Texto mara, vale ler!
PABLO XIMÉNEZ DE SANDOVAL
Los Angeles - 12 DEC 2019 - 17:03 BRT
Há preconceitos sobre as mulheres, preconceitos sobre jornalistas e preconceitos sobre as mulheres jornalistas. Clint Eastwood parece cair em todos eles em seu novo filme, Richard Jewell, que estreia nesta sexta-feira nos EUA e ainda não tem data de estreia no Brasil. Pelo menos é o que considera um jornal de Atlanta, o Atlanta Journal-Constitution (AJC), que protestou contra Eastwood e a Warner Bros em defesa de uma de suas jornalistas, que aparece de modo negativo no filme baseado em fatos ocorridos mais de duas décadas atrás. A polêmica surge em uma Hollywood transformada nos últimos dois anos pelo movimento feminista Me Too.
Richard Jewell foi um personagem muito conhecido nos Estados Unidos durante alguns meses de 1996. Trabalhava como segurança nas Olimpíadas de Atlanta. Um dia, observou uma mochila suspeita e chamou a polícia. Era um explosivo. Jewell ajudou a esvaziar o complexo rapidamente. Embora a bomba tenha explodido e matado uma mulher, sua intervenção salvou muitas pessoas. No entanto, alguns dias depois ele começou a ser investigado como suspeito, o que teve graves consequências para sua reputação e a recordação que se tem daquele incidente. Jewell nunca foi indiciado. O verdadeiro assassino confessou em 2003 e está cumprindo sentença de prisão perpétua. O roteiro do filme, escrito por Billy Ray, é baseado em artigos da época sobre o calvário de Jewell na opinião pública e em um novo livro sobre o caso.
O filme dá um papel fundamental a Kathy Scruggs, a repórter do jornal Atlanta Journal-Constitution (AJC) que obteve o furo de que o FBI estava investigando Jewell como suspeito. A cobertura jornalística dessa investigação teve repercussão nacional e afundou Jewell, que até então era o herói dos Jogos. O filme assume que Scruggs obteve aquelas informações em troca de sexo com o agente que investigava o caso. Scruggs não pode se defender. Morreu em 2001 de uma overdose de analgésicos, aos 42 anos.
Na segunda-feira passada, a AJC e a editora Cox Enterprises enviaram por meio de seus advogados uma carta à Warner Bros, Clint Eastwood e Billy Ray, protestando que “a versão de Scruggs no filme, interpretada por Olivia Wilde, a apresenta como alguém que recorre a relações ilícitas para obter informações". “A repórter da AJC é reduzida a um objeto que se vende por sexo”, diz a carta, acrescentando que o filme dá a impressão de que o jornal aceita que o sexo seja oferecido em troca de reportagens. “Isso é totalmente falso e malicioso, e extremamente prejudicial e difamatório.” A editora e o jornal exigem que a Warner Bros reconheça publicamente que “alguns fatos são imaginados com uma intenção dramática” e que, ao representar certos fatos e personagens foram tomadas “licenças artísticas”. A carta também exige que se coloque uma advertência aos espectadores sobre isso.
O personagem da repórter que dorme com sua fonte não é incomum em Hollywood. O exemplo mais recente é House of Cards. As razões pelas quais os roteiristas acham fácil presumir que jovens repórteres podem obter sucesso com sexo e as razões pelas quais o público acredita nisso são temas para outro debate. Mas o fato é que Eastwood e Ray decidiram fazer essa suposição com uma pessoa real, que, além do mais, não pode se defender. Donald Johnson, o agente do FBI que teria sido a fonte de Scruggs, também não pode dar sua versão. Morreu em 2003.
A Warner Bros respondeu na segunda-feira mesmo com uma declaração na qual defende o filme. "O roteiro se baseia em muito material altamente confiável", diz o comunicado citado pela Variety. “É triste que o Atlanta Journal-Constitution, que fez parte do julgamento apressado contra Jewell, agora tente prejudicar nossos cineastas e nosso elenco. Richard Jewell se concentra na verdadeira vítima, procura contar sua história, confirmar sua inocência e restaurar seu bom nome.” A empresa não entra no ponto-chave da disputa, que não é a inocência de Jewell, mas, sim, o preconceito sobre o trabalho de Scruggs.
Aos 89 anos, Eastwood vem dedicando os anos recentes de sua carreira a fazer filmes em homenagem a heróis comuns. Seus personagens favoritos são pessoas simples a quem o destino coloca em circunstâncias extremas onde dão o melhor de si e, simplesmente fazendo o que sabem fazer, se arriscam pelos outros. Filmes como Sully: o Herói do Rio Hudson, 15:17 – Trem para Paris e Sniper Americano são tributos a pessoas reais com histórias extraordinárias publicadas nos jornais. Com Richard Jewell ele volta a esse tema. "Gostaria que lhe dedicassem uma rua”, disse Eastwood sobre Jewell no American Film Festival no final de novembro. “Ele merece isso e muito mais.”
PABLO XIMÉNEZ DE SANDOVAL
Los Angeles - 12 DEC 2019 - 17:03 BRT
Há preconceitos sobre as mulheres, preconceitos sobre jornalistas e preconceitos sobre as mulheres jornalistas. Clint Eastwood parece cair em todos eles em seu novo filme, Richard Jewell, que estreia nesta sexta-feira nos EUA e ainda não tem data de estreia no Brasil. Pelo menos é o que considera um jornal de Atlanta, o Atlanta Journal-Constitution (AJC), que protestou contra Eastwood e a Warner Bros em defesa de uma de suas jornalistas, que aparece de modo negativo no filme baseado em fatos ocorridos mais de duas décadas atrás. A polêmica surge em uma Hollywood transformada nos últimos dois anos pelo movimento feminista Me Too.
Richard Jewell foi um personagem muito conhecido nos Estados Unidos durante alguns meses de 1996. Trabalhava como segurança nas Olimpíadas de Atlanta. Um dia, observou uma mochila suspeita e chamou a polícia. Era um explosivo. Jewell ajudou a esvaziar o complexo rapidamente. Embora a bomba tenha explodido e matado uma mulher, sua intervenção salvou muitas pessoas. No entanto, alguns dias depois ele começou a ser investigado como suspeito, o que teve graves consequências para sua reputação e a recordação que se tem daquele incidente. Jewell nunca foi indiciado. O verdadeiro assassino confessou em 2003 e está cumprindo sentença de prisão perpétua. O roteiro do filme, escrito por Billy Ray, é baseado em artigos da época sobre o calvário de Jewell na opinião pública e em um novo livro sobre o caso.
O filme dá um papel fundamental a Kathy Scruggs, a repórter do jornal Atlanta Journal-Constitution (AJC) que obteve o furo de que o FBI estava investigando Jewell como suspeito. A cobertura jornalística dessa investigação teve repercussão nacional e afundou Jewell, que até então era o herói dos Jogos. O filme assume que Scruggs obteve aquelas informações em troca de sexo com o agente que investigava o caso. Scruggs não pode se defender. Morreu em 2001 de uma overdose de analgésicos, aos 42 anos.
Na segunda-feira passada, a AJC e a editora Cox Enterprises enviaram por meio de seus advogados uma carta à Warner Bros, Clint Eastwood e Billy Ray, protestando que “a versão de Scruggs no filme, interpretada por Olivia Wilde, a apresenta como alguém que recorre a relações ilícitas para obter informações". “A repórter da AJC é reduzida a um objeto que se vende por sexo”, diz a carta, acrescentando que o filme dá a impressão de que o jornal aceita que o sexo seja oferecido em troca de reportagens. “Isso é totalmente falso e malicioso, e extremamente prejudicial e difamatório.” A editora e o jornal exigem que a Warner Bros reconheça publicamente que “alguns fatos são imaginados com uma intenção dramática” e que, ao representar certos fatos e personagens foram tomadas “licenças artísticas”. A carta também exige que se coloque uma advertência aos espectadores sobre isso.
O personagem da repórter que dorme com sua fonte não é incomum em Hollywood. O exemplo mais recente é House of Cards. As razões pelas quais os roteiristas acham fácil presumir que jovens repórteres podem obter sucesso com sexo e as razões pelas quais o público acredita nisso são temas para outro debate. Mas o fato é que Eastwood e Ray decidiram fazer essa suposição com uma pessoa real, que, além do mais, não pode se defender. Donald Johnson, o agente do FBI que teria sido a fonte de Scruggs, também não pode dar sua versão. Morreu em 2003.
A Warner Bros respondeu na segunda-feira mesmo com uma declaração na qual defende o filme. "O roteiro se baseia em muito material altamente confiável", diz o comunicado citado pela Variety. “É triste que o Atlanta Journal-Constitution, que fez parte do julgamento apressado contra Jewell, agora tente prejudicar nossos cineastas e nosso elenco. Richard Jewell se concentra na verdadeira vítima, procura contar sua história, confirmar sua inocência e restaurar seu bom nome.” A empresa não entra no ponto-chave da disputa, que não é a inocência de Jewell, mas, sim, o preconceito sobre o trabalho de Scruggs.
Aos 89 anos, Eastwood vem dedicando os anos recentes de sua carreira a fazer filmes em homenagem a heróis comuns. Seus personagens favoritos são pessoas simples a quem o destino coloca em circunstâncias extremas onde dão o melhor de si e, simplesmente fazendo o que sabem fazer, se arriscam pelos outros. Filmes como Sully: o Herói do Rio Hudson, 15:17 – Trem para Paris e Sniper Americano são tributos a pessoas reais com histórias extraordinárias publicadas nos jornais. Com Richard Jewell ele volta a esse tema. "Gostaria que lhe dedicassem uma rua”, disse Eastwood sobre Jewell no American Film Festival no final de novembro. “Ele merece isso e muito mais.”
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