Atibaia, conhecida como a terra do morango, era na verdade o refúgio do laranja. As circunstâncias da prisão de Fabrício Queiroz, ex-policial militar e ex-assessor de Flávio Bolsonaro, na cidade do interior de São Paulo — logo lá — na manhã da quinta-feira 18 de junho, são ao mesmo tempo desmoralizantes e demolidoras para o clã Bolsonaro. Desmoralizantes porque expõem quanto havia de mentira nas negativas da família e de seus assessores sobre a relação com Queiroz nos últimos anos. Em entrevistas a ÉPOCA, tanto Flávio quanto o advogado Frederick Wassef haviam dito não ter ideia do paradeiro do ex-assessor — e ele estava havia pelo menos um ano passando temporadas numa casa do próprio Wassef em Atibaia. E não é que nesse tempo o defensor estivesse distante do presidente Jair Bolsonaro e de seus filhos. Com seu mais de 1,90 metro, corpanzil e cabelo sempre impecavelmente lambido com gel, era impossível passar despercebido nas cerimônias no Palácio do Planalto. “Estou no dia a dia com o presidente, conheço tudo que tramita na família Bolsonaro”, disse Wassef em entrevista à Rádio Gaúcha no final de abril. Agora, vai ser difícil explicar que esse “tudo” não tinha nada a ver com onde estava Queiroz, escrevem Bernardo Mello e Juliana Dal Piva no site da revista Época, em texto publicado dia 18/6. Continua a seguir.
São também demolidoras porque abrem a possibilidade de uma bomba contra os Bolsonaros. Em outubro do ano passado, veio a público em ÉPOCA um áudio enviado em junho de 2019 por Queiroz a um amigo em que o assessor reclamava de abandono. “Eu não vejo ninguém mover nada para tentar me ajudar aí. Ver e tal… É só porrada. O MP (Ministério Público) tá com uma pica do tamanho de um cometa para enterrar na gente. Não vi ninguém agir”, disse o ex-policial militar. Para complicar as coisas para a família presidencial, a mulher de Queiroz, Márcia Oliveira de Aguiar, também foi alvo da operação do dia 18, apesar de não ter sido encontrada. Segundo o colunista Lauro Jardim, do jornal O GLOBO, isso era o que mais temia o ex-assessor. A aliados, Queiroz dizia que se manteria calado se, e apenas se, fosse apenas ele o alvo.
Queiroz foi visto pela última vez em público em agosto do ano passado, no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, tratando-se de um câncer. Segundo um caseiro de Wassef, nesse período o ex-PM já estava vivendo em Atibaia com a esposa. Agora terá um novo endereço fixo no complexo penitenciário de Bangu, no Rio de Janeiro. Paulo Klein, o advogado de Queiroz desde que o caso da “rachadinha” no gabinete de Flávio veio à tona, deixou a defesa em dezembro do ano passado, no dia seguinte a uma operação do MP-RJ em endereços ligados ao ex-assessor e ao senador.
Demorou seis meses para Queiroz ter outro defensor. O atual advogado é Paulo Emílio Catta Preta, o mesmo que defendeu o miliciano Adriano da Nóbrega, suspeito de envolvimento no assassinato da vereadora Marielle Franco e de ser o chefe de um grupo de matadores de aluguel. Queiroz e Adriano, morto em fevereiro deste ano, trabalharam juntos no 18º Batalhão da Polícia Militar do Rio. Por intermédio do ex-PM, a mãe, Raimunda Magalhães, e a então esposa de Adriano, Danielle Nóbrega, foram empregadas no gabinete de Flávio e participaram do esquema da rachadinha.
Em abril de 2019, Queiroz, Flávio e outras 94 pessoas físicas e empresas sofreram a quebra de seus sigilos fiscal e bancário por decisão do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ). O áudio em que Queiroz fala da “pica do tamanho de um cometa” data de dois meses depois, do início de junho. Na mesma época, conforme revelou reportagem do GLOBO, Queiroz reclamava de falta de apoio em sua situação penal, mas se mantinha otimista de que poderia fazer indicações de funcionários em Brasília graças a sua influência no clã Bolsonaro. “Tem mais de 500 cargos, cara, lá na Câmara e no Senado. Pode indicar para qualquer comissão ou, alguma coisa, sem vincular a eles (família Bolsonaro) em nada... 20 continho aí para gente caía bem pra c**”, dizia Queiroz.
O nome de Fabrício Queiroz veio à tona pela primeira vez pouco após a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018. Velho amigo e parceiro de pescaria do patriarca, Queiroz passou mais de uma década a serviço do zero um na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e só foi exonerado do cargo duas semanas antes do segundo turno. No fim daquele ano, veio à tona um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que apontou movimentação atípica de R$ 1,2 milhão nas contas de Queiroz. Foram identificados também depósitos fracionados e frequentes de outros funcionários de Flávio na conta bancária de Queiroz, que havia emplacado outros sete familiares em gabinetes legislativos da família Bolsonaro. A suspeita dos investigadores é que Queiroz recolhia parte dos salários de funcionários, prática ilegal, e com o conhecimento de seus superiores.
