Pular para o conteúdo principal

Iglecias: o dificil caminho de Dilma

Abaixo, mais uma lúcida e interessante colaboração do professor Wagner Iglecias para o blog. Vale a leitura, na íntegra:

Nas voltas que a vida dá muitas vezes se ouve a expressão de que "fulano é a pessoa certa na hora certa". Para se ter sucesso na política, como se sabe, há que se ter a combinação ótima entre capacidade e oportunidade. A oportunidade de tornar-se a primeira mulher a presidir o Brasil se apresenta à candidata Dilma Roussef. É a escolhida do PT e do presidente Lula (mais por obra deste do que daquele, ao que consta) para concorrer à presidência da República.

Muitos, no entanto, se perguntam sobre sua capacidade de fazer frente à empreitada de eleger-se e, se vitoriosa, de comandar o país a partir de 2011. Apoiada por um presidente que detém mais de 70% de aprovação popular, e representando um governo que teve êxitos econômicos e sociais importantes, a priori daria pra se pensar que o caminho de Dilma rumo à vitória seria fácil. Será? A julgar pelo sucesso do governo Lula e pela premissa de que o brasileiro vota, antes de tudo, com o bolso, a única variável que poderia fazer Dilma Roussef não vencer a eleição chama-se, exatamente, Dilma Roussef.

De fato, a candidata Dilma tem pontos fortes e fracos. Entre os pontos de destaque estão sua propalada capacidade gerencial, o seu não envolvimento com o mensalão e outros escândalos que marcaram o governo Lula e sua história de vida, que vai da resistência à ditadura militar na juventude ao recente enfrentamento de um câncer. Apesar disto, Dilma deverá evitar cair na armadilha da fulanização que certamente será colocada em seu caminho. Jamais foi eleita a cargo público, não tem o curriculo acadêmico de seu principal adversário e, embora com uma vasta experiência na gestão pública, não ostenta, como ele, a passagem por tantos importantes cargos públicos.

Além disso Dilma ainda parece pouco habituada à matreirice das declarações públicas tão típica dos profissionais da política. Como se vê em sites e blogs, as primeiras movimentações desta eleição mostram que a candidata de Lula não terá um dia sequer de refresco daqui até as urnas. Toda e qualquer palavra que disser, todo e qualquer movimento que fizer serão questionados e cobrados pela oposição, num cerco que vai de seu adversário (de forma cordata, porém contundente) até a cidadãos comuns que pura e simplesmente rejeitam o petismo, manifestando-se de forma duríssima e por vezes preconceituosa, como se vê no ambiente virtual. "Guerrilheira", "terrorista" e "boneca de ventríloquo" são termos recorrentes com o qual o exército anti-petista tem se referido a Dilma na internet, por exemplo.

Será bom para o processo eleitoral que o debate se dê em torno de programas de governo e de comparações entre a diferença, que pouco a pouco vai se tornando mais nítida, entre os modelos de Estado distintos que PT e PSDB/DEM defendem para o país. Mas lembremos que o brasileiro vota, antes de tudo, em pessoas, e o perfil, a história e a personalidade de Dilma serão levados em conta pelos eleitores. Ela é bem menos conhecida que seu adversário e hoje ninguém sabe avaliar, ainda, qual o peso que ser "a candidata do Lula" terá a seu favor. É provável que tenha muito, e que talvez seja decisivo para o resultado do pleito.

Independentemente desta variável que pode vir a se constituir como fundamental, e do eventual debate de projetos de Brasil, Dilma terá de ser ser firme o suficiente para dissipar qualquer impressão de que, se eleita, seria apenas a "candidata do Lula", presa fácil dos políticos profissionais, e doce o suficiente para mostrar-se diferente do perfil gerencialista e pouco carismático com o qual muita gente a identifica até o momento. É dificil o caminho de Dilma.

Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor do Curso de Gestão de Políticas Públicas da USP.

Comentários

  1. Continuo não reconhecendo...

    ResponderExcluir
  2. Currículo acadêmico de Serra!!! Fala sério!!

