Num país em que a arte é tão vulnerável ao mercado, setores projetam perdas milionárias que podem ser irreparáveis, escreve, de Nova York, a colunista da Folha de S. Paulo. Artigo completo abaixo, vale a leitura!
Em duas semanas, 10 milhões de pessoas perderam o emprego nos Estados Unidos. Pelas projeções, o desemprego na maior economia do mundo vai chegar a 32% —no pior momento da Grande Depressão, em 1933, menos de um quarto dos trabalhadores foram afetados.
Os museus de Nova York fecharam no último dia 12 e foram seguidos por museus de outros estados. Só o Metropolitan, o terceiro mais visitado do mundo, prevê um prejuízo inicial de US$ 100 milhões. Com o cancelamento de 31 produções da Broadway, as perdas com vendas de ingressos são calculadas em mais de US$ 100 milhões. Nos teatros off-Broadway e nas companhias regionais americanas, a pandemia ameaça fechar as cortinas definitivamente.
Entre músicos, a pandemia se abate sobre uma categoria profissional que já teve sua renda dizimada pela introdução de serviços de streaming como iTunes e Spotify. A não ser para megaestrelas da música, a maioria em toda parte hoje sobrevive com concertos ao vivo, não com as vendas de gravações.
Mesmo artistas estabelecidos, premiados com o Grammy, dependem do calendário de shows a curto prazo.
“Perdi a turnê que faria pelo país e pelo Canadá até o fim de abril,” conta Maria Schneider, compositora que dirige sua orquestra há 28 anos. “Isto já é perda de trabalho para mais 20 pessoas.” Ela conta que não tinha marcado mais concertos recentes porque estava mixando seu novo disco, “Data Lords”, que teve o lançamento adiado.
Schneider vê um lado positivo no isolamento em casa. “Espero que os músicos abracem alternativas. Um membro da minha banda acaba de comprar seu primeiro computador e está florescendo como professor de música online.
As lives de músicos se tornaram rotina no mundo. A veterana cantora e compositora Karyn Allyson está isolada em seu apartamento em Manhattan com o parceiro Bill McLaughlin, compositor, maestro e anfitrião de programas de música clássica. Ambos experimentam formatos de um programa ou podcast de música ao vivo que já despertou interesse de um produtor.
Allyson conta que teve cancelados todos os shows que faria com um quarteto até maio. Tem feito lives e sido procurada por estudantes para aulas online. “Mas para compor e tocar juntos,” ela afirma, “o delay de som que acontece em certas plataformas ainda é uma dificuldade”.
No mundo desenvolvido, nenhum país tem uma indústria cultural tão vulnerável ao mercado como os Estados Unidos. O investimento público em artes e cultura no país mais rico do mundo é de US$ 4 per capita, em dados de 2017. O da Finlândia, no mesmo período, foi de US$ 95 per capita, o da Alemanha, US$ 30.
A crise atual apresenta outro desafio, o de liderança. Depois de assumir a presidência, em plena Grande Depressão, Franklin Delano Roosevelt embarcou no projeto mais ambicioso de financiamento cultural da história americana. Criou a agência Works Progress Administration e empregou dezenas de milhares de artistas plásticos, músicos, escritores e atores.
Desses programas emergiram nomes como a fotógrafa Berenice Abbott, o pintor Jackson Pollock, o dramaturgo Arthur Miller, o diretor Orson Welles, entre centenas de nomes que marcaram a história das artes no país.
Hoje, o casal Donald e Melania Trump quebra a tradição anual e não aparece no camarote presidencial das premiações do Kennedy Center, a mais importante casa de performances da capital, com medo de serem vaiados. Os republicanos, no controle da Câmara de 2010 a 2018 e do Senado, desde 2010, propõem, a cada novo orçamento, cortar a cultura na carne.
O fato é que a economia criativa pesa no orçamento de cidades como Nova York, onde emprega 300 mil pessoas.
Só os museus do estado geram receita anual de US$ 5,4 bilhões por ano. Uma fonte do Metropolitan diz que o museu espera impacto de frequência internacional quando reabrir. Os chineses formam o mais numeroso grupo de visitantes estrangeiros.
Antony Korner, publisher da Artforum, importante publicação de arte contemporânea, afirma que o impacto no mercado de arte deve ser muito maior do que o do crash de 2008. A revista fundiu as edições de papel de maio e junho e está oferecendo uma plataforma online para que as galerias possam exibir seus artistas com textos mais curtos.
