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Dunga e a imprensa: much ado about nothing

Muita gente está escrevendo análises profundas sobre o comportamento de Dunga nas recentes entrevistas coletivas e também sobre a "coragem" ou "arrogância" do treinador do escrete nacional. Bem, este blog acha que há um clima artificial de Fla-Flu em torno da questão, que é na verdade muito mais simples do que aparenta. Dizer que Dunga é um herói das esquerdas porque desafiou a poderosa Rede Globo é de um reducionismo ridículo, da mesma maneira que vincular o estilo grosseirão do técnico a um "espírito do tempo", como andam fazendo certos colunistas alinhados ao tucanato é simplesmente uma bazófia.
De fato, a questão parece ser muito mais simples: Dunga é apenas um gaúcho esquentado, com pavio bem curto e que não gosta de convescotes e acordos escusos que distraiam seus comandados da difícil tarefa que têm pela frente: vencer a Copa do Mundo. É preciso ter paciência de Jó para aguentar certas coisas que aparecem na imprensa esportiva, porque qualquer mané travestido de jornalista se acha mais competente do que o técnico da seleção brasileira, seja o técnico quem for. Alguns aguentam firme e relevam as críticas - Carlos Alberto Parreira é um desses homens com coração gelado que preferiam evitar o confronto.
Pois Dunga tem outro perfil e costuma devolver os absurdos que escuta. Daí para dizer que o ex-capitão da seleção é um revolucionário a serviço da democratização dos meios de comunicação é, como diriam os jovens, meio muito. O oposto é ainda mais risível: associar o estilão grotesco do treinador ao modo de operar do presidente Lula, como já saiu por aí, simplesmente não tem pé nem cabeça.
Dunga é ele mesmo, autêntico. De tão grosseiro, chega a ser simpático, caricatura do comandante que "fechou o grupo" e está levando o time da maneira como imaginou desde que assumiu a seleção. Se vencer, palmas para ele, burros são os outros - coleguinhas da imprensa esportiva, inclusive e principalmente. Se perder, sabe que sua cabeça vai rolar e que será o bode expiatório da vez. É do jogo, e Dunga conhece as regras.
Tudo somado, este blog acha que o Brasil tem um time bastante forte e ainda não viu outra seleção capaz de enfrentar os 11 canarinhos de igual para igual. A Argentina, é bem verdade, está fazendo bonito, mas não foi realmente testada (nem o Brasil, diga-se logo). Semana que vem começa a Copa de verdade, ninguém em sã consciência diria que Brasil, Argentina, Alemanha, Itália e Inglaterra ficariam de fora das oitavas...
Ademais, analisando friamente, a aposta do blog para zebra desta Copa é o time do Uruguai, que conta com Diego Lugano, talvez o melhor zagueiro da atualidade, e Forlan, filho de um grande jogador e cujo talento parece ser genético. Desnecessário lembrar que Lugano se projetou no São Paulo Futebol Clube, mesmo time em que jogou o pai de Forlan... O blog, é claro, torce pelo Brasil. Mas já adotou os irmãos do sul como segundo time nesta Copa. Com o Brasil de Kaká, Fabiano, Júlio Batista e Josué ou com o Uruguai de Forlan e Lugano, o tricolor do Morumbi vai acabar bem na fita neste ano de 2010. Evidentemente, ninguém espera uma nova final com os hermanos do sul, porque vai lembrar 1950, uma memória que merece ser apagada da brilhante história do futebol brasileiro. Portanto, força, Dunga, estamos com você!

Comentários

  1. CONCORDO COM SUA EXPLANAÇÃO, PORÉM É INEGÁVEL A ARROGÂNCIA DA NOSSA IMPRENSA, PRINCIPALMENTE A REDE GLOBO, QUE CONTINUA COM SUA CLARA INTENÇÃO DE MANIPULAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA, EM PROL DE SUAS POSIÇÕES POLÍTICAS.

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  2. Muita zebra nesta Copa e mais uma acaba de acontecer: Itália tá fora! Além da zebra, esta é a Copa do fim do politicamente correto: palavrões a torto e a direito, técnicos que não se cumprimentam, greve! Rebeldia, uniforme preto (e aliás, lindo). Mas esta Copa não está lá estas coisas. Só que no caso do Brasil não tem muito jeito: sempre mexe com o coração e a torcida esquenta à mercê de Dungas, Tv Globo e imprensa esportiva. Vai dar Brasil, essa é a minha aposta. Brasil x Argentina na final e Brasil campeão. Com direito a vingança contra Uruguai nas semis e a Holanda que já é freguesa nas quartas.

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  3. Suscinta e com "olhar distante" do episódio sua análise. Vale lembrar que depois da copa de 2006, a mesma imprensa que conseguia as entrevistas exclusivas e treinos abertos criticou depois a exposição excessiva do grupo.

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  4. Torcendo contra
    (publicado na revista Caros Amigos em junho de 2010)

    Vai começar o espetáculo do ufanismo histérico. Mídias de todos os suportes serão tomadas pela publicidade oportunista do verde-amarelo. Jornalismo e marketing, amalgamados por interesses comuns, fornecerão os delírios de união e superioridade que o público precisa para engolir a farsa consumista. Milícias uniformizadas tomarão ruas e bares, assegurando a adesão das massas ignóbeis à ditadura do hexa.
    Pois não contem com este humilde escriba. Torço apaixonadamente para o fracasso da seleção brasileira na África do Sul. Quanto mais humilhante e precoce, melhor. De preferência jogando mal, tomando olé, sob apupos das torcidas e o escárnio da crônica internacional. Que os falsos craques sejam desmascarados, patrocinadores amarguem prejuízos, apresentadores e comentaristas engasguem na desmoralização dos seus favoritismos.
    A escolha soa impopular e arriscada, mas deveria constituir uma demonstração de coerência para os apaixonados pelo esporte. O time da CBF personifica os vícios e artimanhas que envenenam o futebol nacional. Ali podemos entender a pauperização dos campeonatos regionais, a destruição de clubes interioranos, o êxodo de talentos, o esvaziamento dos estádios, a imoralidade dos bastidores.
    Uma seleção formada quase exclusivamente por jogadores de times estrangeiros não possui qualquer identidade com o torcedor brasileiro. Eles nem ao menos são melhores do que dezenas de atletas que jogam no país, e que formariam uma equipe mais entrosada, motivada e empolgante. Mas, claro, Dunga não pode privilegiar a qualidade. Sua caricatura de sargento brucutu ameniza as motivações financeiras da convocação, que atende aos interesses de empresários, cartolas e especuladores.
    O legítimo espírito patriótico deve repudiar esse empreendimento nefasto e sua utilização da retórica nacionalista em benefício de corjas obscuras.

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