    ResponderExcluir
  3. "Dilma ainda parece pouco habituada à matreirice das declarações públicas tão típica dos profissionais da política" É isso o que se trata desse artigo do Prof. Uma coleção de lugar comum, repetindo o que os adversários da Candidatura Dilma insitem em afirmar; esse artigo "acad~emico" é mais uma matreirice de adeptos da Oposição, com ares de "isenção".
    Fala sério , o articulista tende a ser isento comessa frase?:
    "a candidata Dilma tem pontos fortes e fracos. Entre os pontos de destaque estão sua propalada capacidade gerencial, o seu não envolvimento com o mensalão e outros escândalos que marcaram o governo Lula e sua história de vida, que vai da resistência à ditadura militar na juventude ao recente enfrentamento de um câncer." Malabarismo "acadêmico" para reforçar preconceitos, isso sim.

    ResponderExcluir
  4. Fraco, muito fraco. Magalhães, o que está acontecendo com você eu não sei, so ei que não estou gostando desta sua nova fase.

    ResponderExcluir
  5. Luiz, gostei do artigo. O autor elencou alguns dos vários rotulos que a oposição tentará colar em Dilma. Ele falou na tal fulanização do debate, e é isso mesmo que os tucanalhas vão tentar fazer até a eleição, já que programa e ideias para o pais eles não tem.

    ResponderExcluir
  6. O PT tem que investir na campanha nisso que o professor falou, dos dois modelos diferentes de Estado que Dilma e Serra representam. Porque isso é tudo o que a oposição não quer. Eles vão ficar comparando curriculos e difamando a candidata governista, essa é a estratégia deles.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

O Entrelinhas não censura comentaristas, mas não publica ofensas pessoais e comentários com uso de expressões chulas. Os comentários serão moderados, mas são sempre muito bem vindos.

Postagens mais visitadas deste blog

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue

Rogério Andrade, o rei do bicho

No dia 23 de novembro do ano passado, o pai de Rodrigo Silva das Neves, cabo da Polícia Militar do Rio de Janeiro, foi ao batalhão da PM de Bangu, na Zona Oeste carioca, fazer um pedido. O homem, um subtenente bombeiro reformado, queria que os policiais do quartel parassem de bater na porta de sua casa à procura do filho — cuja prisão fora decretada na semana anterior, sob a acusação de ser um dos responsáveis pelo assassinato cinematográfico do bicheiro Fernando Iggnácio, executado com tiros de fuzil à luz do dia num heliporto da Barra da Tijuca. Quando soube que estava sendo procurado, o PM fugiu, virou desertor. Como morava numa das maiores favelas da região, a Vila Aliança, o pai de Neves estava preocupado com “ameaças e cobranças” de traficantes que dominam o local por causa da presença frequente de policiais. Antes de sair, no entanto, o bombeiro confidenciou aos agentes do Serviço Reservado do quartel que, “de fato, seu filho trabalhava como segurança do contraventor Rogério And

OCDE e o erro do governo na gestão das expectativas

O assunto do dia nas redes é a tal negativa dos Estados Unidos para a entrada do Brasil na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto os oposicionistas aproveitam para tripudiar, os governistas tentam colocar panos quentes na questão, alegando que não houve propriamente um veto à presença do Brasil no clube dos grandes, a Série A das nações. Quem trabalha com comunicação corporativa frequentemente escuta a frase "é preciso gerenciar a expectativa dos clientes". O problema todo é que o governo do presidente Bolsonaro vendeu como grande vitória a entrada com apoio de Trump - que não era líquida e certa - do país na OCDE. Ou seja, gerenciou mal a expectativa do cliente, no caso, a opinião pública brasileira. Não deixa de ser irônico que a Argentina esteja entrando na frente, logo o país vizinho cujo próximo governo provavelmente não será dos mais alinhados a Trump. A questão toda é que o Brasil não "perdeu", como o pobre Fla-Flu que impe