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Ah, se fosse o Chávez...

Primeiro o governo de George W. Bush estatizou as agências Freddie Mac e Fannie Mae, evitando que as duas quebrassem. Menos de duas semanas depois, anunciou na terça-feira (16) uma ajuda de US$ 85 bilhões para a AIG, maior seguradora privada do mundo. Quem se deu ao trabalho de ler a notícia do New York Times deve ter reparado que a contrapartida da ajuda é o controle, pelo governo americano, de 80% da companhia. Em outras palavras, uma nova estatização. Mais um pouco e Olavo de Carvalho e seus pitboys começarão a desconfiar que Bush também está a serviço da causa comunista nas Américas – nunca é demais lembrar que o tal filósofo já escreveu mais de uma vez que Fernando Henrique Cardoso armou a cama para Lula deitar e estaria mancomunado com o seu sucessor na tarefa de acabar com a iniciativa privada no Brasil e na América Latina. Ok, podem parar de rir, vamos falar sério: é claro que não se trata de uma "estratégia socialista" para sair da crise nem também o fim do neoliberalismo, mas os dois fatos reportados acima e mais a dinheirama já gasta para resgatar outras instituições financeiras mostram que na hora que a coisa aperta, nem os mais liberais aguentam o tranco. A mão pesada do Estado está atuando para tentar consertar a sujeira feita pela mão livre e solta dos mercados. De uma forma ou de outra, quem vai acabar pagando a conta é o povão. Alguém já chamou, e não foi ontem, esta jogada de "socialização dos prejuízos". Nada de novo no front, portanto, mas o tamanho do buraco desta vez assusta.

E antes que alguém pergunte o que o Chávez tem a ver com tudo isto, a resposta é uma pergunta: se o presidente venezuelano tivesse metido a mão na maior seguradora privada e nas duas maiores agências imobiliárias de seu país, qual seria a reação da nossa imprensa, sempre tão compreensiva (com o Bush, of course)? Será que as mírians leitoas e os jabores da vida também elogiariam a "ação governamental rápida e determinada" para debelar a crise? Ou será que estariam roucos de tanto guinchar contra o líder bolivariano? Não ganha doce algum quem acertar a resposta, é fácil demais, como dois e dois são quatro...

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