Pular para o conteúdo principal

Por que a plataforma de games Roblox conquistou a criançada

A indústria de games não apenas superou sem sustos a crise do novo coronavírus como foi amplamente beneficiada pela permanência obrigatória — e, por vezes, tediosa — dentro de casa. Sem poder brincar do lado de fora, crianças de todas as idades buscaram refúgio nas telas eletrônicas, que se tornaram ainda mais onipresentes durante a pandemia. Um dos “playgrounds” virtuais do momento chama-se Roblox, plataforma on-line com impressionantes 20 milhões de universos em formato 3D. O segredo é o jeito de brincar: os mundos podem ser explorados por avatares criados pelos próprios jogadores e que lembram os inconfundíveis bonecos da Lego. A empresa Roblox Corporation calcula que três de cada quatro crianças de 9 a 12 anos utilizem a plataforma atualmente nos Estados Unidos. Só no terceiro trimestre de 2020 suas receitas saltaram 91% em relação ao mesmo período do ano anterior. A Roblox não revela estatísticas detalhadas sobre o Brasil, mas confirma que o país contribui com uma boa fatia dos mais de 36 milhões de usuários ativos por dia, escreve Luiz Felipe Castro na Veja desta semana. Continua a seguir. 


A simplicidade dos gráficos e o vasto cardápio são, de longe, os fatores mais atraentes do game. “Ao jogar, você facilmente entende por que o Roblox faz tanto sucesso”, diz o analista administrativo Leandro Amaral, de 37 anos, que criou, com o filho Gustavo, de 10 anos, um canal no YouTube para dar dicas sobre como aproveitar a plataforma. “O Roblox oferece milhões de opções a todos os gostos, de games de corrida a jogos de guerra, de moda a esportes. Por isso, as crianças se identificam.”

Disponível para Xbox, PC, MacOS, Android e iOS, a plataforma opera sob o modelo “freemium” — junção das palavras “free” (de graça) e premium. Ou seja: a versão mais básica é gratuita, mas é possível turbinar os avatares com produtos virtuais. Por meio de depósitos de dinheiro real (geralmente 5 a 20 dólares mensais), os pais podem adquirir para os filhos a moeda usada no jogo, chamada Robux, e comprar, por exemplo, armas ou roupas para seus personagens, além de desbloquear jogos exclusivos. Outra possibilidade de monetização, bastante explorada na pandemia, é alugar servidores para hospedar festas de aniversário virtuais. “Tivemos um rápido crescimento, já que nossos usuários estão cada vez mais on-line devido à Covid-19 ”, disse em entrevista recente o cofundador e CEO da empresa, David Baszucki.

O fato de os gráficos do Roblox serem simples, quase anacrônicos se forem comparados com os videogames mais modernos, propicia outro relevante diferencial: a possibilidade de não apenas vivenciar, mas criar uma aventura própria. São oferecidos tutoriais de programação para que até mesmo crianças possam montar os próprios mundos. A empresa informa ter mais de 2 milhões de desenvolvedores independentes (cerca de 30% começaram durante a pandemia), em sua maioria adolescentes ou universitários. Desse contingente, 345 000 fazem algum dinheiro com a iniciativa, mas as receitas devem ser divididas com a empresa. Os principais criadores podem ganhar até 1 milhão de dólares por ano. Em 2020, a Roblox prometeu pagar 250 milhões de dólares a seus desenvolvedores, mais que o dobro do ano passado.

Com sede em San Mateo, na Califórnia, a Roblox foi fundada em 2006, mas só nos últimos anos conseguiu rivalizar com gigantes como o Minecraft. Em fevereiro, quando obteve aporte de novos investidores, a empresa foi avaliada em 4 bilhões de dólares. Turbinada pelos fãs pandêmicos, dos quais 54% têm menos de 12 anos, a empresa decidiu abrir seu capital e pretende, no mínimo, dobrar o valor de mercado em 2021. O pedido formal de abertura de capital (IPO, na sigla em inglês) foi enviado em novembro à SEC, órgão do governo americano responsável pela regulamentação de empresas de capital aberto. No documento, a companhia informou que seu fluxo de caixa subiu de 6 milhões de dólares nos nove primeiros meses de 2019 para 292,6 milhões de dólares no mesmo período deste ano. Apesar de certas preocupações, como o risco de que o engajamento diminua quando surgir uma vacina para a Covid-19, os analistas estão otimistas. A depender das crianças, e do desejo delas de viver novas aventuras — mesmo que virtualmente —, a Roblox terá vida longa.



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue...

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And...

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda...