Pular para o conteúdo principal

Reinaldão se atrapalha nas contas

O jornalista Reinaldo Azevedo lida melhor com as palavras do que com os números. No comentário publicado em seu blog e reproduzido abaixo, ele refuta os argumentos expostos aqui sobre a eleição de Barack Obama. Bem, o ultraconservador colunista de Veja não percebeu que as suas próprias contas mostram que Obama venceu exatamente pelo voto dos negros, ou seja, que a questão racial teve importância, sim, na eleição. Senão vejamos, usando os números de Reinaldão:

Quantas pessoas votaram?
153,1 milhões

Quantas são negros?
13% - ou 19,9 milhões
Quantos negros declararam ter votado em Obama?
95% ou 18,91 milhões

Do total de eleitores, quantos são hispânicos?
8% ou 12,25 milhões
Quantos hispânicos declararam ter votado em Obama?
66% ou 8,09 milhões

Do total de eleitores, quantos são brancos?
74% ou 113,29 milhões
Quantos brancos declararam ter votado em Obama?
43% ou 48,71 milhões

LOGO, VOTARAM EM OBAMA
- 27 milhões de negros e hispânicos
- 48,71 milhões de brancos


Bem, tudo isto posto, qualquer criança vai entender: Obama perdeu a eleição entre os brancos. Se não tivesse conseguido os 95% entre os negros e 66% entre os hispânicos, McCain seria hoje o presidente dos Estados Unidos. É simples assim, basta supor que o candidato democrata fosse outro branco (ou a loira Clinton), que a votação entre os brancos fosse a mesma obtida por Obama e que o score entre os negros e hispânicos fosse menor, digamos que da ordem de 60% a 40% para os democratas. Fazendo a conta, teríamos o seguinte resultado: 48,7 milhões de brancos + 11,9 milhões de votos entre os negros + 7,5 milhões entre os hispânicos, totalizando 68,1 milhões de votos ou 44% do eleitorado total. John McCain estaria eleito. Em outras palavras, sem o apoio maciço de negros e hispânicos, o candidato democrata não teria vencido.

Felizmente Reinaldo Azevedo não precisa fazer muitas contas no seu dia a dia – a maior parte do tempo ele utiliza, com o talento que lhe é peculiar, para difundir as idéias ultraconservadoras pela blogosfera e nas páginas do panfletão de direita para o qual trabalha. O autor destas Entrelinhas não tem a pretensão de construir casas, mas também jamais confiaria ao colega da Veja esta atribuição. Se ele faz tamanha confusão com regra de três, imagine o leitor o que poderia acontecer nas operações mais complexas.

Por fim, este blog não acha que a maioria votou em função da cor da pele de Obama. Mas tem certeza que a cor da pele de Barack Obama motivou os eleitores negros e hispânicos a votar e na proporção que se verificou nas urnas. O blogueiro de Veja não concorda com isto e tenta bolar uma argumentação mirabolante para provar que os brancos deram a vitória a Obama. Argumentação esta que, olhando de perto, não deve convencer nem o próprio autor.
A seguir, o post original de Reinaldo Azevedo.

A FARSA RACIALISTA: OBAMA FOI ELEITO PELOS BRANCOS

A nossa sorte é que jornalistas e analistas políticos não constroem casas, ou elas cairiam sobre nossas cabeças. Também não são cirurgiões, ou arrancariam as vísceras do paciente ao tentar lhes reparar algum mal. Obama, o suposto candidato de uma minoria nos EUA, foi ELEITO PELOS BRANCOS, mas a clivagem que se faz para analisar o resultado é a racial. É UM MOVIMENTO DE ESTUPIDEZ COLETIVA. É o triunfo do politicamente correto sobre a razão. Os números são inquestionáveis. E, ademais, se é para falar em racismo, então racistas foram os negros e os hispânicos, que teriam VOTADO CONTRA UM BRANCO.

OCORRE QUE A MAIORIA VOTOU CONTRA BUSH E NÃO NA PELE DE BARACK OBAMA.
E, dados os números, quem elegeu Barack Obama presidente FORAM OS BRANCOS. Basta fazer as contas (com os dados disponíveis e segundo o voto declarado, é bom deixar claro).

Quantas pessoas votaram?
153,1 milhões

Quantas são negros?
13% - ou 19,9 milhões
Quantos negros declararam ter votado em Obama?
95% ou 18,91 milhões

Do total de eleitores, quantos são hispânicos?
8% ou 12,25 milhões
Quantos hispânicos declararam ter votado em Obama?
66% ou 8,09 milhões

Do total de eleitores, quantos são brancos?
74% ou 113,29 milhões
Quantos brancos declararam ter votado em Obama?
43% ou 48,71 milhões

LOGO, VOTARAM EM OBAMA
- 27 milhões de negros e hispânicos
- 48,71 milhões de brancos

Assim, sendo verdadeiros os dados, fica evidente que:
- os brancos elegeram Barack Obama, não os negros ou hispânicos;
- se alguém quiser falar em racismo, então é o caso de procurá-lo entre os negros principalmente, e secundariamente entre os hispânicos;

- o famoso “racismo” entre os brancos é uma questão, hoje, que tem importância apenas para a militância das minorias, como sempre. Os brancos que votaram em Obama acharam que a cor da pele não tem importância ou, vá lá, é menos importante do que as restrições todas que têm ao governo Bush.

Vivemos a era do surrealismo analítico. É uma sorte — para ele próprio — que Obama não seja tão idiota quanto seus entusiastas. Se tivesse feito o discurso racial que fazem os analistas, é evidente que não teria sido eleito. Por isso, habilmente, driblou a questão e falou sempre em superar essa clivagem. Por isso omitiu a questão até e seu discurso da vitória, preferindo reafirmar a vitalidade da democracia americana.

E como! O sistema é realmente forte. Afinal, um candidato apresentado como representante de 13% da população — de todo modo, é mentira: “metade” de Obama pertence ao grupo de 74% dos americanos — é eleito como uma impressionante massa de votos do grupo que a militância apresenta como um rival. Ele não caiu nessa esparrela. Continuo no post seguinte.

Comentários

  1. Very well explained Luizao. When do we organize a churrasco with RA to explain him a bit of maths studies?
    Abcs
    Villa Lucchese

    ResponderExcluir
  2. Isto não me impressiona nem um pouco. Esta gente é capaz tudo para convencer os abobalhados que os leiem de que 1 é maior ou igual a 2. Quando se trata de gráficos, por exemplo, fazem com que uma inclinação de 1 para 2 pareça ser de 1 para 10, principalmente em se tratando de assuntos do Gov. Federal. É de arrepiar a cara de pau.

    ResponderExcluir
  3. A eleição de Obama é um feito importante para a história da humanidade. A escravidão negra que perdurou por mais de 350 anos no mundo inteiro, gerou a maior de todas as discriminações do nosso mundo: o preconceito racial contra os afro-descendentes. Assim, a eleição de Obama em um país de tradição escravista é a superação de um obstáculo no caminho da verdadeira igualdade e na busca do respeito a todas as diversidades. Não é o fim é só mais um começo.
    Obama pode ser somente mais um presidente dos Estados Unidos, que produz políticas que beneficiem o seu país (que diga-se: nem sempre bom para o restante do mundo), ainda assim não poderemos contar a história da humanidade sem falar dele.
    Mas, acredito que, pelo menos, Obama fará, como presidente dos Estados Unidos uma coisa boa: porá fim ao embargo econômico à Cuba, criado pela guerra fria, que já não existe mais.

    ResponderExcluir
  4. Bom, se ele contou com os votos nos negros e hispânicos para vencer, isso eu não sei mas, de acordo com o filósofo Olavo de Carvalho, Obama foi apoiado ( ou: "nos foi empurrado goela abaixo" ) pela elite endinheirada mundial, pelas ONGs, pela Fundação Ford, pelo Foro de São Paulo, pela mídia liberal, por Hollywood ( e olha que o Paul Newman acabou de falecer )em peso e sei lá mais quem. Dessa forma, o voto do eleitorado é o de menos. Acho.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

O Entrelinhas não censura comentaristas, mas não publica ofensas pessoais e comentários com uso de expressões chulas. Os comentários serão moderados, mas são sempre muito bem vindos.

Postagens mais visitadas deste blog

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue

OCDE e o erro do governo na gestão das expectativas

O assunto do dia nas redes é a tal negativa dos Estados Unidos para a entrada do Brasil na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto os oposicionistas aproveitam para tripudiar, os governistas tentam colocar panos quentes na questão, alegando que não houve propriamente um veto à presença do Brasil no clube dos grandes, a Série A das nações. Quem trabalha com comunicação corporativa frequentemente escuta a frase "é preciso gerenciar a expectativa dos clientes". O problema todo é que o governo do presidente Bolsonaro vendeu como grande vitória a entrada com apoio de Trump - que não era líquida e certa - do país na OCDE. Ou seja, gerenciou mal a expectativa do cliente, no caso, a opinião pública brasileira. Não deixa de ser irônico que a Argentina esteja entrando na frente, logo o país vizinho cujo próximo governo provavelmente não será dos mais alinhados a Trump. A questão toda é que o Brasil não "perdeu", como o pobre Fla-Flu que impe