Pular para o conteúdo principal

Míriam Leitão: qual seria o caminho para a recuperação da economia brasileira após o coronavírus?

Ainda não dá para saber o tamanho do buraco que vai resultar na maior queda do PIB anual de nossa história, mas existem alternativas para sair dele, escreve a jornalista no site da revista Época, em artigo publicado dia 15/5. Sempre bom ler a Míriam.

Estaremos mais pobres ao fim desta pandemia. E teremos milhões de pobres a mais. Contudo, é possível aprender com esta dor avassaladora que nos atinge. É fundamental ter um plano de saída, e nele têm de estar inseridos novos programas sociais de reinclusão produtiva, de estímulo ao emprego e aos pequenos negócios. O Brasil precisará pensar diferente. Do comportamento individual ao papel do Estado. A crise não tem paralelo na história, mas ainda assim é possível tirar lições e pensar no futuro. Algumas empresas adotaram rapidamente protocolos e continuam atuantes. Basta ver que a agricultura está crescendo neste mar de números negativos da economia. No setor de serviços, as empresas que já tinham feito a transição tecnológica estão colhendo bons resultados. As outras, afundam. Pensar no meio do turbilhão sobre o tamanho do tombo da economia e como será o pós-pandemia é um desafio gigantesco. Porém, foi o que ÉPOCA me propôs.
“O tamanho do tombo não está dado. Vai depender do que a gente faz, e eu acho que o Brasil está agindo de forma bastante lenta”, afirmou, para começo de conversa, o economista Ricardo Paes de Barros, professor do Insper.
Esse é o primeiro obstáculo. Tivemos uma parada brusca. Não há termômetros bons o suficiente para nos dar uma dimensão da crise econômica, e ela pode estar se agravando pelos erros e pela demora da resposta. Nunca houve algo assim com esse impacto e complexidade. Uma coisa sabemos, será a maior queda do PIB anual de nossa história.
O número da FGV é de uma recessão de 5,4%, mas Silvia Matos alerta que, em todas as previsões, os dados são tão piores quanto mais contemporâneos. Cada revisão mostra um buraco maior.
Há desafios imediatos e há outros nos aguardando. Não haverá dia fácil nesta crise.
“Vamos sair com tanta coisa destruída que estaremos condenados a reconstruir. Há quem pense que depois que o vírus passar voltaremos ao business as usual. Não é assim, não. Todo mundo vai mudar”, disse o economista José Roberto Mendonça de Barros.
A China perdeu credibilidade como fornecedor, porque vendeu e não entregou. Foram décadas trabalhando a confiança do mercado internacional como fornecedor pontual e construindo a reputação de produto de qualidade. Tudo isso foi atingido.
O governador Helder Barbalho contava as horas na noite do domingo 3 para a chegada de respiradores que havia comprado da China. O Pará importou diretamente para reduzir os riscos de Belém repetir o colapso de Manaus. Foi uma decepção. Os respiradores chegaram com defeito. O governo brasileiro comprou produtos chineses que não chegaram. Nos Estados Unidos, a maior fabricante de máscaras não conseguiu atender às encomendas.
A experiência destes dias nos obrigará a pensar em produzir aqui alguns itens importados. O significado de estratégico está em mutação. Se o Brasil quiser refazer o Estado grande do passado, o Estado-empresário, vai errar outra vez. Porém tivemos agora alguns exemplos de nacionalização de equipamentos e componentes que trazem a pista do melhor caminho.
“A Suzano e a Basf fizeram em 15 dias espessantes especialmente para álcool em gel, que eram importados”, contou Mendonça de Barros, economista que tem o olhar dentro das empresas. No caso da Suzano, foi feito com o Senai, a partir de microcelulose. Antes, era importado da China.
Com Alvaro Gribel


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

No pior clube

O livro O Crepúsculo da Democracia, da escritora e jornalista norte-americana Anne Applebaum, começa numa festa de Réveillon. O local: Chobielin, na zona rural da Polônia. A data: a virada de 1999 para o ano 2000. O prato principal: ensopado de carne com beterrabas assadas, preparado por Applebaum e sua sogra. A escritora, que já recebeu o maior prêmio do jornalismo nos Estados Unidos, o Pulitzer, é casada com um político polonês, Radosław Sikorski – na época, ele ocupava o cargo de ministro do Interior em seu país. Os convidados: escritores, jornalistas, diplomatas e políticos. Segundo Applebaum, eles se definiam, em sua maioria, como “liberais” – “pró-Europa, pró-estado de direito, pró-mercado” – oscilando entre a centro-direita e a centro-esquerda. Como costuma ocorrer nas festas de Réveillon, todos estavam meio altos e muito otimistas em relação ao futuro. Todos, é claro, eram defensores da democracia – o regime que, no limiar do século XXI, parecia ser o destino inevitável de toda

Abaixo o cancelamento

A internet virou o novo tribunal da inquisição — e isso é péssimo Só se fala na rapper Karol Conká, que saiu do BBB, da Rede Globo, com a maior votação da história do programa. Rejeição de 99,17% não é pouca coisa. A questão de seu comportamento ter sido odioso aos olhos do público não é o principal para mim. Sou o primeiro a reconhecer que errei muitas vezes. Tive atitudes pavorosas com amigos e relacionamentos, das quais me arrependo até hoje. Se alguma das vezes em que derrapei como ser humano tivesse ido parar na internet, o que aconteceria? Talvez tivesse de aprender russo ou mandarim para recomeçar a carreira em paragens distantes. Todos nós já fizemos algo de que não nos orgulhamos, falamos bobagem, brincadeiras de mau gosto etc… Recentemente, o ator Armie Hammer, de Me Chame pelo Seu Nome, sofreu acusações de abuso contra mulheres. Finalmente, através do print de uma conversa, acabou sendo responsabilizado também por canibalismo. Pavoroso. Tudo isso foi parar na internet. Ergue

OCDE e o erro do governo na gestão das expectativas

O assunto do dia nas redes é a tal negativa dos Estados Unidos para a entrada do Brasil na OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Enquanto os oposicionistas aproveitam para tripudiar, os governistas tentam colocar panos quentes na questão, alegando que não houve propriamente um veto à presença do Brasil no clube dos grandes, a Série A das nações. Quem trabalha com comunicação corporativa frequentemente escuta a frase "é preciso gerenciar a expectativa dos clientes". O problema todo é que o governo do presidente Bolsonaro vendeu como grande vitória a entrada com apoio de Trump - que não era líquida e certa - do país na OCDE. Ou seja, gerenciou mal a expectativa do cliente, no caso, a opinião pública brasileira. Não deixa de ser irônico que a Argentina esteja entrando na frente, logo o país vizinho cujo próximo governo provavelmente não será dos mais alinhados a Trump. A questão toda é que o Brasil não "perdeu", como o pobre Fla-Flu que impe