Comédia romântica “subversiva”: um casal em quatro décadas
Quando Sarah (Doria Tillier) avistou Victor Richemont (Nicolas Bedos) pela primeira vez, ela soube que sua vida giraria para sempre em torno dele, estava atraída “como uma mariposa a uma lâmpada”. Aspirante a escritor, ele afogava as mágoas num bar após seu livro ter sido recusado para publicação. Determinada, ela não descansa até engatar um papo que terminaria na casa dele. Embriagado, ele cai no sono e acorda com a jovem terminando a leitura e anotações em seu romance manuscrito – agora, sim, em condições de ser publicado, diz ela, pronta para debaterem as correções – exagero na citação de autores, erros em estruturas de parágrafos e outros. Ele perplexo. Ela em casa, aluna de doutorado em Letras Modernas.
Este poderia ser o início do romance, mas não ainda no caso de Monsieur e Madame Adelman (França, 2017). A história de amor de Sarah com Victor custou a ela um esforço maior. E este empenho feminino, primeiro em conquistar o homem que desejava e, mais adiante, em manter o relacionamento dos dois ao longo de décadas, é um entre outros aspectos do filme que, como se diz, geram análises divergentes. Vale conferir.
Ainda no início, após dias aguardando algum contato de Victor, Sarah inicia uma perseguição com telefonemas que ele nunca atende. Parte, então, para outras estratégias de aproximação. Começa a namorar com o melhor amigo dele e, em seguida, com o irmão. Com este expediente é levada a participar de um jantar da família de Victor e, ciente da profunda discórdia existente entre ele, de posição socialista, e o pai, um industrial milionário burguês, Sarah trava um diálogo sarcástico com o dono da casa fazendo críticas ferozes à sociedade burguesa. Victor enxerga ali a mulher mais interessante que já vira e Sarah, enfim, obtém a atenção que buscava. É o início de um romance inusitado e profícuo.
Com ótima avaliação de crítica e público no Brasil, a comédia-romântica francesa conta os 45 anos de relacionamento dos dois personagens com interessante realismo em suas várias fases, paixões, ciúmes, traições, sexo em alta, em baixa, êxitos, dificuldades. Paralelo ao casamento, ou em sua base, há a construção da carreira de fama e sucesso de Victor como escritor, cujos romances o levam a conquistar os mais importantes prêmios da literatura francesa.
As alterações do ambiente balançam os personagens individualmente, assim como a relação entre ambos no decorrer do tempo. Há o brilho de estar no auge e momentos deprimentes de fracassos. A felicidade ao gerar o primeiro filho e a incapacidade de recebê-lo com amor, ajustando expectativas aos limites que a vida impõe. Em uma vida de luxo, Sarah abandona os estudos e, ociosa, se deprime; Victor passa o tempo em viagens e coquetéis literários e avisa não ter mais vontade de estar em casa e não reconhecer mais a mulher divertida com quem se casou. Diz também a ela quando fizeram sexo pela última vez: há 7 meses e 10 dias. Mais uma vez Sarah vai usar todas as armas, lícitas e ilícitas, para salvar o relacionamento.
Toda a narrativa tem início no momento do enterro do famoso escritor, já em idade avançada e não tão lúcido, quando um jornalista se aproxima de Sarah para pedir que o ajude a escrever uma nova biografia sobre Victor – entre outras já publicadas, agora com visão intimista, sob a perspectiva dela, a viúva, grande companheira de vida do romancista. Ela não está disposta, não se interessa, mas sucumbe ao convite, aparentemente ao perceber a possibilidade de trazer à tona partes até então ocultas da história do marido. Começa então a recordar o início de tudo numa longa entrevista ao repórter.
Ao final de seu relato, momento em que o filme também vai terminando, segredos de maior e menor calibres terão sido revelados – e os de maior peso imediatamente deletados por ordem de Sarah sob o olhar de espanto do jornalista. “Nem pense em usar isso. Eu nego, te desminto publicamente”. Para o público que assiste, estes são instantes em que todas as peças enfim vão parecer se encaixar. #ficaadica
Por Denise Brito em 20/02/2020.
