Muito interessante o artigo abaixo, da colunista Míriam Leitão, publicado em O Globo nesta sexta-feira. Míriam nem de longe pode ser considerada uma "petista", mas bateu até bem forte nas idéias de Sérgio Guerra, presidente nacional do PSDB. Pelo que se pode ler abaixo, ela prefere que as coisas continuem como estão. Resta saber se isto não seria mais natural de ocorrer se Dilma Rousseff suceder o presidente Lula... No fundo, algo está errado: ou bem o PSDB explica direito o que vai mudar e de que maneira vai mudar na condução da política econômica, em caso de vitória em outubro, ou deveria desistir de lançar uma candidatura própria.
O mesmo raciocínio vale para o discurso do próprio presidenciável tucano José Serra, que pode ser lido na matéria do Estadão de hoje, também reproduzida ao final desta nota, dando conta de que o candidato à presidência "não é o líder da oposição". Serra não quer bater no popular presidente Lula e prefere uma campanha sem embates com o governo.
O problema todo é que não se tem notícia de alguém ter vencido uma eleição presidencial nenhum tipo de disputa, sem em pelo menos alguns momentos chutar a canela do adversário. Até o tal "Lulinha paz e amor" de 2002, se bem analisado, apresentou em diversos episódios um grau de agressividade contra os adversários e o governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso que o credenciou, ao lado do esforço de comunicação propositivo, com a Carta aos Brasileiros, a vencer aquela eleição. Ademais, Lula já tinha no imaginário popular, graças aos anos todos em que esteve fora do poder, a aura de oposicionista, de personagem da mudança, de algo diferente na política brasileira. Enfim, ganhar uma eleição sem dar um único peteleco no adversário, ainda que ele tenha 99% de popularidade, é tarefa bem complicada, para dizer o mínimo. E fazer isto sem também explicitar os planos para o futuro, então, é algo quase impossível.
A seguir, os textos de Míriam Leitão e a matéria do Estadão, com link para leitura completa.
O câmbio do PSDB
O senador Sérgio Guerra, presidente do PSDB, disse que o partido não pretende, se for eleito, mudar metas de inflação, nem câmbio flutuante, nem autonomia do Banco Central. Isso parece a você o oposto do que ele disse à "Veja"? Também achei. Ele garante que os fundamentos da política econômica serão os mesmos, mas os pesos serão diferentes. Entendeu? Nem eu.
O que o senador me disse, quando liguei para entender melhor o que ele enunciara na entrevista da revista, foi o seguinte:
— As metas de inflação serão mantidas porque têm tido um bom resultado. O câmbio permanecerá sendo flutuante. O grande instrumento de mudança será o controle dos gastos públicos. Vamos cortar gastos de custeio e aumentar os investimentos, mudando o papel do Estado.
Na revista "Veja", quando o repórter Diego Escosteguy perguntou se haveria mudança na política econômica caso eles fossem eleitos, o mesmo senador respondeu: "Sem dúvida nenhuma. Iremos mexer nas taxas de juros, no câmbio e nas metas de inflação. Essas variáveis continuarão a reger nossa economia, mas terão pesos diferentes."
Exceto o fato de que elas terão pesos diferentes, a resposta que ele me deu tem um peso bem diferente da que deu à "Veja".
Explicação de Sérgio Guerra quando cobrei a contradição:
— Dei uma entrevista muito maior do que essa, como é normal na revista. Isso é parte do que eu disse, mas não tudo. Não disse que se vai mexer nas metas de inflação.
Quis saber então como é que eles vão "mexer com câmbio e com os juros". Qual será a nova política cambial e monetária que vai substituir a atual?
— Vamos atuar fortemente nos gastos públicos, vamos reorganizar o Estado, rever prioridades. Os juros são bastante altos. O mercado continuará tendo um papel, mas vamos trabalhar para que os juros caiam.
Perguntei se esse mexer com os juros significaria intervir nas decisões hoje tomadas de forma autônoma pelo Banco Central:
— Não vamos intervir, o Banco Central terá independência.
Então quer dizer que vocês vão propor a independência do Banco Central?
— Não. Isso não foi discutido dentro do partido.
Então ficará tudo como é atualmente, com o BC tendo autonomia?
