades de alguns setores.

No fim das contas, é o senso crítico do leitor que vai predominar. Mas não há otimismo que dure com tanta torcida contra.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue

OCDE e o erro do governo na gestão das expectativas

O assunto do dia nas redes é a tal negativa dos Estados Unidos para a entrada do Brasil na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto os oposicionistas aproveitam para tripudiar, os governistas tentam colocar panos quentes na questão, alegando que não houve propriamente um veto à presença do Brasil no clube dos grandes, a Série A das nações. Quem trabalha com comunicação corporativa frequentemente escuta a frase "é preciso gerenciar a expectativa dos clientes". O problema todo é que o governo do presidente Bolsonaro vendeu como grande vitória a entrada com apoio de Trump - que não era líquida e certa - do país na OCDE. Ou seja, gerenciou mal a expectativa do cliente, no caso, a opinião pública brasileira. Não deixa de ser irônico que a Argentina esteja entrando na frente, logo o país vizinho cujo próximo governo provavelmente não será dos mais alinhados a Trump. A questão toda é que o Brasil não "perdeu", como o pobre Fla-Flu que impe