Na época, Queiroz alegou que o dinheiro extra em sua conta se devia a “rolos”, como a venda de automóveis usados. A partir daí, ele não deu mais entrevistas. O ex-assessor também enrolou quanto pôde antes de prestar depoimento ao Ministério Público, que tentou ouvi-lo pessoalmente. Nos dias marcados, disse que não poderia aparecer — primeiro alegando falta de acesso à investigação, depois usando como justificativa sofrer de um câncer no intestino, o mesmo que o levou a buscar tratamento no Einstein. Depois de dois meses, no fim de fevereiro de 2019, o ex-assessor de Flávio se manifestou por escrito aos promotores e admitiu que arrecadava parte dos salários dos colegas de gabinete — supostamente sem o conhecimento do chefe — para financiar atividades externas e assessores informais, mas sem detalhar os nomes, nem quais atividades. A prática é ilegal, segundo a Alerj.
Os “rolos” envolvendo Queiroz foram além da mera participação na “rachadinha”. Ao atender ao pedido de prisão preventiva feito pelo MP, o juiz Flávio Itabaiana entendeu que o ex-assessor poderia ameaçar testemunhas e atrapalhar as investigações do caso se continuasse solto. Em mensagem obtida pelo MP, a mulher de Queiroz, Márcia Aguiar, chegou a comparar o marido a um bandido que “está preso dando ordens aqui fora, resolvendo tudo”. Márcia Aguiar, que também foi alvo de mandado de prisão, é considerada foragida.
Segundo o magistrado, uma das pessoas que deixaram de ser ouvidas por orientação de Queiroz foi Danielle Nóbrega, ex-mulher de Adriano. As mensagens obtidas pelo MP sugerem que Queiroz já manifestava a Danielle, desde o fim de 2017, preocupação com o “pente-fino” feito pela imprensa na relação de funcionários de Flávio, inclusive com orientações para que ela não usasse o sobrenome de Adriano, embora ainda não tivesse vindo a público nenhuma investigação contra o miliciano.
Em maio, o empresário Paulo Marinho, ex-aliado e suplente de Flávio no Senado, revelou em uma entrevista à Folha de S.Paulo que o zero um havia sido informado por um membro da Polícia Federal, logo após o primeiro turno da eleição de 2018, que Queiroz era alvo de investigação. O vazamento teria ocorrido dois meses antes da deflagração da Operação Furna da Onça, que continha o relatório do Coaf sobre as movimentações atípicas de Queiroz. Tal informação teria motivado a demissão imediata de Queiroz e sua filha, Nathália, que, eficiente que era, trabalhava no gabinete de Jair Bolsonaro em Brasília ao mesmo tempo que ganhava a vida como personal trainer no Rio de Janeiro.
Embora seu sumiço dos holofotes fosse cercado de mistérios, Queiroz não era, até esta quinta-feira, oficialmente procurado pela Justiça. Embora a pergunta “onde está o Queiroz?” tenha sido enfim respondida, o mandado de prisão preventiva deverá ajudar, na verdade, a esclarecer as lacunas da investigação. Uma situação apavorante para um presidente da República que, até onde se pode perceber, mentiu.
São também demolidoras porque abrem a possibilidade de uma bomba contra os Bolsonaros. Em outubro do ano passado, veio a público em ÉPOCA um áudio enviado em junho de 2019 por Queiroz a um amigo em que o assessor reclamava de abandono. “Eu não vejo ninguém mover nada para tentar me ajudar aí. Ver e tal… É só porrada. O MP (Ministério Público) tá com uma pica do tamanho de um cometa para enterrar na gente. Não vi ninguém agir”, disse o ex-policial militar. Para complicar as coisas para a família presidencial, a mulher de Queiroz, Márcia Oliveira de Aguiar, também foi alvo da operação do dia 18, apesar de não ter sido encontrada. Segundo o colunista Lauro Jardim, do jornal O GLOBO, isso era o que mais temia o ex-assessor. A aliados, Queiroz dizia que se manteria calado se, e apenas se, fosse apenas ele o alvo.
Queiroz foi visto pela última vez em público em agosto do ano passado, no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, tratando-se de um câncer. Segundo um caseiro de Wassef, nesse período o ex-PM já estava vivendo em Atibaia com a esposa. Agora terá um novo endereço fixo no complexo penitenciário de Bangu, no Rio de Janeiro. Paulo Klein, o advogado de Queiroz desde que o caso da “rachadinha” no gabinete de Flávio veio à tona, deixou a defesa em dezembro do ano passado, no dia seguinte a uma operação do MP-RJ em endereços ligados ao ex-assessor e ao senador.