— Sim, o BC continuará tendo autonomia, mas trabalharemos para que os juros caiam porque eles são altíssimos no Brasil.
Argumentei que os juros são altos, mas caíram muito nos últimos anos, por decisões do próprio BC.
Os juros vão cair, segundo Sérgio Guerra, por força desse ajuste fiscal.
— Vamos fazer um forte ajuste fiscal — disse.
De fato, essa é a forma pela qual se abre espaço para a queda dos juros, mas nada é feito de uma para a outra, e na revista ele tinha dito: "Se ganharmos, agiremos rápida e objetivamente."
Na conversa comigo, ele falou de refazer o planejamento do governo, mudar a forma de gastar. Nada que tenha resultado assim tão imediato.
O senador me disse, mais de uma vez, que não será abandonada a flutuação do câmbio. Mas falou em mudar o câmbio.
— O câmbio será mais apreciado. É claro que não dá mais para conviver com estas taxas de câmbio. Os níveis são evidentemente prejudiciais às exportações brasileiras — disse.
O interesse em tudo o que ele disse é óbvio: ele é o presidente do maior partido de oposição e que está na frente nas pesquisas de intenção de votos.
Sem intervir no câmbio, a única forma de apreciar a taxa é derrubar os juros. E a única forma de derrubar os juros é cortando os gastos públicos, reduzindo demanda agregada para neutralizar possíveis pressões inflacionárias que coloquem as metas de inflação em risco.
Foi esse o edifício montado pelo próprio PSDB depois da desvalorização cambial de 1999. Na política de metas de inflação, o BC tem que ter autonomia para elevar os juros caso a inflação saia da trajetória estabelecida.
O problema é que isso sempre causa atritos com a área política. Em qualquer governo. O dólar baixo é curioso porque traz efeitos diferentes. Por um lado, reduz a inflação e aumenta a capacidade de compra dos salários. Desses efeitos, todos os governantes gostam, mas nunca atribuem ao câmbio. Por outro, reduz a competitividade das exportações e incentiva importações. Isso, todos condenam. E nesse caso também há uma complicação a mais: muitas vezes quem exporta também importa e isso acaba neutralizando um pouco suas perdas. A confusão é que nenhum governo consegue apreciar o câmbio quando quer, a menos que mude a política de flutuação cambial, o que tem, como aprendemos, vários perigos.
A política econômica em seus fundamentos principais foi uma montagem do governo do PSDB. Ela foi mantida pelo governo do PT. Durante a campanha, como todos sabem, o então candidato Lula teve que divulgar uma "Carta aos Brasileiros", mudando as bases das políticas que eles vinham defendendo por anos. Se continuar falando em mudanças na política econômica sem explicar direito, o PSDB vai acabar tendo que fazer também a sua "Carta aos Brasileiros".
Candidato não é chefe da oposição, diz Serra
Christiane Samarco, O Estado de S. Paulo
O governador José Serra só oficializará a candidatura presidencial em março, mas já adianta que o foco da campanha do PSDB não será o atual governo. Demonstrando, pela primeira vez, menos preocupação com a condição de candidato natural à sucessão de Lula, ele conversou com o Estado na noite de quarta-feira, depois de participar, no Itamaraty, de evento em que foram anunciados investimentos federais nos Estados que sediarão jogos da Copa de 2014.
"Candidato a presidente não é chefe da oposição", afirmou, delegando ao PSDB a tarefa de criticar o governo Lula e se guardando para o que considera o confronto real, com a candidata Dilma Rousseff, mais adiante. A síntese é a de que o exercício da oposição é tarefa partidária. A sua é a de governar o Estado.
A mensagem alcança o Planalto porque o governador avalia que o presidente Lula antecipou o calendário eleitoral também para atraí-lo antes do tempo. Se caísse na cilada palaciana, facilitaria a estratégia de Lula de estabelecer uma campanha polarizada entre seu governo e o anterior, do PSDB.
O mesmo raciocínio vale para o discurso do próprio presidenciável tucano José Serra, que pode ser lido na matéria do Estadão de hoje, também reproduzida ao final desta nota, dando conta de que o candidato à presidência "não é o líder da oposição". Serra não quer bater no popular presidente Lula e prefere uma campanha sem embates com o governo.
