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O suicídio político do PSDB

Muitos analistas gostam de dizer que o presidente Lula é um homem de sorte, de muita sorte: concorreu à presidência da República por três vezes antes de chegar ao Palácio do Planalto. Poderia ter sido presidente em 1989, 1994 e 1998, período de estagnação econômica no Brasil, mas venceu em 2002, quando o planeta iniciava um ciclo de crescimento que parece estar dando os primeiros sinais de esgotamento agora, e provavelmente só terá efeitos mais drásticos por aqui no último ano do mandato de Lula, se é que o Brasil será mesmo afetado pela crise internacional, tamanha a quantidade de boas notícias (descoberta de poços de petróleo, crescimento da demanda interna etc etc) que podem ajudar o país a passar incólume nesta crise e voltar a surfar nas ondas do próximo ciclo de crescimento mundial.

De fato, Lula tem sorte, mas é possível ver a questão de um outro ponto de vista: além de muita sorte, o presidente conta, no front político interno, com a inestimável ajuda de uma oposição que não tem a mais remota idéia do que fazer para voltar ao poder. Além de não ter um discurso ou programa alternativo ao que o PT vem executando no governo federal, tucanos e democratas estão se perdendo nas guerras internas de seus partidos, que por sua vez estão conseguindo abalar a parceria entre os dois maiores partidos de oposição do país.

O caso da cidade de São Paulo é emblemático da opção das oposições pelo suicídio político. Neste domingo, o PSDB deve realizar a mais conturbada Convenção municipal de sua história, com o confronto entre os partidários da candidatura de Geraldo Alckmin à prefeitura e a ala que prega o apoio da legenda à reeleição do atual prefeito, Gilberto Kassab (DEM). A julgar pela troca de farpas entre as lideranças tucanas, o clima vai ferver.

Independentemente do resultado final da Convenção, Alckmin mais uma vez mostrou que tem força suficiente e coragem para peitar a liderança do governador José Serra, principal defensor da aliança com Kassab. Disputas internas são sempre desagradáveis, mas o que ocorre no PSDB é um pouco mais grave e certamente terá consequências em 2010 ou até antes disto, pois já há quem fale no surgimento de uma nova agremiação após a eleição deste ano.

No fundo, há dois cenários a serem considerados. Antes, porém, é preciso saber se Alckmin realmente consegue se viabilizar neste domingo. Derrotado, o ex-governador não terá muita alternativa senão deixar o PSDB, uma vez que a vitória da ala "kassabista" seria uma verdadeira humilhação para um político que já governou São Paulo e foi o candidato do partido à Presidência da República em 2006. É mais provável, no entanto, que Alckmin consiga legenda para disputar a prefeitura. Neste caso é que se abrem os tais dois cenários. Se Geraldo Alckmin vencer as eleições de outubro, José Serra ganhou um problemão e poderá começar a pensar se não vale mais a pena garantir outro mandato nos Bandeirantes do que arriscar uma disputa com o seu colega Aécio Neves pela indicação do partido para disputar a presidência da República. Alckmin certamente será uma pedra no sapato de Serra no PSDB. Como diz o ditado, vingança é um prato que se serve frio e todo o processo interno da escolha do candidato neste ano estará bem vivo na cabeça do prefeito Alckmin, que não vai deixar de graça os percalços pelos quais passou.

Por outro lado, há a possibilidade de Alckmin perder a eleição. Neste caso, claro, Serra sai fortalecido, ainda que seu candidato preferido, o prefeito Gilberto Kassab, perca a eleição. Será o momento então de uma eventual "reconciliação" tucana com o DEM e mesmo internamente, com os grupos derrotados, embora esta talvez não seja a atitude mais provável do governador Serra.

Com tamanha confusão na oposição - e o DEM vive em algumas localidades desavenças ainda mais graves com os parceiros tucanos, como ocorre no Rio Grande do Sul -, Lula só tem a agradecer. Não que o PT não tenha problemas, é claro. Aliás, já tem petista por aí dizendo que o ex-governador Geraldo Alckmin é a melhor coisa que já aconteceu para... o PT! E durma-se com um barulho desses...

Comentários

  1. Acho bem fraquinha essa tese de q a popularidade de Lula se deve a sua sorte. Os resultados econômicos e sociais do seu governo são fruto da criação, manutenção, aprofundamento ou aperfeiçoamento de politícas públicas implementadas na gestão passada e durante a atual. E q revelam consonância com o contexto internacional, com a geopolítica, com a globalização, a financeirização sem precedentes do capitalismo etc.
    Mesmo pq ter uma oposição tão escrota, suja, repugnante e cínica como a realizada por Artur Virgilio, ACM Neto, Alvaro Dias e Pedro "Crusius" Simon e pela mídia não é propriamente uma questão de sorte.

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  2. Na última hora, as duas partes fizeram um "acordo", retirando-se a chapa da infidelidade, digo, a que propunha apoiar o candidato do DEM. Foi o único jeito de evitar sangue na Convenção, já que o racha foi longe demais. Nem Serra apoiará Geraldo em 2008 (apesar dos discursos de praxe, para manter as aparências), muito menos Alckmin, caso eleito, apoiará Serra em 2010 - é mais fácil ele própria pleitear a candidatura a presidente, caso Aécio não se viabilize.
    Ruim para o PSDB, ótimo para São Paulo e para o Brasil.

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