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Jornalismo e (falta de) sensibilidade

Vale a pena ler o comentário abaixo, do jornalista Luiz Weis, no blog Verbo Solto:

Uma atrocidade e duas notícias

A banalidade do mal é um problema para a imprensa. Se o homicídio fosse uma raridade, cada caso seria manchete. Em São Paulo, faz pouco, houve um dia sem uma única morte violenta. Foi notícia.

Agora, para virar notícia de chamar a atenção, um crime precisa ser distinto – literalmente. Essa, pelo menos, é a lógica do jornalismo “que vende”.

Por esse critério, violência polícial é notícia velha. Que pode haver de essencialmente novo na história de um adolescente preso por suspeita de roubo e que aparece morto – a choques elétricos?

Nada, deve ter raciocinado quem decidiu reduzir a 11 linhetas, na seção de pirulitos Pelas Cidades, do Estado de hoje, a história de Carlos Rodrigues Júnior, 15 anos, morto pela PM na madrugada de sábado, em Bauru, no interior paulista.

Mas a repetição dos horrores do gênero não embotou a sensibilidade dos editores da Folha, que deram meia página à atrocidade, na abertura da seção Cotidiano, com chamada na primeira página.

É de rasgar o coração, a propósito, a pequena foto que acompanha a reportagem – o retrato de um menino (com 12 anos à época), sorridente, olhos vivos, de bonezinho, camisa branca, gravata borboleta e jaqueta listrada.

Do álbum da vida para a morte sob tortura.

Comentários

  1. Caro Luiz
    O que eu sinto, é que notícia se fabrica, por exemplo, 8 pessoas vaiando o Lula transforma-se em vaias do nordeste e ganha dimensão nacional, Serra sendo vaido pela Policia Militar, não é noticia, ambas são noticias, mas uma torna-se destaque por uma questão política, a menina que ficou presa no Pará, por ser governado pelo PT,
    é notícia, a desse garoto, não.
    Notícia, hoje, é questão politíco-partidária.
    Saudações

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