O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...
O sistema policial e penal brasileiro reflete, com perfeição, a desigualdade social do país. É concebido, e principalmente operado, para proteger as castas superiores, e intimidar os pobres. Temos regras prescricionais que garantem a impunidade de quem tem dinheiro suficiente para garantir manobras judiciais protelatórias, sempre esgrimadas por advogados bem pagos. Quando isso não é suficiente, entra em campo a inexplicável lentidão no julgamento dos processos, que às vezes ficam anos engavetados em algum gabinete, esperando fluir o prazo prescricional que irá livrar o réu. Existem três tipos de delitos que potencialmente atingem as castas superiores: os de colarinho branco, os contra a honra, e os de trânsito. Morrem, por ano, no Brasil, 35.000 pessoas em acidentes de trânsito. Os culpados por essas mortes pertencem, quase sempre, à classe média, a mesma classe que opera o sistema penal. Qualquer um que dirija um automóvel está exposto à prática de um eventual homicídio culposo, e às vezes doloso. Mas o sistema de auto-proteção funciona bem: ninguém vaii para a cadeia. Diariamente os programas de notícias sensacionalistas que infestam a televisão mostram a prisão de pobres, desde logo classificados como "bandidos", com presunção de culpa já devidamente estabelecida sem que sequer tenha sido iniciado o processo judicial. São algemados, maltratados e expostos à execração pública e linchamento moral. E nunca ouvi, em lugar algum, uma voz sequer condenando tais atos.
ResponderExcluirNa raiz de tudo isso está a característica mais indigna das elites brasileiras: o profundo preconceito de classe.