Pular para o conteúdo principal

300 mil mortos e a guerra das vacinas

Abertura da Newsletter da LAM Comunicação.

A segunda onda da pandemia pegou o Brasil de jeito. Em 75 dias houve um salto de 200 mil para 300 mil mortes em decorrência da doença, que agora afeta pessoas mais jovens, em “idade útil”, como gostam de dizer os economistas, ou seja, gente que faz parte da População Economicamente Ativa (PEA). Tudo isto acontecendo em paralelo à campanha de vacinação, mais lenta do que se esperava.

Em termos políticos, o agravamento da situação já derrubou o ministro da Saúde e levou o governo federal a ceder e aceitar que é necessário articular ações em conjunto com os governadores e secretários de Saúde dos estados. Mais ainda, o próprio presidente mudou sua postura, aparece usando máscara e parou de tratar como “gripezinha” a doença provocada pelo vírus, que por sinal já matou mais do que a AIDS em décadas, sem que tenha sido criada uma vacina contra ela.

As vacinas, por sinal, provocaram uma verdadeira guerra entre o presidente Jair Bolsonaro e o governo João Doria (PSDB), que tem puxado para São Paulo um protagonismo nesta questão. Na semana passada um eufórico Doria anunciou que o Butantan irá fabricar uma nova forma de imunizante, o ButanVac, no que foi imediantemte seguido pelo governo federal, com anúncio na mesma linha. 

Por trás do confronto está, obviamente, a questão política. Bolsonaro tem o tempo a seu favor, mas sabe que precisa mostrar ao público algum controle na gestão da crise sanitária e a bola da vez é a vacina, sem ela não será possível controlar a pandemia, cloroquina na veia não adiantou, ao contrário, o chamado tratamento precoce está provando uma onda de gente consultando médicos com sintomas hepáticos decorrentes do uso equivocado dos medicamentos.

Doria já anunciou que não deve sair candidato a presidente, mas seria ingenuidade pressupor que é carta fora do baralho, primeiro porque não está claro se Lula poderá de fato concorrer e, ainda que possa, há uma nítida movimentação das forças de centro em busca de um nome alternativo à polarização entre a esquerda e a direita, até mesmo Ciro Gomes foi ventilado como nome a ser apoiado pelo PSDB (o que não seria tão estranho assim, visto que se elegeu governador pelo partido). Candidato ou não, João Doria está usando a crise sanitária para se posicionar e seu cacife, caso tente a reeleição, será decisivo na escolha do nome de centro a concorrer ao Planalto em 2022. O anúncio da ButanVac, que não é propriamente 100% brasileira como ele deu a entender, é apenas mais um ato deste jogo. 

A pandemia certamente vai passar, o pico que estamos vivendo será passado quando as eleições acontecerem, mas o que está ocorrendo hoje no âmbito da condução da crise será usado em 2022 como argumento junto aos eleitores, para o bem e para o mal. (Luiz Antonio Magalhães em 28/3/21)



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And...

Dica da semana: Nine Perfect Strangers, série

Joia no Prime traz drama perturbador que consagra Nicole Kidman  Dizer que o tempo não passou para Nicole Kidman seria tão leviano quanto irresponsável. E isso é bom. No charme (ainda fatal) de seus 54 anos, a australiana mostra que tem muita lenha para queimar e escancara o quanto as décadas de experiência lhe fizeram bem, principalmente para composição de personagens mais complexas e maduras. Nada de gatinhas vulneráveis. Ancorando a nova série Nine Perfect Strangers, disponível na Amazon Prime Video, a eterna suicide blonde de Hollywood – ok, vamos dividir o posto com Sharon Stone – empresta toda sua aura de diva para dar vida à mística Masha, uma espécie de guru dos novos tempos que desenvolveu uma técnica terapêutica polêmica, pouco acessível e para lá de exclusiva. Em um lúdico e misterioso retiro, a “Tranquillum House”, a exotérica propõe uma nova abordagem de tratamento para condições mentais e psicossociais manifestadas de diferentes formas em cada um dos nove estranhos, “...

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...