Quando Sarah (Doria Tillier) avistou Victor Richemont (Nicolas Bedos) pela primeira vez, ela soube que sua vida giraria para sempre em torno dele, estava atraída “como uma mariposa a uma lâmpada”. Aspirante a escritor, ele afogava as mágoas num bar após seu livro ter sido recusado para publicação. Determinada, ela não descansa até engatar um papo que terminaria na casa dele. Embriagado, ele cai no sono e acorda com a jovem terminando a leitura e anotações em seu romance manuscrito – agora, sim, em condições de ser publicado, diz ela, pronta para debaterem as correções – exagero na citação de autores, erros em estruturas de parágrafos e outros. Ele perplexo. Ela em casa, aluna de doutorado em Letras Modernas.
Este poderia ser o início do romance, mas não ainda no caso de Monsieur e Madame Adelman (França, 2017). A história de amor de Sarah com Victor custou a ela um esforço maior. E este empenho feminino, primeiro em conquistar o homem que desejava e, mais adiante, em manter o relacionamento dos dois ao longo de décadas, é um entre outros aspectos do filme que, como se diz, geram análises divergentes. Vale conferir.
Ainda no início, após dias aguardando algum contato de Victor, Sarah inicia uma perseguição com telefonemas que ele nunca atende. Parte, então, para outras estratégias de aproximação. Começa a namorar com o melhor amigo dele e, em seguida, com o irmão. Com este expediente é levada a participar de um jantar da família de Victor e, ciente da profunda discórdia existente entre ele, de posição socialista, e o pai, um industrial milionário burguês, Sarah trava um diálogo sarcástico com o dono da casa fazendo críticas ferozes à sociedade burguesa. Victor enxerga ali a mulher mais interessante que já vira e Sarah, enfim, obtém a atenção que buscava. É o início de um romance inusitado e profícuo.
Com ótima avaliação de crítica e público no Brasil, a comédia-romântica francesa conta os 45 anos de relacionamento dos dois personagens com interessante realismo em suas várias fases, paixões, ciúmes, traições, sexo em alta, em baixa, êxitos, dificuldades. Paralelo ao casamento, ou em sua base, há a construção da carreira de fama e sucesso de Victor como escritor, cujos romances o levam a conquistar os mais importantes prêmios da literatura francesa.
As alterações do ambiente balançam os personagens individualmente, assim como a relação entre ambos no decorrer do tempo. Há o brilho de estar no auge e momentos deprimentes de fracassos. A felicidade ao gerar o primeiro filho e a incapacidade de recebê-lo com amor, ajustando expectativas aos limites que a vida impõe. Em uma vida de luxo, Sarah abandona os estudos e, ociosa, se deprime; Victor passa o tempo em viagens e coquetéis literários e avisa não ter mais vontade de estar em casa e não reconhecer mais a mulher divertida com quem se casou. Diz também a ela quando fizeram sexo pela última vez: há 7 meses e 10 dias. Mais uma vez Sarah vai usar todas as armas, lícitas e ilícitas, para salvar o relacionamento.
Toda a narrativa tem início no momento do enterro do famoso escritor, já em idade avançada e não tão lúcido, quando um jornalista se aproxima de Sarah para pedir que o ajude a escrever uma nova biografia sobre Victor – entre outras já publicadas, agora com visão intimista, sob a perspectiva dela, a viúva, grande companheira de vida do romancista. Ela não está disposta, não se interessa, mas sucumbe ao convite, aparentemente ao perceber a possibilidade de trazer à tona partes até então ocultas da história do marido. Começa então a recordar o início de tudo numa longa entrevista ao repórter.
Ao final de seu relato, momento em que o filme também vai terminando, segredos de maior e menor calibres terão sido revelados – e os de maior peso imediatamente deletados por ordem de Sarah sob o olhar de espanto do jornalista. “Nem pense em usar isso. Eu nego, te desminto publicamente”. Para o público que assiste, estes são instantes em que todas as peças enfim vão parecer se encaixar. #ficaadica
Por Denise Brito em 20/02/2020.
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