Abaixo, texto da Folha de S. Paulo desta terça-feira. Antes, dois poemas que ele gostava muito, do Manuel Bandeira e do Mário de Andrade. Perder o pai, depois de tanto tempo de batalha contra o câncer, não é mesmo nada fácil. Fica a saudade, muita, e também a certeza de que valeu a pena, apesar do sofrimento, pois as adversidades e a provação também revelam a força e o caráter das pessoas. E nesses últimos quatro anos, quando a doença começou a se agravar, ele nunca perdeu a esperança nem a vontade de lutar pela vida.
Cada coisa estava e está em seu lugar, sim, pai. A dor é grande, enorme, mas saiba que maior ainda é o orgulho por uma vida toda, pelo exemplo que não se vai, ao contrário, que já é cada vez mais presente.
Obrigado aos tantos amigos que estiveram ontem no velório e sepultamento e também ao doutor Antonio Carlos Buzaid e sua equipe, que desde 2006 o acompanhavam com uma garra indescritível. E vida que segue...
Consoada
Quando a Indesejada das gentes chegar
[Não sei se dura ou coroável],
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
- Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
[A noite com os seus sortilégios.]
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa.
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.
***
Quando eu morrer quero ficar,
Não contem aos meus inimigos,
Sepultado em minha cidade,
Saudade.
Meus pés enterrem na rua Aurora,
No Paissandu deixem meu sexo,
Na Lopes Chaves a cabeça
Esqueçam.
No Pátio do Colégio afundem
O meu coração paulistano:
Um coração vivo e um defunto
Bem juntos.
Escondam no Correio o ouvido
Direito, o esquerdo nos Telégrafos,
Quero saber da vida alheia,
Sereia.
O nariz guardem nos rosais,
A língua no alto do Ipiranga
Para cantar a liberdade.
Saudade...
Os olhos lá no Jaraguá
Assistirão ao que há de vir,
O joelho na Universidade,
Saudade...
As mãos atirem por aí,
Que desvivam como viveram,
As tripas atirem pro Diabo,
Que o espírito será de Deus.
Adeus.
***
LUIZ EDUARDO CERQUEIRA MAGALHÃES (1945-2010)
Uma vida ligada ao Santa Cruz
ESTÊVÃO BERTONI, DE SÃO PAULO
Dentro da sala de aula, Luiz Eduardo Cerqueira Magalhães era para os alunos o Eduardão, professor de matemática. Por ser grande, ter 1,91 m e voz grossa, aparentava ser muito severo. Mas, no fundo, era um brincalhão.
Logo após ter se formado em física pela USP, no final dos anos 60, ele começou a lecionar em colégios, como o Visconde de Porto Seguro.
Em 1969, casou-se com a psicopedagoga Maria Antônia, que conhecera na época da faculdade. No mesmo ano, entrou para o Santa Cruz, de onde não mais saiu.
O colégio no qual seguiu carreira, fundado em 1952 por religiosos, iniciou nos anos 70 um processo para que os padres abandonassem os cargos de direção.
A etapa se encerrou em 1993, quando Luiz Eduardo assumiu o posto de diretor da instituição, função que teve até a semana passada.
Paralelamente, deu aulas em faculdades, e, desde 1986, atuou no Conselho Estadual de Educação, que chegou a presidir. Sua vida, porém, foi mesmo o Santa Cruz.
Como diretor, priorizava a formação humanística dos alunos, que têm aulas de ética e filosofia. Construiu um teatro e, recentemente, levou até a escola o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, para falar sobre drogas.
Hoje, o Santa Cruz é o terceiro melhor colégio particular de SP, segundo dados do Enem 2009. Para ele, isso não dizia muita coisa - achava que a escola tinha que se nortear pela formação, e não pela posição num ranking.
Ontem, morreu aos 65, de câncer. Deixa viúva, quatro filhos e cinco netos. Também ontem foi seu enterro, em SP.
Cada coisa estava e está em seu lugar, sim, pai. A dor é grande, enorme, mas saiba que maior ainda é o orgulho por uma vida toda, pelo exemplo que não se vai, ao contrário, que já é cada vez mais presente.
Obrigado aos tantos amigos que estiveram ontem no velório e sepultamento e também ao doutor Antonio Carlos Buzaid e sua equipe, que desde 2006 o acompanhavam com uma garra indescritível. E vida que segue...
Consoada
Quando a Indesejada das gentes chegar
[Não sei se dura ou coroável],
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
- Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
[A noite com os seus sortilégios.]
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa.
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.
***
Quando eu morrer quero ficar,
Não contem aos meus inimigos,
Sepultado em minha cidade,
Saudade.
Meus pés enterrem na rua Aurora,
No Paissandu deixem meu sexo,
Na Lopes Chaves a cabeça
Esqueçam.
No Pátio do Colégio afundem
O meu coração paulistano:
Um coração vivo e um defunto
Bem juntos.
Escondam no Correio o ouvido
Direito, o esquerdo nos Telégrafos,
Quero saber da vida alheia,
Sereia.
O nariz guardem nos rosais,
A língua no alto do Ipiranga
Para cantar a liberdade.
Saudade...
Os olhos lá no Jaraguá
Assistirão ao que há de vir,
O joelho na Universidade,
Saudade...