Demorou seis meses para Queiroz ter outro defensor. O atual advogado é Paulo Emílio Catta Preta, o mesmo que defendeu o miliciano Adriano da Nóbrega, suspeito de envolvimento no assassinato da vereadora Marielle Franco e de ser o chefe de um grupo de matadores de aluguel. Queiroz e Adriano, morto em fevereiro deste ano, trabalharam juntos no 18º Batalhão da Polícia Militar do Rio. Por intermédio do ex-PM, a mãe, Raimunda Magalhães, e a então esposa de Adriano, Danielle Nóbrega, foram empregadas no gabinete de Flávio e participaram do esquema da rachadinha.
Em abril de 2019, Queiroz, Flávio e outras 94 pessoas físicas e empresas sofreram a quebra de seus sigilos fiscal e bancário por decisão do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ). O áudio em que Queiroz fala da “pica do tamanho de um cometa” data de dois meses depois, do início de junho. Na mesma época, conforme revelou reportagem do GLOBO, Queiroz reclamava de falta de apoio em sua situação penal, mas se mantinha otimista de que poderia fazer indicações de funcionários em Brasília graças a sua influência no clã Bolsonaro. “Tem mais de 500 cargos, cara, lá na Câmara e no Senado. Pode indicar para qualquer comissão ou, alguma coisa, sem vincular a eles (família Bolsonaro) em nada... 20 continho aí para gente caía bem pra c**”, dizia Queiroz.
O nome de Fabrício Queiroz veio à tona pela primeira vez pouco após a vitória de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2018. Velho amigo e parceiro de pescaria do patriarca, Queiroz passou mais de uma década a serviço do zero um na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e só foi exonerado do cargo duas semanas antes do segundo turno. No fim daquele ano, veio à tona um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que apontou movimentação atípica de R$ 1,2 milhão nas contas de Queiroz. Foram identificados também depósitos fracionados e frequentes de outros funcionários de Flávio na conta bancária de Queiroz, que havia emplacado outros sete familiares em gabinetes legislativos da família Bolsonaro. A suspeita dos investigadores é que Queiroz recolhia parte dos salários de funcionários, prática ilegal, e com o conhecimento de seus superiores.
Na época, Queiroz alegou que o dinheiro extra em sua conta se devia a “rolos”, como a venda de automóveis usados. A partir daí, ele não deu mais entrevistas. O ex-assessor também enrolou quanto pôde antes de prestar depoimento ao Ministério Público, que tentou ouvi-lo pessoalmente. Nos dias marcados, disse que não poderia aparecer — primeiro alegando falta de acesso à investigação, depois usando como justificativa sofrer de um câncer no intestino, o mesmo que o levou a buscar tratamento no Einstein. Depois de dois meses, no fim de fevereiro de 2019, o ex-assessor de Flávio se manifestou por escrito aos promotores e admitiu que arrecadava parte dos salários dos colegas de gabinete — supostamente sem o conhecimento do chefe — para financiar atividades externas e assessores informais, mas sem detalhar os nomes, nem quais atividades. A prática é ilegal, segundo a Alerj.
Os “rolos” envolvendo Queiroz foram além da mera participação na “rachadinha”. Ao atender ao pedido de prisão preventiva feito pelo MP, o juiz Flávio Itabaiana entendeu que o ex-assessor poderia ameaçar testemunhas e atrapalhar as investigações do caso se continuasse solto. Em mensagem obtida pelo MP, a mulher de Queiroz, Márcia Aguiar, chegou a comparar o marido a um bandido que “está preso dando ordens aqui fora, resolvendo tudo”. Márcia Aguiar, que também foi alvo de mandado de prisão, é considerada foragida.
Segundo o magistrado, uma das pessoas que deixaram de ser ouvidas por orientação de Queiroz foi Danielle Nóbrega, ex-mulher de Adriano. As mensagens obtidas pelo MP sugerem que Queiroz já manifestava a Danielle, desde o fim de 2017, preocupação com o “pente-fino” feito pela imprensa na relação de funcionários de Flávio, inclusive com orientações para que ela não usasse o sobrenome de Adriano, embora ainda não tivesse vindo a público nenhuma investigação contra o miliciano.
Em maio, o empresário Paulo Marinho, ex-aliado e suplente de Flávio no Senado, revelou em uma entrevista à Folha de S.Paulo que o zero um havia sido informado por um membro da Polícia Federal, logo após o primeiro turno da eleição de 2018, que Queiroz era alvo de investigação. O vazamento teria ocorrido dois meses antes da deflagração da Operação Furna da Onça, que continha o relatório do Coaf sobre as movimentações atípicas de Queiroz. Tal informação teria motivado a demissão imediata de Queiroz e sua filha, Nathália, que, eficiente que era, trabalhava no gabinete de Jair Bolsonaro em Brasília ao mesmo tempo que ganhava a vida como personal trainer no Rio de Janeiro.
Embora seu sumiço dos holofotes fosse cercado de mistérios, Queiroz não era, até esta quinta-feira, oficialmente procurado pela Justiça. Embora a pergunta “onde está o Queiroz?” tenha sido enfim respondida, o mandado de prisão preventiva deverá ajudar, na verdade, a esclarecer as lacunas da investigação. Uma situação apavorante para um presidente da República que, até onde se pode perceber, mentiu.
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