O problema todo é que não se tem notícia de alguém ter vencido uma eleição presidencial nenhum tipo de disputa, sem em pelo menos alguns momentos chutar a canela do adversário. Até o tal "Lulinha paz e amor" de 2002, se bem analisado, apresentou em diversos episódios um grau de agressividade contra os adversários e o governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso que o credenciou, ao lado do esforço de comunicação propositivo, com a Carta aos Brasileiros, a vencer aquela eleição. Ademais, Lula já tinha no imaginário popular, graças aos anos todos em que esteve fora do poder, a aura de oposicionista, de personagem da mudança, de algo diferente na política brasileira. Enfim, ganhar uma eleição sem dar um único peteleco no adversário, ainda que ele tenha 99% de popularidade, é tarefa bem complicada, para dizer o mínimo. E fazer isto sem também explicitar os planos para o futuro, então, é algo quase impossível.
A seguir, os textos de Míriam Leitão e a matéria do Estadão, com link para leitura completa.
O câmbio do PSDB
O senador Sérgio Guerra, presidente do PSDB, disse que o partido não pretende, se for eleito, mudar metas de inflação, nem câmbio flutuante, nem autonomia do Banco Central. Isso parece a você o oposto do que ele disse à "Veja"? Também achei. Ele garante que os fundamentos da política econômica serão os mesmos, mas os pesos serão diferentes. Entendeu? Nem eu.
O que o senador me disse, quando liguei para entender melhor o que ele enunciara na entrevista da revista, foi o seguinte:
— As metas de inflação serão mantidas porque têm tido um bom resultado. O câmbio permanecerá sendo flutuante. O grande instrumento de mudança será o controle dos gastos públicos. Vamos cortar gastos de custeio e aumentar os investimentos, mudando o papel do Estado.
Na revista "Veja", quando o repórter Diego Escosteguy perguntou se haveria mudança na política econômica caso eles fossem eleitos, o mesmo senador respondeu: "Sem dúvida nenhuma. Iremos mexer nas taxas de juros, no câmbio e nas metas de inflação. Essas variáveis continuarão a reger nossa economia, mas terão pesos diferentes."
Exceto o fato de que elas terão pesos diferentes, a resposta que ele me deu tem um peso bem diferente da que deu à "Veja".
Explicação de Sérgio Guerra quando cobrei a contradição:
— Dei uma entrevista muito maior do que essa, como é normal na revista. Isso é parte do que eu disse, mas não tudo. Não disse que se vai mexer nas metas de inflação.
Quis saber então como é que eles vão "mexer com câmbio e com os juros". Qual será a nova política cambial e monetária que vai substituir a atual?
— Vamos atuar fortemente nos gastos públicos, vamos reorganizar o Estado, rever prioridades. Os juros são bastante altos. O mercado continuará tendo um papel, mas vamos trabalhar para que os juros caiam.
Perguntei se esse mexer com os juros significaria intervir nas decisões hoje tomadas de forma autônoma pelo Banco Central:
— Não vamos intervir, o Banco Central terá independência.
Então quer dizer que vocês vão propor a independência do Banco Central?
— Não. Isso não foi discutido dentro do partido.
Então ficará tudo como é atualmente, com o BC tendo autonomia?
— Sim, o BC continuará tendo autonomia, mas trabalharemos para que os juros caiam porque eles são altíssimos no Brasil.
Argumentei que os juros são altos, mas caíram muito nos últimos anos, por decisões do próprio BC.
Os juros vão cair, segundo Sérgio Guerra, por força desse ajuste fiscal.
— Vamos fazer um forte ajuste fiscal — disse.
De fato, essa é a forma pela qual se abre espaço para a queda dos juros, mas nada é feito de uma para a outra, e na revista ele tinha dito: "Se ganharmos, agiremos rápida e objetivamente."
Na conversa comigo, ele falou de refazer o planejamento do governo, mudar a forma de gastar. Nada que tenha resultado assim tão imediato.
O senador me disse, mais de uma vez, que não será abandonada a flutuação do câmbio. Mas falou em mudar o câmbio.
— O câmbio será mais apreciado. É claro que não dá mais para conviver com estas taxas de câmbio. Os níveis são evidentemente prejudiciais às exportações brasileiras — disse.
