Pular para o conteúdo principal

Sobre o diploma de jornalismo

Uma análise curta e grossa sobre a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o exercício da profissão está no Observatório da Imprensa, em texto de Carlos Brickman, reproduzido abaixo. Este blog concorda com Brickman: exigir diploma para jornalistas é uma bobagem corporativista, nada mais. Tem gente que defende pelo menos a exigência de um diploma universitário de qualquer área apenas para que a profissão seja caracterizada como "de nível superior" e os salários não caiam para o patamar "de nível técnico". Besteira: publicitários ganham (bem) mais do que jornalistas e não existe exigência de canudo algum para o exercício da profissão.

A verdade é simples: para ser jornalista, basta saber escrever e ter curiosidade com o mundo que nos cerca. O resto é firula e se aprende no dia a dia das redações. Tudo isto NÃO significa que o curso de jornalismo seja uma perda de tempo. Pode, sim, ajudar bastante. Melhor ainda é se preparar cursando História, Economia, Ciências Sociais ou qualquer outra carreira que permita a especialização em algum tema. Estudar é sempre bom, mas a questão central da exigência do diploma é outra: jornalismo, como inúmeras outras profissões (publicitário, escritor, artista, radialista, locutor etc), não é o tipo de trabalho em que o conhecimento específico das técnicas da profissão seja uma cláusula de barreira. Não dá para ser médico sem ter feito faculdade de medicina, mas é perfeitamente possível ser jornalista sem ter feito faculdade de jornalismo e estão aí os cobras da profissão que não me deixam mentir. Divirtam-se com o texto de Carlinhos Brickman, abaixo, que resume a questão com muito mais talento.


O diploma e as orelhas

Aparício Torelly, ou Aporelli, ou o Barão de Itararé, foi um dos grandes humoristas brasileiros. Membro do Partido Comunista (na ilegalidade), e sabendo que a truculenta polícia política poderia invadir sua redação, colocou na porta um cartaz histórico: "Entre sem bater". É dele também a frase definitiva: "Diploma não encurta a orelha de ninguém".

O debate sobre o diploma de jornalista parece partir do princípio de que, obtido o diploma, as orelhas se reduzem e o cavalheiro pára de zurrar. Gente como Ricardo Kotscho, como este colunista, como Boris Casoy, como Eduardo Suplicy, como Joelmir Beting, sem diploma de jornalista, está condenada à mais profunda ignorância. Se souber duas línguas, uma será o zurro; outra, o relincho.

O Brasil teve normas regulatórias antes de ser um país; teve censura antes de ter imprensa. Talvez por isso, imagina-se que uma profissão, não sendo amparada por um diploma, será forçosamente mal exercida. Só que não será, não: pode-se perfeitamente trabalhar em jornal sem um papel assinado – e assinado por gente que, muitas vezes, jamais deu a honra de sua presença numa Redação.

Diploma de jornalista não é ruim: é bom. Pode ser ótimo. É desejável. Mas não é essencial. E nem vamos entrar naquela conversa mole de que os patrões querem abrir o mercado para pagar menos. Patrão, por definição, sempre procura pagar menos. E os exemplos citados, de jornalistas sem diploma, sempre estiveram entre os maiores salários das redações em que se engajaram.

Talvez o motivo da luta pelo diploma seja outro, mais feio: a reserva de mercado. Porque, não haja dúvida, as empresas sempre vão procurar os profissionais que julgarem mais competentes; e, se não houver lei, rigidamente fiscalizada, com penas severíssimas, escolherão os melhores, com diploma ou sem ele.

Comentários

  1. Tõ contigo e não abro, meu caro Luisão. Jornalista tem que ter conhecimento histórico, visão generalista e crítica, saber escrever e uma certa especialização na área a que se dedica. Faculdade de jornalismo não necessariamente assegura isso, às vezes pelo contrário. Mais útil é uma formação em História, Ciências Sociais, Economia, Direito ou Administração e diria, talvez, condição fundamental para baixar a taxa de besteirol e manipulação diárias!!!

    ResponderExcluir
  2. Discordo. Acho que vc realmente está defendendo o seu. A formação é importante, pq a informação precisa ser de qualidade, rápida e eficiente. O profissional para entrar em uma redação tem que está encaminhado e não começar a aprender. Quem irá ensina-lo dentro da redação? Se não serão aqueles que se formaram antes? Talvez a forma como se ensina é que precisa ser revista. Essa atitude nao foi democrática, mas sim feriu o meu direito já adquirido. Ter o diploma não impede a mais ninguém exercer o direito a liberdade de expressão. Qualquer um pode fazer. Não é necessário acabar com o sonho e dedicação daqueles que se esforçaram, para entrar em uma faculdade e pagaram um preço por isso. Roubar esse direito isso sim é uma atitude ditadora.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

O Entrelinhas não censura comentaristas, mas não publica ofensas pessoais e comentários com uso de expressões chulas. Os comentários serão moderados, mas são sempre muito bem vindos.

Postagens mais visitadas deste blog

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue...

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And...

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...