As mãos atirem por aí,
Que desvivam como viveram,
As tripas atirem pro Diabo,
Que o espírito será de Deus.
Adeus.
***
LUIZ EDUARDO CERQUEIRA MAGALHÃES (1945-2010)
Uma vida ligada ao Santa Cruz
ESTÊVÃO BERTONI, DE SÃO PAULO
Dentro da sala de aula, Luiz Eduardo Cerqueira Magalhães era para os alunos o Eduardão, professor de matemática. Por ser grande, ter 1,91 m e voz grossa, aparentava ser muito severo. Mas, no fundo, era um brincalhão.
Logo após ter se formado em física pela USP, no final dos anos 60, ele começou a lecionar em colégios, como o Visconde de Porto Seguro.
Em 1969, casou-se com a psicopedagoga Maria Antônia, que conhecera na época da faculdade. No mesmo ano, entrou para o Santa Cruz, de onde não mais saiu.
O colégio no qual seguiu carreira, fundado em 1952 por religiosos, iniciou nos anos 70 um processo para que os padres abandonassem os cargos de direção.
A etapa se encerrou em 1993, quando Luiz Eduardo assumiu o posto de diretor da instituição, função que teve até a semana passada.
Paralelamente, deu aulas em faculdades, e, desde 1986, atuou no Conselho Estadual de Educação, que chegou a presidir. Sua vida, porém, foi mesmo o Santa Cruz.
Como diretor, priorizava a formação humanística dos alunos, que têm aulas de ética e filosofia. Construiu um teatro e, recentemente, levou até a escola o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, para falar sobre drogas.
Hoje, o Santa Cruz é o terceiro melhor colégio particular de SP, segundo dados do Enem 2009. Para ele, isso não dizia muita coisa - achava que a escola tinha que se nortear pela formação, e não pela posição num ranking.
Ontem, morreu aos 65, de câncer. Deixa viúva, quatro filhos e cinco netos. Também ontem foi seu enterro, em SP.
Luiz querido, aprendi solo agora, estou chorando com certeza. Com certeza ele agora està na paz de Deus!
ResponderExcluirTi vogliamo tanto bene e ti siamo vicini, caro amico!
Maria e Paolo
Forca aí! Seu pai foi o maior guerreiro que conheci! Vamos lembrar de muitas historias e lições que nos deixou. Lindos os poemas. Bjo grande
ResponderExcluirDa mesma forma que , pelo seu blog - mundo virtual -, faz-se amigos, assim também será o acolhimento de seu Pai - pelos amigos visíveis e os invisíveis.
ResponderExcluirDeste amigo invisível, meus sentimentos e desejo de que saiba superar o momento de tristeza.
AndrB
Consolo, nesses momentos, parece difícil ser encontrado. Mas vale a pena tentar achá-lo. Acredito que olhar para trás e ver a história construída é o começo do caminho. Conheci parte dela contada por um dos seus quatro filhos... o orgulho e o amor que recheavam as narrativas já demonstram a importância desse homem. E se ouvisse cada um dos outros três, sua companheira e os seus netos, tenho certeza que só reforçaria essa percepção de protagonista da sua família. Isso sem mencionar o legado social que deixou. De fato, valeu a pena!
ResponderExcluirAcho que a dimensão da dor passa a ter um novo significado agora. Se os amigos, de alguma forma, servirem para ajudar a superar, pode contar!
Um grande abraço, Sheila Wada
Caro Luiz,
ResponderExcluirAcompanho seu blog há uns meses e hoje te acompanho na dor. Meu pai completou a mesma idade na semana passada e está vivo. Morrer jovem é antinatural, mas é a vida "É a vida que segue", conforme escreveste, mas imagino o vazio que deve ficar em cada coisa, palavra, momento... Contudo, fica o exemplo de homem de bem, tão em falta nesse País.
Que Deus te abraçe com o conforto necessário nos dias que virão.
Exemplos como o dele nos motivam a deixar uma marca no caminho de pessoas que convivem conosco. Também nos ensinam a não cair diante dos desafios dessa longa jornada. Que siga a luta... Um beijo grande, Carol Gama e Márcio Rodrigues
ResponderExcluirSolidariedade e um aconchego no coração enviados da ex-Itapetinga (hoje, Pedra Branca, uma simpática cidade do sertão central do Ceará). Tem leitor que lê de longe e hoje ficou um bucadinho mais triste.
ResponderExcluirOpa! Meus sentimentos, e, na medida do possível e imaginável, minha solidariedade.
ResponderExcluirEu havia lido este necrológio hoje, sem saber que se tratava de seu pai...
Perdi o meu já faz bastante tempo, mas a saudade sempre nos ronda...
Minha solidariedade.
ResponderExcluirEle mudou de plano e está bem.
Força meu camarada. O exemplo, o afeto e o caráter são eternos. Um forte abraço.
ResponderExcluirDesejo-lhe força nesse momento tão difícil, pelo qual a maioria de nós tem de passar. Um dia, tenho certeza, você conseguirá lembrar de seu passado com ele sem dor, retendo, como de uma evocação feliz, apenas os bons momentos. um forte abraço,
ResponderExcluirMinha solidariedade e tenha a certeza de que seu pai está muito bem. Um forte abraço.
ResponderExcluirAna Arrigoni