O interesse em tudo o que ele disse é óbvio: ele é o presidente do maior partido de oposição e que está na frente nas pesquisas de intenção de votos.
Sem intervir no câmbio, a única forma de apreciar a taxa é derrubar os juros. E a única forma de derrubar os juros é cortando os gastos públicos, reduzindo demanda agregada para neutralizar possíveis pressões inflacionárias que coloquem as metas de inflação em risco.
Foi esse o edifício montado pelo próprio PSDB depois da desvalorização cambial de 1999. Na política de metas de inflação, o BC tem que ter autonomia para elevar os juros caso a inflação saia da trajetória estabelecida.
O problema é que isso sempre causa atritos com a área política. Em qualquer governo. O dólar baixo é curioso porque traz efeitos diferentes. Por um lado, reduz a inflação e aumenta a capacidade de compra dos salários. Desses efeitos, todos os governantes gostam, mas nunca atribuem ao câmbio. Por outro, reduz a competitividade das exportações e incentiva importações. Isso, todos condenam. E nesse caso também há uma complicação a mais: muitas vezes quem exporta também importa e isso acaba neutralizando um pouco suas perdas. A confusão é que nenhum governo consegue apreciar o câmbio quando quer, a menos que mude a política de flutuação cambial, o que tem, como aprendemos, vários perigos.
A política econômica em seus fundamentos principais foi uma montagem do governo do PSDB. Ela foi mantida pelo governo do PT. Durante a campanha, como todos sabem, o então candidato Lula teve que divulgar uma "Carta aos Brasileiros", mudando as bases das políticas que eles vinham defendendo por anos. Se continuar falando em mudanças na política econômica sem explicar direito, o PSDB vai acabar tendo que fazer também a sua "Carta aos Brasileiros".
Candidato não é chefe da oposição, diz Serra
Christiane Samarco, O Estado de S. Paulo
O governador José Serra só oficializará a candidatura presidencial em março, mas já adianta que o foco da campanha do PSDB não será o atual governo. Demonstrando, pela primeira vez, menos preocupação com a condição de candidato natural à sucessão de Lula, ele conversou com o Estado na noite de quarta-feira, depois de participar, no Itamaraty, de evento em que foram anunciados investimentos federais nos Estados que sediarão jogos da Copa de 2014.
"Candidato a presidente não é chefe da oposição", afirmou, delegando ao PSDB a tarefa de criticar o governo Lula e se guardando para o que considera o confronto real, com a candidata Dilma Rousseff, mais adiante. A síntese é a de que o exercício da oposição é tarefa partidária. A sua é a de governar o Estado.
A mensagem alcança o Planalto porque o governador avalia que o presidente Lula antecipou o calendário eleitoral também para atraí-lo antes do tempo. Se caísse na cilada palaciana, facilitaria a estratégia de Lula de estabelecer uma campanha polarizada entre seu governo e o anterior, do PSDB.
Luiz,
ResponderExcluirO Serra é um enigma? rsrsr... Ou pretende ser a esfinge?
Os tucanos estão no fio da navalha, de um lado os petistas, de outro o DEM de Arruda.
Gostei de visitar o teu espaço virtual, irei voltar mais vezes e me tornei até teu seguidor.
visita o nosso blog:
www.militanciaviva.blogspot.com
Olá, caro Luiz Antonio Magalhães!Bom dia!
ResponderExcluirGostaria de que, se possível, divulgasse o abaixo-assinado que a editoria do Terra Brasilis redigiu.
Abs
DiAfonso
Link para o abaixo-assinado:http://profdiafonso.blogspot.com/2010/01/abaixo-assinado-afastamento-do-consul.html
Peço desculpas por usar esta caixa de comentário para tratar do abaixo-assinado.
Apresentem o que apresentar, Deus me (nos)livre de tucanos! A maior farsa da política brasileira!
ResponderExcluir"Cortar os gastos de custeio e aumentar investimentos" é a solução mágica que expõe a típica desonestidade econômica. Porque é impossível fazer os dois. Se você faz um investimento, tem um aumento obrigatório dos gastos de custeio. Por exemplo, você vai fazer um investimento e constrói uma termoelétrica. Tem que contratar funcionários, pagar manutenção, comprar matéria-prima, isso tudo é gasto de custeio.
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