Korner diz que vai ser necessário um Plano Marshall para as artes, numa referência à assistência americana para reconstruir a Europa no pós-Segunda Guerra.
Em duas semanas, 10 milhões de pessoas perderam o emprego nos Estados Unidos. Pelas projeções, o desemprego na maior economia do mundo vai chegar a 32% —no pior momento da Grande Depressão, em 1933, menos de um quarto dos trabalhadores foram afetados.
Os museus de Nova York fecharam no último dia 12 e foram seguidos por museus de outros estados. Só o Metropolitan, o terceiro mais visitado do mundo, prevê um prejuízo inicial de US$ 100 milhões. Com o cancelamento de 31 produções da Broadway, as perdas com vendas de ingressos são calculadas em mais de US$ 100 milhões. Nos teatros off-Broadway e nas companhias regionais americanas, a pandemia ameaça fechar as cortinas definitivamente.
Entre músicos, a pandemia se abate sobre uma categoria profissional que já teve sua renda dizimada pela introdução de serviços de streaming como iTunes e Spotify. A não ser para megaestrelas da música, a maioria em toda parte hoje sobrevive com concertos ao vivo, não com as vendas de gravações.
Mesmo artistas estabelecidos, premiados com o Grammy, dependem do calendário de shows a curto prazo.
“Perdi a turnê que faria pelo país e pelo Canadá até o fim de abril,” conta Maria Schneider, compositora que dirige sua orquestra há 28 anos. “Isto já é perda de trabalho para mais 20 pessoas.” Ela conta que não tinha marcado mais concertos recentes porque estava mixando seu novo disco, “Data Lords”, que teve o lançamento adiado.
Schneider vê um lado positivo no isolamento em casa. “Espero que os músicos abracem alternativas. Um membro da minha banda acaba de comprar seu primeiro computador e está florescendo como professor de música online.
As lives de músicos se tornaram rotina no mundo. A veterana cantora e compositora Karyn Allyson está isolada em seu apartamento em Manhattan com o parceiro Bill McLaughlin, compositor, maestro e anfitrião de programas de música clássica. Ambos experimentam formatos de um programa ou podcast de música ao vivo que já despertou interesse de um produtor.
Allyson conta que teve cancelados todos os shows que faria com um quarteto até maio. Tem feito lives e sido procurada por estudantes para aulas online. “Mas para compor e tocar juntos,” ela afirma, “o delay de som que acontece em certas plataformas ainda é uma dificuldade”.
No mundo desenvolvido, nenhum país tem uma indústria cultural tão vulnerável ao mercado como os Estados Unidos. O investimento público em artes e cultura no país mais rico do mundo é de US$ 4 per capita, em dados de 2017. O da Finlândia, no mesmo período, foi de US$ 95 per capita, o da Alemanha, US$ 30.
A crise atual apresenta outro desafio, o de liderança. Depois de assumir a presidência, em plena Grande Depressão, Franklin Delano Roosevelt embarcou no projeto mais ambicioso de financiamento cultural da história americana. Criou a agência Works Progress Administration e empregou dezenas de milhares de artistas plásticos, músicos, escritores e atores.
Desses programas emergiram nomes como a fotógrafa Berenice Abbott, o pintor Jackson Pollock, o dramaturgo Arthur Miller, o diretor Orson Welles, entre centenas de nomes que marcaram a história das artes no país.
Hoje, o casal Donald e Melania Trump quebra a tradição anual e não aparece no camarote presidencial das premiações do Kennedy Center, a mais importante casa de performances da capital, com medo de serem vaiados. Os republicanos, no controle da Câmara de 2010 a 2018 e do Senado, desde 2010, propõem, a cada novo orçamento, cortar a cultura na carne.
O fato é que a economia criativa pesa no orçamento de cidades como Nova York, onde emprega 300 mil pessoas.
Só os museus do estado geram receita anual de US$ 5,4 bilhões por ano. Uma fonte do Metropolitan diz que o museu espera impacto de frequência internacional quando reabrir. Os chineses formam o mais numeroso grupo de visitantes estrangeiros.
Antony Korner, publisher da Artforum, importante publicação de arte contemporânea, afirma que o impacto no mercado de arte deve ser muito maior do que o do crash de 2008. A revista fundiu as edições de papel de maio e junho e está oferecendo uma plataforma online para que as galerias possam exibir seus artistas com textos mais curtos.
Korner diz que vai ser necessário um Plano Marshall para as artes, numa referência à assistência americana para reconstruir a Europa no pós-Segunda Guerra.
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